segunda-feira, 10 de setembro de 2012

DEUS É AMOR!

Formação Shalom
 
Deus é amor! Quando lemos o que muitos afirmam ser o versículo mais importante das Sagradas Escrituras, deparamo-nos com três palavras surpreendentes: Deus é amor. Estas palavras de 1Jo 4,16 ecoam nos místicos, nos teólogos, nos nossos corações como palavras mais profundamente libertadoras dos nossos egoísmos, medos, solidões, dúvidas, limites...
Caem, especialmente, nossos limites humanos: Deus é amor. O amor não tem limites. Vai além de nossa humanidade, de nossa temporalidade, de nossa pequenez. Deus é amor. A medida do amor é Deus. Nada é impossível! Nada é limitado a não ser por nosso egoísmo. É possível amar mais, mais, sempre mais, pois Deus é amor. Deus é a medida do amor e o amor é a identidade mesma de Deus. Deus é eterno e ilimitado. Assim, também, o verdadeiro amor.
Santo Tomás de Aquino nos ensina mais: Deus é amor em ato! Isso! Deus não é somente amor teórico, bonito, distante, lá no céu, na eternidade. Não, Deus é amor em ato. Por isso, amor verdadeiro, como todo amor que age, que transforma, que participa e se dá.
E o maior ato de amor de Deus foi, sem dúvida, o seu único Filho, enviando-o para que morresse ao invés de nós. Nós estávamos condenados à destruição da morte eterna. Não havia saída para você e nem para mim. Era, com toda a segurança, viver uma vida infernal para terminar em uma morte eterna e terrível de sofrimentos sem fim, para sempre, para sempre.
Deus nos entregou Jesus e este sofrimento da perdição eterna, para sempre, para sempre, transformou-se em misericórdia e esperança de felicidades sem limites para sempre, para sempre, pois a nossa morte eterna desapareceu na sua morte e ressurreição, de onde jorram a nossa vida eterna, para sempre, para sempre...
Deus entregou seu Filho para morrer no nosso lugar. Imenso ato de amor este de um pai que entrega seu filho amado! Mas, há mais amor por aqui. Não somente Deus entregou seu próprio Filho, mas o próprio Filho entregou-se, livremente por amor ao Pai que O precisava entregar, compungido de amor a nós. O filho conhece inteiramente o Pai e o seu coração. Sabia o quanto lhe doía nos ver perdidos para sempre, distantes dele e mergulhados no sofrimento para sempre. Ah, a dor lancinante de quem perde aquele que ama!
Por amor ao Pai, então, por ler seu coração, o Filho se entrega. Não se apega a sua condição de Deus, mas faz-se homem para submeter-se em tudo ao que o homem estava submisso, exceto o pecado, a fim de que, por amor ao Pai e por amor a nós, pudéssemos estar para sempre com Ele e com o Pai.
Primeira Lição
É esta a primeira lição de amor que Jesus, o Mestre do Amor, nos dá. Deixa sua felicidade perfeitíssima, eterna, sem mancha, sem dor, sem morte, para não só enfrentar a mancha, a dor, a morte, mas, infinitamente mais que isso, tornar-se pecado (não pecador!), sofrer as dores dos homens, abraçar como homem a morte.
Jesus ensina a amar, amando. Ele, que é amor em ato, vem nos ensinar a amar em atos, amando, vivendo entre nós. É interessante notarmos que Jesus não nos fala sobre amor (isso o faz São Paulo em 1Cor 13 e, entre outros, Jo em sua primeira carta). Ele nos fala sempre sobre como amar. Para aprender a lição, precisamos mergulhar na sua vida, no seu dia a dia. É o "vinde e vede" que diz a João e André (Jo 1,39), pois não há outra maneira de aprender d'Ele senão, vivendo com Ele, contemplando sua vida, procurando ser um outro Cristo.
