A liturgia deste domingo tem como cenário de fundo o projeto salvador
de Deus. No batismo de Jesus nas margens do Jordão, revela-se o Filho
amado de Deus, que veio ao mundo enviado pelo Pai, com a missão de
salvar e libertar os homens. Cumprindo o projeto do Pai, Ele fez-se um
de nós, partilhou a nossa fragilidade e humanidade, libertou-nos do
egoísmo e do pecado e empenhou-Se em promover-nos, para que pudéssemos
chegar à vida em plenitude.
A primeira leitura anuncia um misterioso “Servo”, escolhido por Deus e enviado aos homens para instaurar um mundo de justiça e de paz sem fim… Investido do Espírito de Deus, ele concretizará essa missão com humildade e simplicidade, sem recorrer ao poder, à imposição, à prepotência, pois esses esquemas não são os de Deus.
No Evangelho, aparece-nos a concretização da promessa profética: Jesus é o Filho/”Servo” enviado pelo Pai, sobre quem repousa o Espírito e cuja missão é realizar a libertação dos homens. Obedecendo ao Pai, Ele tornou-Se pessoa, identificou-Se com as fragilidades dos homens, caminhou ao lado deles, a fim de os promover e de os levar à reconciliação com Deus, à vida em plenitude.
A segunda leitura reafirma que Jesus é o Filho amado que o Pai enviou ao mundo para concretizar um projecto de salvação; por isso, Ele “passou pelo mundo fazendo o bem” e libertando todos os que eram oprimidos. É este o testemunho que os discípulos devem dar, para que a salvação que Deus oferece chegue a todos os povos da terra.
LEITURA I – Is 42,1-4.6-7
Leitura do Livro de Isaías
Diz o Senhor:
«Eis o meu servo, a quem Eu protejo, o meu eleito, enlevo da minha alma.
Sobre ele fiz repousar o meu espírito, para que leve a justiça às nações.
Não gritará, nem levantará a voz, nem se fará ouvir nas praças; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que ainda fumega: proclamará fielmente a justiça.
Não desfalecerá nem desistirá, enquanto não estabelecer a justiça na terra, a doutrina que as ilhas longínquas esperam.
Fui Eu, o Senhor, que te chamei segundo a justiça; tomei-te pela mão, formei-te e fiz de ti a aliança do povo e a luz das nações, para abrires os olhos aos cegos, tirares do cárcere os prisioneiros
e da prisão os que habitam nas trevas».
AMBIENTE
O nosso texto pertence ao “Livro da Consolação” do Deutero-Isaías (cf. Is 40-55). “Deutero-Isaías” é um nome convencional com que os biblistas designam um profeta anónimo da escola de Isaías, que cumpriu a sua missão profética na Babilónia, entre os exilados judeus. Estamos na fase final do Exílio, entre 550 e 539 a.C.; os judeus exilados estão frustrados e desorientados pois, apesar das promessas do profeta Ezequiel, a libertação tarda… Será que Deus se esqueceu do seu Povo? Será que as promessas proféticas eram apenas “conversa fiada”?
O Deutero-Isaías aparece então com uma mensagem destinada a consolar os exilados. Começa por anunciar a iminência da libertação e por comparar a saída da Babilônia ao antigo êxodo, quando Deus libertou o seu Povo da escravidão do Egipto (cf. Is 40-48); depois, anuncia a reconstrução de Jerusalém, essa cidade que a guerra reduziu a cinzas, mas à qual Deus vai fazer regressar a alegria e a paz sem fim (cf. Is 49-55).
No meio desta proposta “consoladora” aparecem, contudo, quatro textos (cf. Is 42,1-9; 49,1-13; 50,4-11; 52,13-53,12) que fogem um tanto a esta temática. São cânticos que falam de uma personagem misteriosa e enigmática, que os biblistas designam como o “Servo de Jahwéh”: ele é um predilecto de Jahwéh, a quem Deus chamou, a quem confiou uma missão profética e a quem enviou aos homens de todo o mundo; a sua missão cumpre-se no sofrimento e numa entrega incondicional à Palavra; o sofrimento do profeta tem, contudo, um valor expiatório e redentor, pois dele resulta o perdão para o pecado do Povo; Deus aprecia o sacrifício deste “Servo” e recompensá-lo-á, fazendo-o triunfar diante dos seus detratores e adversários.
O texto que hoje nos é proposto é parte do primeiro cântico do “Servo” (cf. Is 42,1-9). É possível que a personagem referenciada neste primeiro cântico seja Ciro, rei dos persas, o homem a quem Deus confiou a libertação do seu Povo…
MENSAGEM
O nosso texto tem duas partes; ambas afirmam – como se estivéssemos diante de dois movimentos concêntricos, que partem do mesmo lugar e terminam da mesma forma – a eleição do “Servo” e a sua missão. No entanto, a primeira desenvolve mais o aspecto do chamamento; a segunda define melhor a questão da missão.
