Candente discussão:
AINDA OS PRESERVATIVOS
Em síntese: Há
quem queira justificar o uso de preservativos contra a AIDS, apelando
para o princípio de que, em certas circunstâncias, quando não se pode
fazer o melhor, é lícito escolher o mal menor. Os preservativos seriam
esse mal menor, preferível à contaminação da AIDS ou à própria gravidez
indesejada.
A
resposta ao sofisma é múltipla: 1) os preservativos são tidos como algo
que possibilita "sexo seguro", o que é comprovadamente falso; 2) o
princípio de que se pode escolher um mal menor só se aplica aos casos em
que alguém esteja na obrigação de agir e se veja diante de duas opções
que lhe parecem más; em tal situação, a pessoa tem o dever de esclarecer
a sua consciência para ver se pode escapar à realização de um ato mau;
caso não chegue à clareza, é-lhe lícito escolher o mal menor.
Observe-se, porém, que se supõe estar a pessoa diante do dever de agir,
não podendo fugir à ação; supõe-se também não haver terceira opção. Ora,
tal não é o caso do sexo livre ou das relações extra-matrimoniais; não
constituem um dever, ao qual o interessado não possa escapar. A onda de
erotismo, hoje vigente, não impõe necessariamente a prática do sexo
extraconjugal.
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A revista SEM FRONTEIRAS, abril 1994, pág. 4 (Espaço Livre), responde a uma leitora a respeito de preservativos contra a Al DS nos seguintes termos:
"Claro
que não estamos autorizados a interpretar o pensamento dos bispos (que
combatem os preservativos). Mas achamos que o que eles querem de verdade
é chamar a atenção para o fato de que o sexo não deve ser banalizado.
Dito isso, a gente pode supor que eles não vão querer renegar o
ensinamento tradicional da Igreja, segundo o qual, em determinadas
circunstâncias, não se podendo fazer o melhor, escolhe-se o mal menor
Pode-se
pegar o exemplo da prostituição. É evidente que o Evangelho não a
aprova. Mas nem por isso a Igreja proíbe que sejam tomadas precauções
para evitar males ainda maiores, como, por exemplo, a transmissão de
doenças."
Esse texto merece considerações, que passamos a tecer.
1. ATOS INTRINSECAMENTE MAUS
O
articulista da revista supõe que as relações extraconjugais possam ser
toleradas como um mal menor e, por isso, se devem recomendar
preservativos para quem as pratique.
Ora, a recente encíclica Veritatis Splendor precisamente, entre outras, aborda a questão dos atos maus. Lembra que existem atos intrinsecamente maus, que
nunca podem ser tolerados. Tais seriam: matar um inocente, roubar a
legítima propriedade alheia e também a prostituição. Eis o texto de João
Paulo II:
"A
Igreja ensina que existem atos que, por si e em si mesmos,
independentemente das circunstâncias, são sempre gravemente ilícitos,
por motivo do seu objeto. O Concílio do Vaticano II, no quadro do devido
respeito à pessoa humana, oferece uma ampla exemplificação de tais
atos: 'Tudo quanto se opõe à vida, como seja toda espécie de homicídio,
genocídio, aborto, eutanásia e suicídio voluntário; tudo o que viola a
integridade da pessoa humana, como as mutilações, os tormentos corporais
e mentais e as tentativas de violentar as próprias consciências; tudo
quanto ofende a dignidade da pessoa humana, como as condições de vida
infra-humanas, as prisões arbitrárias, as deportações, a escravidão, a
prostituição, o comércio de mulheres e jovens. . . Todas estas coisas e
outras semelhantes são infamantes; ao mesmo tempo que corrompem a
civilização humana, desonram mais aqueles que assim procedem do que os
que as padecem injustamente; e ofendem gravemente a honra devida ao
Criador" (no 80).
Também
as relações extraconjugais são atos intrinsecamente maus, pois derrogam
à ordem da natureza e implicam desmando da parte dos parceiros. Com
efeito: a doação sexual é a mais íntima que se possa conceber; ela supõe
amor total, comprometido pelo matrimônio, dentro de um lar, onde o
fruto do ato sexual (a prole) possa contar com a atividade educadora de
pai e mãe.
Não
se deve argumentar a partir da onda de erotismo hoje existente para
legitimar o sexo livre. Essa onda seria incoercível e, de certo modo,
obrigaria jovens e adultos à prática sexual extraconjugal. — Na verdade,
não é a freqüência ou a pujança de um determinado comportamento que o
torna lícito. Como os assaltos dos malfeitores e a corrupção dos homens
públicos são freqüentes, mas nem por isso são legitimados, assim também o
sexo livre, por mais freqüente que seja, fica sendo reprovável. É muito
mais sadio e educativo incitar os jovens e a sociedade ao uso regrado
do sexo (por que não dizer, à castidade?) do que se deixar dominar pelos
modismos; aliás, a disciplina e o autodomínio, no caso, são a única
solução cristã.
Notemos ainda que é falso dizer-se que os preservativos garantem "sexo seguro", pois são comprovadamente falhos. Ver PR 377/1993, p. 466 e 381/1994, pp. 87s.
2. "DE DOIS MALES, O MENOR"
Argumenta o articulista de SEM FRONTEIRAS, apelando
para "o ensinamento tradicional da Igreja segundo o qual, em
determinadas circunstâncias, não se podendo fazer o melhor, escolhe-se o
mal menor".
Essa
fórmula é confusa e errônea. Sim, a Moral Católica considera os casos
em que uma pessoa, de consciência hesitante ou duvidosa, se vê obrigada a
agir e se acha tão somente diante de duas opções que lhe parecem ambas
más. Em tal situação, a pessoa tem a obrigação de se esclarecer,
dissipando suas dúvidas, para saber se de fato está diante de duas
opções más. Caso não consiga clareza, escolha o que lhe parecer o mal
menor. Note-se bem: supõe-se que a pessoa esteja obrigada a agir. . .
Eis o que a propósito se lê na obra "Moral de Atitudes", vol. I, p. 322, de Marciano Vidal:
"Em
caso conflitante entre dois deveres, deve-se escolher o mal menor. Em
tais casos, tem que existir autêntica alternativa, não basta uma
alternativa aparente."
Observe-se: o texto fala de dois deveres, isto
é, supõe a obrigação de agir. E frisa que não deve haver outra saída
para o problema. Então sim, é lícito escolher o mal menor. Acontece,
porém, que, ao se tratar de sexo livre, não há dever. Por conseguinte,
não se aplica a norma "escolher o mal menor". A solução é abster-se do
mal simplesmente. É esta uma solução radical, a única, porém, coerente
com a honestidade e a dignidade da consciência humana.
Dom Estêvão Bettencourt, OSB
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