Santa Gemma Galgani e a entrega de si mesma a Deus: "...já estou desapegada de tudo"
A vida dos santos impressiona, sobretudo, pelas intervenções
extraordinárias de Deus em sua rotina ordinária. Capítulos
particularmente incríveis de suas biografias são as lutas físicas que
alguns deles, como o Padre Pio de Pietrelcina e o Cura de Ars, travavam
com o demônio. Muitos desses combates foram descritos com ricos detalhes
por pessoas que conviveram todos os dias com estes santos.
Trata-se de casos especialíssimos de "obsessão demoníaca". Importa
saber que o demônio "anda ao redor de vós como o leão que ruge, buscando
a quem devorar" (1 Pd 5, 8). Ele não poupa esforços para fazer perder
as almas que Cristo conquistou com o Seu sangue. Por isso, as lutas com o
mal não são exclusividade dos grandes santos, mas uma realidade
vivenciada todos os dias pelo cristão comum. O católico deve acordar
todos os dias tomando consciência de que, para além dos trabalhos e
penas do dia a dia, há um combate espiritual sendo travado diante de si,
o qual só pode ser vencido com o auxílio de Deus e de Seus santos
anjos.
Certas almas, porém, recebem do Senhor uma missão ainda mais nobre
que a dos demais batizados. Elas são chamadas a unir-se mais
perfeitamente a Cristo sofredor e a oferecerem-se de modo total como
vítimas pelos pecados da humanidade. As suas vidas de santidade e de
oração perturbam profundamente Satanás, que quer fazer de tudo para
precipitar o ser humano ao inferno.
A jovem Gemma Galgani, nascida no povoado próximo à cidade de Lucca,
na Itália, era uma dessas almas que deixavam inquieto o inimigo de Deus.
Contemporânea de Santa Teresinha do Menino Jesus, Gemma cresceu
habituada à experiência da morte. Sua mãe, Aurélia, faleceu cedo, vítima
de tuberculose. Seu irmão, Eugênio, que decidira entrar no seminário,
também foi acometido pela doença, tendo morrido antes de ser ordenado
sacerdote. Experiências tão próximas fizeram com que Gemma se
desapegasse desde cedo deste mundo. Questionada, certa vez, se tinha
medo da morte, ela respondeu: "Claro que não... já estou desapegada de tudo".
Órfã de pai e de mãe aos 19 anos, Gemma vai morar com uma piedosa
senhora: Cecília Giannini. Ela acolhe a pequena gema de Deus como uma
filha e é em sua casa que vão acontecer experiências extraordinárias: às
quintas e sextas-feiras, recolhida em seu quarto, em oração, Gemma
recebe os estigmas de nosso Senhor. A jovem amante de Cristo, com o
olhar detido em um ponto fixo do alto, sangra abundantemente em várias
partes do corpo. No momento da oração, está totalmente alheia às coisas
terrenas. Em êxtase, ela perde todos os seus sentidos, permanece imóvel,
totalmente absorta nas coisas celestes.
Mas, ao mesmo tempo em que é constantemente agraciada com as
consolações de Deus, a santa recebe com frequência a visita indesejada
do diabo.
Conta-se que, certa vez, o seu diretor espiritual, padre Germano,
encontrou-a acamada, por conta dos incessantes ataques do demônio, que a
debilitavam. Durante a noite, o sacerdote permaneceu com ela, rezando o
breviário no canto do quarto. De repente, um enorme gato preto, de
aspecto horrível, se joga aos pés do sacerdote. Ele dá uma volta pelo
quarto, dando miados infernais.
Subitamente, o gato salta sobre o leito de Gemma, ficando muito
próximo de seu rosto e fixando nela um olhar feroz. Padre Germano fica
visivelmente assustado, mas sua filha espiritual permanece calma: está
acostumada às artimanhas do maligno. "Não tenha medo, padre! É o velhaco
do demônio que me quer molestar. Não tema. Ao senhor não fará mal
algum", diz a jovem, tentando tranquilizar o sacerdote.
Ele, então, levanta-se, ainda com a mão trêmula, e borrifa água benta
sobre o gatão, que desaparece, como que por encanto. "Como é possível
permanecer tão tranquila?", pergunta o padre a Gemma, ao que ela
responde: "Só tenho medo... de magoar Jesus!"
Estes episódios arrepiantes da vida dos santos servem para todos os
cristãos de lição: neste mundo, o seu único medo deve ser o de ofender a
Cristo e, assim, perder a amizade d’Aquele que não poupou Seu próprio
Sangue para a remissão dos nossos pecados. Que Santa Gemma Galgani rogue
por nós junto a Deus.
Por Christo Nihil Praeponere
Referências
- Afonso de Santa Cruz. A gema do paraíso. 4. ed. Curitiba, 2013.
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