Na primeira parte (vers. 1-4), afirma-se que o “Servo” é um “eleito” (“behir”) de Deus, isto é, alguém que Deus se dignou “escolher” (“bahar”) entre muitos, em vista de uma função ou missão especial (cf. Nm 16,5.7; 17,20; Dt 4,37; 7,6.7; 10,15; 14,2; 18,5; 21,5; 1 Sm 2,28; 10,24; 2 Sm 6,21; 1 Re 3,8; etc.). Estamos no contexto da “eleição”, isto é, no contexto em que Deus destaca alguém de entre muitos para o seu serviço.
A “ordenação” do “Servo” realiza-se através do dom do Espírito (“ruah”), que dará ao “Servo” o alento de Jahwéh, a capacidade para levar a cabo a missão: é o mesmo Espírito que Deus derrama sobre os chefes carismáticos do Povo de Deus (cf. Jz 33,10; 1 Sm 9,17; 16,12-13). Animado por esse Espírito, o “Servo” irá levar “a justiça (‘mishpat’) às nações”: será uma missão de âmbito universal, que consistirá na implementação das decisões justas dos tribunais, base de uma ordem social consentânea com os esquemas e os projectos de Deus. A implementação dessa “nova ordem” não se dará com o recurso à força, à violência, ao espectáculo, mas com a bondade, a mansidão, a simplicidade que definem a lógica de Deus. Sobretudo, o “Servo” actuará com simplicidade, sem nada impor e sem desanimar perante as dificuldades da missão.
Na segunda parte (vers. 6-7), começa-se por afirmar que o “Servo” foi “chamado” pelo Senhor e, imediatamente, passa-se à finalidade desse chamamento: instaurar “a justiça” (“tzedeq”) – isto é, a missão do “Servo” é o estabelecimento de uma recta ordem social. Explicitando melhor a missão do “Servo”, Deus convida-o a ser “a luz das nações” e, em concreto, a abrir os olhos aos cegos, a tirar do cárcere os prisioneiros e da prisão os que habitam nas trevas. É, portanto, uma missão de libertação e de salvação.
Nas duas partes fica claro que o “Servo” é um instrumento através do qual Deus actua no mundo para levar a salvação aos homens: Ele é alguém que Deus escolheu entre muitos, a quem chamou e a quem confiou uma missão – trazer a justiça, propor a todas as nações uma nova ordem social da qual desaparecerão as trevas que alienam e impedem de caminhar e oferecer a todos os homens a liberdade e a paz. Deus não só está na origem (escolha, chamamento e envio) da missão do “Servo”, mas acompanhará a concretização da missão e possibilitará o seu êxito: para levar a cabo a missão, o “Servo” contará com a ajuda do Espírito de Deus, que lhe dará a força de assumir a missão e de concretizá-la.
ATUALIZAÇÃO
A reflexão pode partir das seguintes questões:
• A figura misteriosa e enigmática do “Servo” de que fala o Deutero-Isaías apresenta evidentes pontos de contacto com a figura de Jesus… Os primeiros cristãos – colocados perante a dificuldade de explicar como é que o Messias tinha sido condenado pelos homens e pregado na cruz – irão utilizar os cânticos do “Servo” para justificar o sofrimento e o aparente fracasso humano de Jesus: Ele é esse “eleito de Deus”, que recebeu a plenitude do Espírito, que veio ao encontro dos homens com a missão de trazer a justiça e a paz definitivas, que sofreu e morreu para ser fiel a essa missão que o Pai lhe confiou.
• A história do “Servo” mostra-nos, desde já, que Deus atua através de instrumentos a quem Ele confia a transformação do mundo e a libertação dos homens. Tenho consciência de que cada batizado é um instrumento de Deus na renovação e transformação do mundo? Estou disposto a corresponder ao chamamento de Deus e a assumir os meus compromissos quanto a esta questão, ou prefiro fechar-me no meu canto e demitir-me da minha responsabilidade profética? Os pobres, os oprimidos, todos os que “jazem nas trevas e nas sobras da morte” podem contar com o meu apoio e empenho?
• Convém não esquecer que a missão profética só faz sentido à luz de Deus e que tudo parte da iniciativa de Deus: é Ele que escolhe, que chama, que envia e que capacita para a missão… Aquilo que eu faço, por mais válido que seja, não é obra minha, mas sim de Deus; o meu êxito na missão não resulta das minhas qualidades, mas da iniciativa de Deus que age em mim e através de mim.
• Atentemos ainda na forma de atuar do “Servo”: ele não se impõe pela força, pela violência, pelo dinheiro, ou pelos amigos poderosos; mas atua com suavidade, com mansidão, no respeito pela liberdade dos outros… É esta lógica – a lógica de Deus – que eu utilizo no desempenho da missão profética que Deus me confiou?
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 28 (29)
Refrão: O Senhor abençoará o seu povo na paz.
Tributai ao Senhor, filhos de Deus,
tributai ao Senhor glória e poder.
Tributai ao Senhor a glória do seu nome,
adorai o Senhor com ornamentos sagrados.
A vos do Senhor ressoa sobre as nuvens,
o Senhor está sobre a vastidão das águas.
A voz do Senhor é poderosa,
a voz do Senhor é majestosa.
A majestade de Deus faz ecoar o seu trovão
e no seu templo todos clamam: Glória!
