Está na moda fazer meditação de muitos tipos. A revista Veja (Edição
2407 de 07 de janeiro de 2015, pp.77-84) acaba de publicar um longo
artigo sobre a “ciência da meditação”. Afirma o artigo que deixando o
seu cunho religioso esta prática vai se tornando um meio de relaxamento,
luta contra a ansiedade, depressão, dores, hipertensão, doenças
cardiovasculares, etc.
Na mesma semana o Papa Francisco, na Missa celebrada na capela da Casa Santa Marta, em 09 de janeiro de 2015 disse que:
“Uma sessão de yoga não poderá ensinar um
coração a “sentir” a paternidade de Deus, nem curso de espiritualidade
zen o tornará mais livre para amar. Somente o Espírito Santo tem este
poder. Quem nos ensina a amar? Quem nos liberta dessa dureza?. Somente o
Espírito Santo. Você pode fazer mil cursos de catequese, mil cursos de
espiritualidade, mil cursos de yoga, zen, e todas essas coisas. Mas isso
nunca vai ser capaz de lhe dar a liberdade de filho. Somente o Espírito
Santo move o seu coração para dizer ‘Pai’. Somente o Espírito Santo
torna o coração dócil a Deus e à liberdade” (Zenit.org – 09 de janeiro
de 2015).
Em vista da tendência de alguns mestres
cristãos a adotar métodos e concepções hinduístas de oração, a
Congregação para a Doutrina da Fé publicou uma “Carta sobre a Meditação
Cristã”, em 15 de outubro de 1989; onde analisa a oração cristã em
confronto com a oração hinduísta. Entre outras coisas, diz:
“No Novo testamento, a oração é
apresentada como obra do Espírito Santo, que ensina aos discípulos toda a
verdade, completando a missão de Jesus (cf. 1Cor 2,10; Jo 16,13s).
Vê-se assim que a oração cristão não é mero esforço da mente e das
faculdades do homem para contemplar o Transcendental, mas é Dom de Deus.
Ele se fundamenta e abastece na revelação que Deus faz de si ao homem,
revelação que tem em Cristo seu ponto culminante.
Guiado por este manancial, o cristão não
esquecerá que a sua oração decorre sempre dentro da comunhão dos Santos e
segundo o espírito da Igreja. O cristão nunca ora isoladamente, mesmo
quando está na solidão, mas ora sempre em união com Cristo, no Espírito e
em comunhão com todos os Santos, para o bem da Igreja.
A Carta aborda as “maneiras errôneas de rezar” (nºs. 8-12):
“Os erros do passado continuam a tentar o
homem contemporâneo. Este por vezes reduz a oração a um estado psíquico
ou a uma conquista da mente, que se treina para ampliar as suas
faculdades meramente naturais. Há também, em nossos dias, aqueles
cristãos que se servem de métodos orientais a fim de se preparar para a
contemplação: identificam o Absoluto, concebido pelo budismo, com a
Majestade de Deus, que ultrapassa toda realidade finita: assim tendem a
um conceito de Deus totalmente desligado das manifestações históricas ou
das teofanias do Antigo e do Novo Testamento; negligenciam o mistério
da SS. Trindade para “mergulhar no abismo indefinido da divindade” ou no
nirvana, em que as noções de Eu, Tu e Ele desaparecem. Desta maneira
tem origem pernicioso sincretismo, pois os seus arautos tendem a fundir o
monoteísmo histórico da revelação judeu-cristão com o panteísmo da
filosofia hinduísta.”
Em seguida a Carta fala da “Via Cristã
para a união com Deus” (nºs 13-15), e afirma que “a profunda união com
Deus prometida ao cristão leva a um estado que os antigos mestres gregos
chamavam “divinização”. Esta, porém, nunca extingue a diferença radical
existente entre Criador e criatura; o eu humano jamais poderá ser
absorvido pelo eu divino, nem mesmo nos estados místicos mais elevados…
Assim entre Deus e nós existe diferença, que não impossibilita uma
íntima união. Também pela Eucaristia e os demais sacramentos Cristo nos
faz participar da sua vida divina, sem extinguir a nossa natureza
criada”
“Na concepção cristã, se cumprem todas as
aspirações existentes nas outras correntes religiosas, sem que o eu
pessoal e a sua índole de criatura sejam aniquilados e desapareçam no
oceano do Absoluto. A profissão de que Deus é Amor (1Jo 4,8) explica a
íntima união ou o intercâmbio e o diálogo entre Deus que ama, e a
criatura que é amada. O cristão que recebe o Espírito Santo (o amor
existente entre o Pai e o Filho) é feito “filho no Filho” e exclama
“Abá, Pai”, participando realmente da vida da SS. Trindade” (Cf. Rm 8,
15-17; Gl 4,6).
O documento afirma que “o grande perigo
que ameaça o orante concentrado em si segundo as normas do hinduísmo, é
precisamente o de “permanecer em si”, como se o homem fosse uma centelha
da Divindade encerrada na corporeidade. Santo Agostinho diz a
propósito: “Se queres encontrar a Deus, abandona o mundo exterior, e
entra entre ti. Mas não permaneças em ti; ultrapassa-te, pois tu não és
Deus; Ele é maior do que tu. Deus me é mais íntimo do que o que tenho de
mais íntimo e está acima do que tenho de mais elevado” (Confissões
3,6,11). Ademais ninguém se purifica das paixões nem se aproxima de Deus
a não ser por dom do próprio Deus. Este dom se concretiza, por
excelência, em Jesus Cristo, cujo Espírito Santo nos move interiormente
para participar da vida trinitária…”
“O progresso na vida espiritual (…) não
se pode dizer que seja fruto de alguma técnica ou da arte humana de
conquistar o mistério de Deus; é um dom de Deus, concedido
gratuitamente, cujo beneficiário se sentirá sempre indigno.”
Falando dos “Métodos Psicofísicos e
Corporais” (nºs 26-28) a Carta diz que “seria errôneo identificar a
união com Deus com uma possível euforia resultante de exercícios
físicos… O empenho fiel e generoso da criatura é indispensável, sim, mas
apenas para criar um clima no qual o Espírito Santo possa agir
livremente.
Merece especial atenção à advertência contida no §28 da Carta em pauta:
“Certos exercícios produzem
automaticamente sensações de paz e de distensão, sentimentos
gratificantes ou até fenômenos de luz e calor semelhantes ao bem-estar
espiritual. Considerá-las como autênticas consolações do Espírito Santo
seria uma forma totalmente errônea de conceder o progresso espiritual.
O texto chama a atenção para o risco de
auto-ilusão ocorrente quando o orante dá excessivo valor a sentimentos,
estados psicológicos, imagens mentais na sua vida de oração; pode chegar
a confundir sintomas doentios ou psicopatológicos com experiência
mística, revelações divinas, aparições…; desta maneira entra por um
caminho tortuoso em que as doenças mentais são alimentadas por falsas
concepções religiosas.
O documento conclui dizendo que: “O amor
de Deus, único objeto da contemplação cristã, é uma realidade de que
ninguém se pode apoderar por algum método ou técnica; ao contrário,
devemos ter sempre o olhar fixo sobre Jesus Cristo, através de quem o
amor de Deus chegou até nós… Por conseguinte, havemos de deixar que Deus
decida a maneira pela qual Ele nos fará participar do seu amor. “Tu
podes chamar-me amigo, mas eu me reconheço servidor” (Santo Agostinho,
Com. Sl 142,6).”
Prof. Felipe Aquino
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