Quando Paulo pergunta àqueles discípulos que se encontravam em Éfeso
(At 19,1-7): “Recebestes o Espírito Santo, quando abraçastes a fé?”, a
impressão que dá é a de que até seria possível “abraçar a fé” sem mesmo
receber o Espírito Santo - o que não deixa de soar estranho. A resposta
dos discípulos: “Não, nem sequer ouvimos dizer que há um Espírito
Santo”, também é esquisita. Afinal, João - aquele em cujo tipo de
batismo diziam eles ter sido batizados - já havia falado a seus
discípulos sobre o Espírito Santo há muito tempo atrás, notadamente
quando afirmou, apontando para Jesus : “Eu não o conhecia, mas aquele
que me mandou batizar em água, disse-me: “Sobre quem vires descer e
repousar o Espírito, este é quem batiza no Espírito Santo” (Jo 1,29-34).
E, afinal, já eram decorridos - quando deste encontro com os discípulos
em Éfeso - 20 anos do derramamento do Espírito Santo, em Jerusalém, no
dia de Pentecostes...
Talvez fosse mais “acertado” entendermos este diálogo, assim: “Vocês estão conscientes de que, ao abraçar a fé, receberam,
por graça, a pessoa do Espírito Santo?” Ao que eles teriam respondido:
“Não, não estamos. Aliás, nem sabíamos que há um Espírito Santo que
podemos receber, que nos pode ser dado...”
Uma das grandes diferenças entre o Antigo e o Novo Testamento no
tocante à presença do Espírito entre os homens, é esta: embora sempre
presente - de maneira natural, “imanente”- na história dos homens,
somente a partir da glorificação de Jesus é que, em Pentecostes, o
Espírito nos foi dado de uma forma pessoal, plena, e para conosco estar por todo o sempre. “Eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará um outro Advogado, para que fique eternamente convosco. É o espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece, mas vós o conhecereis porque permanecerá convosco e estará em vós” (Jo 14,16-17).
Era desta nova forma do Espírito estar presente em nós que falava
Jesus quando, naquela Festa dos Tabernáculos (Jo 7,37-39) disse: “Quem
tiver sede, venha a mim e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura:
Do seu interior manarão rios de água viva (Zc 14,8; Is 58,11). Dizia
isto referindo-se ao Espírito que haviam de receber os que cressem nele,
pois ainda não fora dado o Espírito, porque Jesus ainda não tinha sido glorificado”...
Todo aquele que se diz cristão precisa pautar sua religiosidade pela
certeza de ter recebido este dom magnífico, pois “nisto é que conhecemos
que estamos nele e ele em nós, por ele nos ter dado o
seu Espírito” (I Jo 4,13). “E a prova de que somos filhos, é que Deus
enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: “Aba!
Pai!”(Gl 4,6)...
Quando o mago Simão (At 8,9-24) viu que o Espírito podia ser dado pela imposição das mãos dos Apóstolos, ofereceu-lhes dinheiro, dizendo: “Dai-me
também este poder”... Nós, que o temos de graça, pela graça, nem sempre
o valorizamos como deveríamos, pois o Espírito Santo não tem apenas a
missão de nos possuir pela sua inefável presença, mas
também para ser por nós possuído, para ser o “penhor de nossa
herança”(Ef 1,14), e para ser a expressão maior do “amor divino que se
difundiu em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado”(Rm
5,5).
“Pois o dom, que é de quem o dá, converte-se em posse de quem o
recebe. E o Dom de Deus é nosso pelo prodígio estupendo do amor”(D. Luís
M. Martinez).
Por amar de maneira indescritível o mundo, Deus nos deu Seu Filho (Jo
3,16), que, chegando à glorificação através de incontáveis sofrimentos,
e “havendo recebido do Pai o Espírito Santo prometido, derramou-o (em
nossos corações, conf. Rm 5,5) como vós vedes e ouvis (At 2,32-33). Não
para estar apenas conosco - como Jesus, limitado pela natureza humana, estivera -, mas para estar conosco e em nós, sem reservas, tornando presentes, por Sua natureza divina, também o Filho e o Pai, “que nos deu deste Espírito Santo em profusão por Jesus Cristo, nosso Salvador”(Ti 3,4-6).
Aleluia! Já não somos órfãos. No nosso pobre coração de
pecadores, habita a presença de uma pessoa divina, o DOM dos dons.
Amém!
Autor: Reinaldo Reis
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