Sobre as águas do dilúvio senta-Se o Senhor,
o Senhor senta-Se como rei eterno.
LEITURA II – Atos 10,34-38
Leitura dos Atos dos Apóstolos
Naqueles dias,
Pedro tomou a palavra e disse: «Na verdade, eu reconheço que Deus não faz acepção de pessoas, mas, em qualquer nação, aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável.
Ele enviou a sua palavra aos filhos de Israel, anunciando a paz por Jesus Cristo, que é o Senhor de todos.
Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia, depois do baptismo que João pregou: Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demônio, porque Deus estava com Ele».
AMBIENTE
Os “Actos dos Apóstolos” são uma catequese sobre a “etapa da Igreja”, isto é, sobre a forma como os discípulos assumiram ou continuaram o projecto salvador do Pai e o levaram – após a partida de Jesus deste mundo – a todos os homens.
O livro divide-se em duas partes. Na primeira (cf. Act 1-12), a reflexão apresenta-nos a difusão do Evangelho dentro das fronteiras palestinas, por acção de Pedro e dos Doze; a segunda (cf. Act 13-28) apresenta-nos a expansão do Evangelho fora da Palestina (até Roma), sobretudo por acção de Paulo.
O nosso texto de hoje está integrado na primeira parte dos “Atos”. Insere-se numa perícopa que descreve a atividade missionária de Pedro na planície do Sharon (cf. Act 9,32-11,18) – isto é, na planície junto da orla mediterrânica palestina. Em concreto, o texto propõe-nos o testemunho e a catequese de Pedro em Cesareia, em casa do centurião romano Cornélio. Convocado pelo Espírito (cf. Act 10,19-20), Pedro entra em casa de Cornélio, expõe-lhe o essencial da fé e batiza-o, bem como a toda a sua família (cf. Act 10,23b-48). O episódio é importante porque Cornélio é o primeiro pagão a cem por cento a ser admitido ao cristianismo por um dos Doze: significa que a vida nova que nasce de Jesus se destina a todos os homens.
MENSAGEM
No seu discurso, Pedro começa por reconhecer que a proposta de salvação oferecida por Deus e trazida por Cristo é universal e se destina a todas as pessoas, sem distinção de qualquer tipo (vers. 34-36). Israel foi, na verdade, o primeiro receptor privilegiado da Palavra de Deus; mas Cristo veio trazer a “boa nova da paz” (salvação) a todos os homens; e agora, por intermédio das testemunhas de Jesus, essa proposta de salvação que o Pai faz chegar “a qualquer nação que o teme e põe em prática a justiça” – ou seja, a todo o homem e mulher, sem distinção de raça, de cor, de estatuto social, que aceita a proposta e adere a Jesus.
Depois de definir os contornos universais da proposta salvadora de Deus, Pedro apresenta uma espécie de resumo da fé primitiva (vers. 37-38). É, nem mais nem menos, do que o pôr em acto a missão fundamental dos discípulos: anunciar Jesus e testemunhar essa salvação que deve chegar a todos os homens. A leitura que nos é proposta conserva apenas a parte inicial do “kerigma” primitivo e resume a actividade de Jesus que “passou pelo mundo fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demónio, porque Deus estava com Ele” (vers. 38). No entanto, o anúncio de Pedro continua (embora a nossa leitura de hoje não o refira) com a catequese sobre a morte (vers. 39), sobre a ressurreição (vers. 40) e sobre a dimensão salvífica da vida de Jesus (vers. 43).
ATUALIZAÇÃO
Na reflexão e partilha, considerar os seguintes elementos:
• Jesus de Nazaré “passou pelo mundo fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demónio”. Nos seus gestos de bondade, de misericórdia, de perdão, de solidariedade, de amor, os homens encontraram o projecto libertador de Deus em acção… Esse projecto continua hoje em acção no mundo? Nós, cristãos, comprometidos com Cristo e com a sua missão desde o nosso baptismo, testemunhamos, em gestos concretos, a bondade, a misericórdia, o perdão e o amor de Deus pelos homens? Empenhamo-nos em libertar todos os que são oprimidos pelo demônio do egoísmo, da injustiça, da exploração, da solidão, da doença, do analfabetismo, do sofrimento?
• “Reconheço que Deus não faz acepção de pessoas” – diz Pedro no seu discurso em casa de Cornélio. E nós, filhos deste Deus que ama a todos da mesma forma e que a todos oferece igualmente a salvação, aceitamos todos os irmãos da mesma forma, reconhecendo a igualdade fundamental de todos os homens em direitos e dignidade? Que sentido fazem então as discriminações por causa da cor da pele, da raça, do sexo, da orientação sexual ou do estatuto social?
ALELUIA – cf. Mc 9,6
Aleluia. Aleluia.
Abriram-se os céus e ouviu-se a voz do Pai:
«Este é o meu Filho muito amado: escutai-O».
A primeira leitura anuncia um misterioso “Servo”, escolhido por Deus e enviado aos homens para instaurar um mundo de justiça e de paz sem fim… Investido do Espírito de Deus, ele concretizará essa missão com humildade e simplicidade, sem recorrer ao poder, à imposição, à prepotência, pois esses esquemas não são os de Deus.