Sua primeira lição, então, é sair de si. Sair de sua felicidade perfeita e mergulhar na nossa lama tornando-se um de nós. Esta lição é a base de todo ato de amor perfeito: esquecer-se inteiramente de si, morrendo (em sentido figurado e literal pelo outro.
A primeira lição esconde, também, o primeiro segredo: A liberdade. Jesus se fez homem livremente. Ninguém O obrigou, ninguém teve de convencê-lO. Mas compungido por amor ao Pai e aos homens, livremente, saiu de si e veio fazer-se um conosco.
Primeira lição, primeiro segredo e, principalmente, primeiro fundamento: o amor, além de ser livre, além de ser doação de si, só é realmente amor se for ato de amor a Deus. Claro, ele dirige-se ao homem, mas seu fundamento, sua base, seu impulso e motor é o amor a Deus, o amor ao Pai que impingia Jesus a amar sem limites, sem barreiras, sem medo!
Uma lição, um segredo, um fundamento, um mistério. E o mistério é: todo aquele que ama, faz-se servo. Todo aquele que ama humilha-se e faz-se servo. É impossível quando nos sentimos superiores a alguém, quem quer que seja. Para amarmos alguém, de fato, precisamos nos fazer servos, os menores, os menos dignos, os que não têm direito algum, exceto o de amar, amar, amar.
Os orgulhosos não amam, pois, achando-se superiores aos outros, ao fazerem atos de pretenso amor, estão, na realidade, amando a si mesmos. Ao se julgarem superiores aos outros, também afastam-se de Deus, que une sempre o amor à humildade e à humilhação (cf. Jo 13,12-16). Suas pretensas atitudes de amor são, assim, artificiais, farisaicas, pois não amam como Deus ama e o amor é sempre humilde, pequeno, servo, menor.
Eis-nos agora com quatro características do ato de amor de Fil 2: o esvaziamento de si (kénosis), a liberdade e gratuidade, o amor a Deus como primeira moção, a humilhação voluntária.
Isto seria suficiente para nos deixar desanimados, não fosse a misericórdia de Deus! No entanto, é necessário contemplarmos outra característica de todas as aulas deste Mestre do Amor: o amor autêntico não tem preconceitos, não faz acepção de pessoas. Para isso, basta vermos a lista dos amados de Jesus. Melhor dizendo: para isso basta vermos a lista dos não amados que Jesus amou. Melhor ainda: para isso basta vermos a lista dos não amados e não amáveis que Jesus escolheu para amar com um amor todo especial, todo terno, todo atencioso. Veja só:
a) o homem - sim, isso mesmo, o homem. Aquele que o havia desrespeitado e traído no paraíso e que haveria de traí-lo em Judas, em você e em mim, geração após geração. O homem: aquele que trai, que é ingrato, que não O escuta, que não O obedece, que prefere mais o mundo e a si mesmo do que a Ele. Certamente, o homem encabeça a lista dos não amáveis. Quem amaria de boa vontade uma criatura como o homem?
b) Os pecadores - sem distinção: ladrões, homicidas, usurpadores de impostos, mentirosos, falsos, orgulhosos, avessos à graça de Deus, prostitutas, pecadores públicos.
c) Os doentes - lista enorme temos aqui: leprosos, cegos, coxos, hemorroíssas, manetas, encurvados, febris e doentes da alma: endemoniados e possessos de todas as idades e tipos.
d) Os desprezados - outra lista enorme! Paralíticos abandonados há anos em sua imobilidade sem ter quem cuidasse deles, leprosos, romanos, cobradores de impostos, ricos, pobres, crucificados.
e) Os sofredores - como não citar as dores que compungiram Jesus a agir: a da viúva de Naim, a de Marta e Maria, a do ladrão crucificado, a de Jairo, a de Maria em Caná (dor pequena se comparada às outras, mas não pequena para Jesus que a amava com tanta ternura. Quando alguém que a gente ama sofre, ainda que seja pouco, a dor dele dói mais na gente), a dos noivos de Caná, a de João Batista, a do servo do Centurião...
