terça-feira, 15 de outubro de 2013

O EVANGELHO DE APARECIDA.

Aparecida nos ensina uma grande lição. As circunstâncias concretas de nossa vida são matéria-prima para a permanente parábola evangélica


Dom Demétrio Valentini
Ana Paula Prada








Com a realização, em Aparecida, da V Conferência Latino Americana em 2007, e com a visita do Papa nesse ano ao Santuário Nacional, a festa de Nossa Senhora Aparecida recebeu um destaque especial. Aparecida está se tornando uma referência, não só para a Igreja no Brasil, mas também a Igreja na América Latina, com repercussões positivas em âmbito mundial.

Este destaque se deve, sobretudo, ao “relato de Aparecida”. Trata-se da narrativa dos episódios que compuseram o cenário do encontro da pequena imagem no Rio Paraíba. Estes episódios foram compondo uma espécie de nova “parábola evangélica”, feita de circunstâncias bem concretas, de início ligadas aos pobres pescadores, mas em seguida envolvendo mais pessoas, até a imagem ser reconhecida como um símbolo carregado de mensagens positivas.

Pela maneira como os fatos foram encadeados, a história de Aparecida se reveste de uma singularidade muito especial. Ela assume características bem evangélicas. Ela continua a dinâmica do Evangelho. Em suas parábolas, Cristo sabia organizar suas narrativas de modo a transmitirem a mensagem que ele queria expressar. Assim dá para reconhecer no relato de Aparecida um fio condutor, apontando para valores evangélicos bem evidentes.

Aparecida tem como fato desencadeador da interpretação religiosa, circunstâncias que fazem parte da realidade cotidiana, de consistência indiscutível. É dessas circunstâncias reais e concretas que se fez a costura de todo o episódio. Baseado, portanto, em cenas da vida real, como Cristo fazia em suas parábolas.

Neste sentido, Aparecida não parte de fatos extraordinários, que envolvem a subjetividade das pessoas, como são as “aparições”, sempre necessitadas de discernimento eclesial para serem aceitas.

Aparecida não teve nenhuma “aparição”. Sua mensagem se assenta em dados reais. O Rio Paraíba continua lá, a pequena imagem também, revestida agora do manto que expressa a respeitosa acolhida do mistério, detectado pelos simples pescadores, iluminados por sua fé.

O relato de Aparecida se constitui, na verdade, em exemplo de como perceber a presença do mistério, nas circunstâncias cotidianas da vida. É um relato que não apela, em nenhum momento, para episódios fora da normalidade. Aparecida nos ensina a perceber a presença do mistério de Deus no cotidiano da vida.

O Papa Francisco, em sua homilia aos Bispos do Brasil, no Rio de Janeiro, fez uma exímia interpretação mística de todo o relato de Aparecida. Ele estruturou esse relato em forma de verdadeira parábola, na qual ele se permitiu ir tirando, de imediato, as lições práticas dos diversos momentos do episódio.

Desde o achado da imagem. Mesmo fragmentada, foi acolhida com respeito pelos pescadores. Em sua f​é simples e profunda, souberam valorizar o pequeno símbolo imerso nas águas. Eles mesmos o recompuseram, com sua iniciativa de unir corpo e cabeça. Tiveram cuidado e carinho para com a pequena imagem assim recomposta. Eles a acolheram, protegendo-a, e cobrindo-a com um manto. Assim ela se tornou motivo de atração de outras pessoas, que passaram a se reunir em torno dela, suscitando a necessidade de erguer uma pequena capela, desencadeando o processo de ampliação e difusão de sua mensagem.

Aparecida nos ensina uma grande lição. As circunstâncias concretas de nossa vida são matéria-prima para a permanente parábola evangélica, que somos todos chamados a reescrever. Quanto mais simples forem os episódios desta parábola, mais próximos estarão do Evangelho. Pois Deus continua preferindo o caminho da simplicidade e da pobreza para ele mesmo realizar suas maravilhas, como Maria reconheceu antes de todos!

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