No Evangelho, aparece-nos a concretização da promessa profética: Jesus é o Filho/”Servo” enviado pelo Pai, sobre quem repousa o Espírito e cuja missão é realizar a libertação dos homens. Obedecendo ao Pai, Ele tornou-Se pessoa, identificou-Se com as fragilidades dos homens, caminhou ao lado deles, a fim de os promover e de os levar à reconciliação com Deus, à vida em plenitude.
A segunda leitura reafirma que Jesus é o Filho amado que o Pai enviou ao mundo para concretizar um projecto de salvação; por isso, Ele “passou pelo mundo fazendo o bem” e libertando todos os que eram oprimidos. É este o testemunho que os discípulos devem dar, para que a salvação que Deus oferece chegue a todos os povos da terra.
LEITURA I – Is 42,1-4.6-7
Leitura do Livro de Isaías
Diz o Senhor:
«Eis o meu servo, a quem Eu protejo, o meu eleito, enlevo da minha alma.
Sobre ele fiz repousar o meu espírito, para que leve a justiça às nações.
Não gritará, nem levantará a voz, nem se fará ouvir nas praças; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que ainda fumega: proclamará fielmente a justiça.
Não desfalecerá nem desistirá, enquanto não estabelecer a justiça na terra, a doutrina que as ilhas longínquas esperam.
Fui Eu, o Senhor, que te chamei segundo a justiça; tomei-te pela mão, formei-te e fiz de ti a aliança do povo e a luz das nações, para abrires os olhos aos cegos, tirares do cárcere os prisioneiros
e da prisão os que habitam nas trevas».
AMBIENTE
O nosso texto pertence ao “Livro da Consolação” do Deutero-Isaías (cf. Is 40-55). “Deutero-Isaías” é um nome convencional com que os biblistas designam um profeta anónimo da escola de Isaías, que cumpriu a sua missão profética na Babilónia, entre os exilados judeus. Estamos na fase final do Exílio, entre 550 e 539 a.C.; os judeus exilados estão frustrados e desorientados pois, apesar das promessas do profeta Ezequiel, a libertação tarda… Será que Deus se esqueceu do seu Povo? Será que as promessas proféticas eram apenas “conversa fiada”?
O Deutero-Isaías aparece então com uma mensagem destinada a consolar os exilados. Começa por anunciar a iminência da libertação e por comparar a saída da Babilônia ao antigo êxodo, quando Deus libertou o seu Povo da escravidão do Egipto (cf. Is 40-48); depois, anuncia a reconstrução de Jerusalém, essa cidade que a guerra reduziu a cinzas, mas à qual Deus vai fazer regressar a alegria e a paz sem fim (cf. Is 49-55).
No meio desta proposta “consoladora” aparecem, contudo, quatro textos (cf. Is 42,1-9; 49,1-13; 50,4-11; 52,13-53,12) que fogem um tanto a esta temática. São cânticos que falam de uma personagem misteriosa e enigmática, que os biblistas designam como o “Servo de Jahwéh”: ele é um predilecto de Jahwéh, a quem Deus chamou, a quem confiou uma missão profética e a quem enviou aos homens de todo o mundo; a sua missão cumpre-se no sofrimento e numa entrega incondicional à Palavra; o sofrimento do profeta tem, contudo, um valor expiatório e redentor, pois dele resulta o perdão para o pecado do Povo; Deus aprecia o sacrifício deste “Servo” e recompensá-lo-á, fazendo-o triunfar diante dos seus detratores e adversários.
O texto que hoje nos é proposto é parte do primeiro cântico do “Servo” (cf. Is 42,1-9). É possível que a personagem referenciada neste primeiro cântico seja Ciro, rei dos persas, o homem a quem Deus confiou a libertação do seu Povo…
MENSAGEM
O nosso texto tem duas partes; ambas afirmam – como se estivéssemos diante de dois movimentos concêntricos, que partem do mesmo lugar e terminam da mesma forma – a eleição do “Servo” e a sua missão. No entanto, a primeira desenvolve mais o aspecto do chamamento; a segunda define melhor a questão da missão.
Na primeira parte (vers. 1-4), afirma-se que o “Servo” é um “eleito” (“behir”) de Deus, isto é, alguém que Deus se dignou “escolher” (“bahar”) entre muitos, em vista de uma função ou missão especial (cf. Nm 16,5.7; 17,20; Dt 4,37; 7,6.7; 10,15; 14,2; 18,5; 21,5; 1 Sm 2,28; 10,24; 2 Sm 6,21; 1 Re 3,8; etc.). Estamos no contexto da “eleição”, isto é, no contexto em que Deus destaca alguém de entre muitos para o seu serviço.