f) Os covardes e medrosos - quem venceria, aqui, os próprios "doze"?
g) As mulheres - naquele tempo, naquela cultura, como a gente sabe, mulher não era para ser amada...
Chegamos, assim, a um ponto tão caro à vocação Shalom: o amor aos não amáveis. Acima está uma lista parcial dos não amáveis que Jesus não apenas amou, mas escolheu para amar de forma especial. E o interessante é que aqueles que O atraem tanto são exatamente os que nos causam repulsa. Quem, de livre e expontânea vontade, se aproxima de um dos "tipos" da lista acima?
Jesus nos responde novamente com a vida: aquele que ora! Quem ora, contempla o Amor e é moldado por ele, na oração e na vida. Quem ora, aprende o amor na Fonte da Trindade. Quem ora, conhece a verdade e sabe que nada mais vale a não ser sorver em si o amor do Céu para amar na terra.
Quem ora assim, não se aproxima dos "tipos da lista acima. Não! Quem ora assim, procura este tipo para... servi-lo, como escravo, como pequenino, como menor.
VEJA BEM: somente, unicamente, ninguém mais do que um só tipo de pessoa - aquela que ama tanto a Deus e O conhece tão bem pela palavra e oração, que é tão íntima d'Ele, tão amassada pelo sofrimento que pode exclamar com Francisco: "Quem és tu, Senhor, e quem sou eu!" e, por amor de Deus, extasiado com a grandeza do seu Seu Amor visse seu próprio nada e entendesse o segredo deste amor "charitas", que não se orgulha, mas serve, serve, serve, sai de si, esvazia-se totalmente, generosamente, sem acepções, somente para dar alegria Àquele a quem ama acima de tudo e a quem serve com todo o seu ser.
Em uma palavra, ama assim quem, na oração, contempla o Amor e se sabe amado por Ele. Ama assim quem sofreu o impacto do amor de Deus e a dor de sua ausência. Quem se deixou esvaziar, empobrecer, por amor. Quem, na verdade, contempla a Deus e a si mesmo em plena luz e entende que ele próprio e tudo o que existe é nada diante deste segredo que é a linguagem da Trindade, dos anjos e santos e que durará para sempre, para sempre, para sempre. É a linguagem do céu, que nunca passará. A linguagem dos pequeninos, dos orantes, dos servos, dos extasiados diante da beleza de Deus, da beleza do Amor.
O Mestre do Amor ensina-nos, ainda, uma última lição em dois atos. A cruz e a ressurreição. Quem ama, sofre. Veja bem: não se disse "poderá sofrer", não! Quem ama como Jesus ama, sofre. É natural! A cruz é a expressão maior do amor de Jesus, e também a sua humilhação e sofrimento. Aquele que só amou foi traído, ultrajado, cuspido, espancado, desprezado, mal interpretado, injustiçado e não reagiu, não disse nada. Por amor. Jesus entendia que o amor esconde a dor e que não há como separar os dois, assim como não há como separar o amor da humilhação, do esvaziamento, da oração da liberdade, do próprio Deus, da oração.
O amor e a morte andam juntos, muito juntos. O amor e a dor, o sofrimento, são uma coisa só. Um grande silêncio os esconde, como escondeu Jesus no túmulo. Neste silêncio, como no coração de Maria, é gerada a vida, a ressurreição, que é a vitória final e eterna do que ama por ser amado por Deus, que ama por amor a Deus.
O Mestre do Amor subiu o calvário e, vencendo a morte com o poder do amor do Pai, ressuscita e sobe ao céu para que entendamos que só quem deseja morrer, como o grão de trigo, como Ele, só esse ressuscitará para cantar com os anjos: "Urbi Charitas, Deus ibi"(*).
  
(*) Onde (há) a caridade, Deus aí (é).

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