A “ordenação” do “Servo” realiza-se através do dom do Espírito (“ruah”), que dará ao “Servo” o alento de Jahwéh, a capacidade para levar a cabo a missão: é o mesmo Espírito que Deus derrama sobre os chefes carismáticos do Povo de Deus (cf. Jz 33,10; 1 Sm 9,17; 16,12-13). Animado por esse Espírito, o “Servo” irá levar “a justiça (‘mishpat’) às nações”: será uma missão de âmbito universal, que consistirá na implementação das decisões justas dos tribunais, base de uma ordem social consentânea com os esquemas e os projectos de Deus. A implementação dessa “nova ordem” não se dará com o recurso à força, à violência, ao espectáculo, mas com a bondade, a mansidão, a simplicidade que definem a lógica de Deus. Sobretudo, o “Servo” actuará com simplicidade, sem nada impor e sem desanimar perante as dificuldades da missão.
Na segunda parte (vers. 6-7), começa-se por afirmar que o “Servo” foi “chamado” pelo Senhor e, imediatamente, passa-se à finalidade desse chamamento: instaurar “a justiça” (“tzedeq”) – isto é, a missão do “Servo” é o estabelecimento de uma recta ordem social. Explicitando melhor a missão do “Servo”, Deus convida-o a ser “a luz das nações” e, em concreto, a abrir os olhos aos cegos, a tirar do cárcere os prisioneiros e da prisão os que habitam nas trevas. É, portanto, uma missão de libertação e de salvação.
Nas duas partes fica claro que o “Servo” é um instrumento através do qual Deus actua no mundo para levar a salvação aos homens: Ele é alguém que Deus escolheu entre muitos, a quem chamou e a quem confiou uma missão – trazer a justiça, propor a todas as nações uma nova ordem social da qual desaparecerão as trevas que alienam e impedem de caminhar e oferecer a todos os homens a liberdade e a paz. Deus não só está na origem (escolha, chamamento e envio) da missão do “Servo”, mas acompanhará a concretização da missão e possibilitará o seu êxito: para levar a cabo a missão, o “Servo” contará com a ajuda do Espírito de Deus, que lhe dará a força de assumir a missão e de concretizá-la.
ATUALIZAÇÃO
A reflexão pode partir das seguintes questões:
• A figura misteriosa e enigmática do “Servo” de que fala o Deutero-Isaías apresenta evidentes pontos de contacto com a figura de Jesus… Os primeiros cristãos – colocados perante a dificuldade de explicar como é que o Messias tinha sido condenado pelos homens e pregado na cruz – irão utilizar os cânticos do “Servo” para justificar o sofrimento e o aparente fracasso humano de Jesus: Ele é esse “eleito de Deus”, que recebeu a plenitude do Espírito, que veio ao encontro dos homens com a missão de trazer a justiça e a paz definitivas, que sofreu e morreu para ser fiel a essa missão que o Pai lhe confiou.
• A história do “Servo” mostra-nos, desde já, que Deus atua através de instrumentos a quem Ele confia a transformação do mundo e a libertação dos homens. Tenho consciência de que cada batizado é um instrumento de Deus na renovação e transformação do mundo? Estou disposto a corresponder ao chamamento de Deus e a assumir os meus compromissos quanto a esta questão, ou prefiro fechar-me no meu canto e demitir-me da minha responsabilidade profética? Os pobres, os oprimidos, todos os que “jazem nas trevas e nas sobras da morte” podem contar com o meu apoio e empenho?
• Convém não esquecer que a missão profética só faz sentido à luz de Deus e que tudo parte da iniciativa de Deus: é Ele que escolhe, que chama, que envia e que capacita para a missão… Aquilo que eu faço, por mais válido que seja, não é obra minha, mas sim de Deus; o meu êxito na missão não resulta das minhas qualidades, mas da iniciativa de Deus que age em mim e através de mim.
• Atentemos ainda na forma de atuar do “Servo”: ele não se impõe pela força, pela violência, pelo dinheiro, ou pelos amigos poderosos; mas atua com suavidade, com mansidão, no respeito pela liberdade dos outros… É esta lógica – a lógica de Deus – que eu utilizo no desempenho da missão profética que Deus me confiou?
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 28 (29)
Refrão: O Senhor abençoará o seu povo na paz.
Tributai ao Senhor, filhos de Deus,
tributai ao Senhor glória e poder.
Tributai ao Senhor a glória do seu nome,
adorai o Senhor com ornamentos sagrados.
A vos do Senhor ressoa sobre as nuvens,
o Senhor está sobre a vastidão das águas.
A voz do Senhor é poderosa,
a voz do Senhor é majestosa.
A majestade de Deus faz ecoar o seu trovão
e no seu templo todos clamam: Glória!
Sobre as águas do dilúvio senta-Se o Senhor,
o Senhor senta-Se como rei eterno.
LEITURA II – Atos 10,34-38
Leitura dos Atos dos Apóstolos
Naqueles dias,
Pedro tomou a palavra e disse: «Na verdade, eu reconheço que Deus não faz acepção de pessoas, mas, em qualquer nação, aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável.
Ele enviou a sua palavra aos filhos de Israel, anunciando a paz por Jesus Cristo, que é o Senhor de todos.
Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia, depois do baptismo que João pregou: Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demônio, porque Deus estava com Ele».
AMBIENTE
Os “Actos dos Apóstolos” são uma catequese sobre a “etapa da Igreja”, isto é, sobre a forma como os discípulos assumiram ou continuaram o projecto salvador do Pai e o levaram – após a partida de Jesus deste mundo – a todos os homens.
O livro divide-se em duas partes. Na primeira (cf. Act 1-12), a reflexão apresenta-nos a difusão do Evangelho dentro das fronteiras palestinas, por acção de Pedro e dos Doze; a segunda (cf. Act 13-28) apresenta-nos a expansão do Evangelho fora da Palestina (até Roma), sobretudo por acção de Paulo.
O nosso texto de hoje está integrado na primeira parte dos “Atos”. Insere-se numa perícopa que descreve a atividade missionária de Pedro na planície do Sharon (cf. Act 9,32-11,18) – isto é, na planície junto da orla mediterrânica palestina. Em concreto, o texto propõe-nos o testemunho e a catequese de Pedro em Cesareia, em casa do centurião romano Cornélio. Convocado pelo Espírito (cf. Act 10,19-20), Pedro entra em casa de Cornélio, expõe-lhe o essencial da fé e batiza-o, bem como a toda a sua família (cf. Act 10,23b-48). O episódio é importante porque Cornélio é o primeiro pagão a cem por cento a ser admitido ao cristianismo por um dos Doze: significa que a vida nova que nasce de Jesus se destina a todos os homens.
MENSAGEM
No seu discurso, Pedro começa por reconhecer que a proposta de salvação oferecida por Deus e trazida por Cristo é universal e se destina a todas as pessoas, sem distinção de qualquer tipo (vers. 34-36). Israel foi, na verdade, o primeiro receptor privilegiado da Palavra de Deus; mas Cristo veio trazer a “boa nova da paz” (salvação) a todos os homens; e agora, por intermédio das testemunhas de Jesus, essa proposta de salvação que o Pai faz chegar “a qualquer nação que o teme e põe em prática a justiça” – ou seja, a todo o homem e mulher, sem distinção de raça, de cor, de estatuto social, que aceita a proposta e adere a Jesus.
Depois de definir os contornos universais da proposta salvadora de Deus, Pedro apresenta uma espécie de resumo da fé primitiva (vers. 37-38). É, nem mais nem menos, do que o pôr em acto a missão fundamental dos discípulos: anunciar Jesus e testemunhar essa salvação que deve chegar a todos os homens. A leitura que nos é proposta conserva apenas a parte inicial do “kerigma” primitivo e resume a actividade de Jesus que “passou pelo mundo fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demónio, porque Deus estava com Ele” (vers. 38). No entanto, o anúncio de Pedro continua (embora a nossa leitura de hoje não o refira) com a catequese sobre a morte (vers. 39), sobre a ressurreição (vers. 40) e sobre a dimensão salvífica da vida de Jesus (vers. 43).
ATUALIZAÇÃO
Na reflexão e partilha, considerar os seguintes elementos:
• Jesus de Nazaré “passou pelo mundo fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demónio”. Nos seus gestos de bondade, de misericórdia, de perdão, de solidariedade, de amor, os homens encontraram o projecto libertador de Deus em acção… Esse projecto continua hoje em acção no mundo? Nós, cristãos, comprometidos com Cristo e com a sua missão desde o nosso baptismo, testemunhamos, em gestos concretos, a bondade, a misericórdia, o perdão e o amor de Deus pelos homens? Empenhamo-nos em libertar todos os que são oprimidos pelo demônio do egoísmo, da injustiça, da exploração, da solidão, da doença, do analfabetismo, do sofrimento?
• “Reconheço que Deus não faz acepção de pessoas” – diz Pedro no seu discurso em casa de Cornélio. E nós, filhos deste Deus que ama a todos da mesma forma e que a todos oferece igualmente a salvação, aceitamos todos os irmãos da mesma forma, reconhecendo a igualdade fundamental de todos os homens em direitos e dignidade? Que sentido fazem então as discriminações por causa da cor da pele, da raça, do sexo, da orientação sexual ou do estatuto social?
ALELUIA – cf. Mc 9,6
Aleluia. Aleluia.
Abriram-se os céus e ouviu-se a voz do Pai:
«Este é o meu Filho muito amado: escutai-O».
EVANGELHO – Mc 1,7-11
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, João começou a pregar, dizendo: «Vai chegar depois de mim quem é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias.
Eu batizo na água, mas Ele batizar-vos-á no Espírito Santo».
Sucedeu que, naqueles dias, Jesus veio de Nazaré da Galileia
e foi batizado por João no rio Jordão.
Ao subir da água, viu os céus rasgarem-se e o Espírito, como uma pomba, descer sobre ele.
E dos céus ouviu-se uma voz: «Tu és o meu Filho muito amado, em Ti pus toda a minha complacência».
AMBIENTE
O Evangelho deste domingo apresenta o encontro entre Jesus e João Baptista, nas margens do rio Jordão. Na circunstância, Jesus foi baptizado por João.
João Baptista foi o guia carismático de um movimento de cariz popular, que anunciava a proximidade do “juízo de Deus”. A sua mensagem estava centrada na urgência da conversão (pois, na opinião de João, a intervenção definitiva de Deus na história para destruir o mal estava iminente) e incluía um rito de purificação pela água.
O “batismo” proposto por João não era, na verdade, uma novidade insólita. O judaísmo conhecia ritos diversos de imersão na água, sempre ligados a contextos de purificação ou de mudança de vida. Era, inclusive, um rito usado na integração dos “prosélitos” (os pagãos que aderiam ao judaísmo) na comunidade do Povo de Deus.
Na perspectiva de João, provavelmente, este “batismo” é um rito de iniciação à comunidade messiânica: quem aceitava este “batismo”, renunciava ao pecado, convertia-se a uma vida nova e passava a integrar a comunidade do Messias.
O que é que Jesus tem a ver com isto? Que sentido faz Ele apresentar-Se a João para receber este “batismo” de purificação, de arrependimento e de perdão dos pecados?
O texto que hoje nos é proposto faz parte de um conjunto de três cenas iniciais (cf. Mc 1,2-8; 1,9-11; 1,12-13) nas quais Marcos apresenta Jesus como o Messias, Filho de Deus. Nesse tríptico, fica desde logo definida a missão específica e a verdadeira identidade de Jesus. Estas indicações iniciais irão depois ser desenvolvidas e completadas ao longo do Evangelho.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, João começou a pregar, dizendo: «Vai chegar depois de mim quem é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias.
Eu batizo na água, mas Ele batizar-vos-á no Espírito Santo».
Sucedeu que, naqueles dias, Jesus veio de Nazaré da Galileia
e foi batizado por João no rio Jordão.
Ao subir da água, viu os céus rasgarem-se e o Espírito, como uma pomba, descer sobre ele.
E dos céus ouviu-se uma voz: «Tu és o meu Filho muito amado, em Ti pus toda a minha complacência».
AMBIENTE
O Evangelho deste domingo apresenta o encontro entre Jesus e João Baptista, nas margens do rio Jordão. Na circunstância, Jesus foi baptizado por João.
João Baptista foi o guia carismático de um movimento de cariz popular, que anunciava a proximidade do “juízo de Deus”. A sua mensagem estava centrada na urgência da conversão (pois, na opinião de João, a intervenção definitiva de Deus na história para destruir o mal estava iminente) e incluía um rito de purificação pela água.
O “batismo” proposto por João não era, na verdade, uma novidade insólita. O judaísmo conhecia ritos diversos de imersão na água, sempre ligados a contextos de purificação ou de mudança de vida. Era, inclusive, um rito usado na integração dos “prosélitos” (os pagãos que aderiam ao judaísmo) na comunidade do Povo de Deus.
Na perspectiva de João, provavelmente, este “batismo” é um rito de iniciação à comunidade messiânica: quem aceitava este “batismo”, renunciava ao pecado, convertia-se a uma vida nova e passava a integrar a comunidade do Messias.
O que é que Jesus tem a ver com isto? Que sentido faz Ele apresentar-Se a João para receber este “batismo” de purificação, de arrependimento e de perdão dos pecados?
O texto que hoje nos é proposto faz parte de um conjunto de três cenas iniciais (cf. Mc 1,2-8; 1,9-11; 1,12-13) nas quais Marcos apresenta Jesus como o Messias, Filho de Deus. Nesse tríptico, fica desde logo definida a missão específica e a verdadeira identidade de Jesus. Estas indicações iniciais irão depois ser desenvolvidas e completadas ao longo do Evangelho.
MENSAGEM
Quem é, pois, Jesus e qual a sua missão, de acordo com a mensagem do episódio que a liturgia de hoje nos propõe?
Na primeira parte do nosso texto (vers. 7-8), Marcos apresenta o testemunho de João Baptista sobre Jesus. Aí, Jesus é definido por João como “Aquele que é mais forte do que eu, diante do qual não sou digno de me inclinar para lhe desatar as correias das sandálias” e como “Aquele que há-de baptizar-vos no Espírito Santo”. Tanto a fortaleza como o batismo no Espírito são prerrogativas que caracterizam o Messias que Israel esperava (cf. Is 9,5-6; 11,2). O testemunho de João não oferece dúvidas: Jesus é esse Messias anunciado pelos profetas, que Deus vai enviar para libertar o seu Povo e para lhe dar a vida definitiva.
O testemunho de João irá, logo, ser confirmado pelo testemunho do próprio Deus. Na cena do baptismo, Marcos faz referência a uma voz vinda do céu que apresenta Jesus como “o meu Filho muito amado” (vers. 11). Esse Messias esperado é também o Filho amado de Deus, enviado aos homens para os “batizar no Espírito” e para os inserir numa dinâmica de vida nova – a vida no Espírito.
O testemunho de Deus é acompanhado por três fatos estranhos que, no entanto, devem ser entendidos em referência a fatos e símbolos do Antigo Testamento…
Assim, a abertura do céu significa a união da terra e do céu. A imagem inspira-se, provavelmente, em Is 63,19, onde o profeta pede a Deus que “abra os céus” e desça ao encontro do seu Povo, refazendo essa relação que o pecado do Povo interrompeu. Desta forma, Marcos anuncia que a atividade de Jesus vai reconciliar o céu e a terra, vai refazer a comunhão entre Deus e os homens.
O símbolo da pomba não é imediatamente claro… Provavelmente, não se trata de uma alusão à pomba que Noé libertou e que retornou à arca (cf. Gn 8,8-12); é mais provável que a pomba (em certas tradições judaicas, símbolo do Espírito de Deus que, no início, pairava sobra as águas – cf. Gn 1,2) evoque a nova criação que terá lugar a partir da actividade que Jesus vai iniciar.
Temos, finalmente, a voz do céu. Trata-se de uma forma muito usada pelos rabbis para expressar a opinião de Deus acerca de uma pessoa ou de um acontecimento. Essa voz declara que Jesus é o Filho de Deus; e fá-lo com uma fórmula tomada desse cântico do “Servo de Jahwéh” que vimos na primeira leitura de hoje (cf. Is 42,1)… Afirma-se, de forma clara, que Jesus é o Filho de Deus… Mas a referência ao Servo de Jahwéh sugere que a missão de Jesus não se desenrolará no triunfalismo, mas na obediência total ao Pai; não se cumprirá com poder e prepotência, mas na suavidade, na simplicidade, no respeito pelos homens (“não gritará, nem levantará a voz; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que ainda fumega” – Is 42,2-3).
Porque é que Jesus quis ser baptizado por João? Jesus necessitava de um baptismo cujo significado primordial estava ligado à penitência, ao perdão dos pecados e à mudança de vida? Ao receber este batismo de penitência e de perdão dos pecados (do qual não precisava, porque Ele não conheceu o pecado), Jesus solidarizou-Se com o homem limitado e pecador, assumiu a sua condição, colocou-Se ao lado dos homens para os ajudar a sair dessa situação e para percorrer com eles o caminho da libertação, o caminho da vida plena. Esse era o projeto do Pai, que Jesus cumpriu integralmente.
A cena do baptismo de Jesus revela portanto, essencialmente, que Jesus é o Filho de Deus, que o Pai envia ao mundo a fim de cumprir um projecto de libertação em favor dos homens. Como verdadeiro Filho, Ele obedece ao Pai e cumpre o plano salvador do Pai; por isso, vem ao encontro dos homens, solidariza-Se com eles, assume as suas fragilidades, caminha com eles, refaz a comunhão entre Deus e os homens que o pecado havia interrompido e conduz os homens ao encontro da vida em plenitude. Da actividade de Jesus, o Filho de Deus que cumpre a vontade do Pai, resultará uma nova criação, uma nova humanidade.
ATUALIZAÇÃO
Na reflexão, ter em conta as seguintes questões:
• No episódio do baptismo, Jesus aparece como o Filho amado, que o Pai enviou ao encontro dos homens para os libertar e para os inserir numa dinâmica de comunhão e de vida nova. Nessa cena revela-se, portanto, a preocupação de Deus e o imenso amor que Ele nos dedica… É bonita esta história de um Deus que envia o próprio Filho ao mundo, que pede a esse Filho que Se solidarize com as dores e limitações dos homens e que, através da ação do Filho, reconcilia os homens consigo e fá-los chegar à vida em plenitude. Aquilo que nos é pedido é que correspondamos ao amor do Pai, acolhendo a sua oferta de salvação e seguindo Jesus no amor, na entrega, no dom da vida. Ora, no dia do nosso batismo, comprometemo-nos com esse projeto… Temos, depois disso, renovado diariamente o nosso compromisso e percorrido, com coerência, esse caminho que Jesus veio propor-nos?
• A celebração do batismo do Senhor leva-nos até um Jesus que assume plenamente a sua condição de “Filho” e que se faz obediente ao Pai, cumprindo integralmente o projecto do Pai de dar vida ao homem. É esta mesma atitude de obediência radical, de entrega incondicional, de confiança absoluta que eu assumo na minha relação com Deus? O projeto de Deus é, para mim, mais importante de que os meus projetos pessoais ou do que os desafios que o mundo me faz?
• O episódio do batismo de Jesus coloca-nos frente a frente com um Deus que aceitou identificar-Se com o homem, partilhar a sua humanidade e fragilidade, a fim de oferecer ao homem um caminho de liberdade e de vida plena. Eu, filho deste Deus, aceito ir ao encontro dos meus irmãos mais desfavorecidos e estender-lhes a mão? Partilho a sorte dos pobres, dos sofredores, dos injustiçados, sofro na alma as suas dores, aceito identificar-me com eles e participar dos seus sofrimentos, a fim de melhor os ajudar a conquistar a liberdade e a vida plena? Não tenho medo de me sujar ao lado dos pecadores, dos marginalizados, se isso contribuir para os promover e para lhes dar mais dignidade e mais esperança?
• No baptismo, Jesus tomou consciência da sua missão (essa missão que o Pai Lhe confiou), recebeu o Espírito e partiu em viagem pelos caminhos poeirentos da Palestina, a testemunhar o projecto libertador do Pai. Eu, que no baptismo aderi a Jesus e recebi o Espírito que me capacitou para a missão, tenho sido uma testemunha séria e comprometida desse programa em que Jesus Se empenhou e pelo qual Ele deu a vida?
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