segunda-feira, 27 de abril de 2015

ENXUGAR AS CHAGAS DA IGREJA II

Não há nada de estranho nas provações que sofremos. Elas nos estimulam à entrega paciente e à ação por meio da graça divina.


 
A conhecida poesia de Santa Teresa d'Ávila encerra um ensinamento importantíssimo sobre Deus e nossos sofrimentos. Exorta a estrofe: " Nada te turbe / nada te espante; / tudo passa. Deus não muda; / a paciência obtém tudo; / quem possui Deus / nada lhe falta / só Deus basta". Teresa d'Ávila sintetizou nesse pequeno trecho todo o segredo do agir cristão diante das contrariedades. Quem se reconhece amado por Deus, sabe também lidar pacientemente com as provações. E a fonte dessa paciência é nada mais que a virtude da esperança. A figura deste mundo passa, mas a promessa de Deus é uma rocha inabalável. Não há nada de estranho no "fogo da provação" que se alastra entre nós, diz São Pedro; trata-se, antes, de motivo de júbilo: "Alegrai-vos por participar dos sofrimentos de Cristo, para que possais também exultar de alegria na revelação da sua glória" (1 Pd 4, 12-13).
Essa certeza da salvação, assegurada pela esperança na providência divina, ajuda-nos a compreender outro ponto precioso do Cristianismo: os sofrimentos da Igreja. Como já se disse anteriormente, a Igreja também é chamada a viver a Paixão de Cristo. Não existe Cristianismo sem Cruz. Uma comunidade cristã sem Cruz é uma comunidade muito distante das páginas do Evangelho. É uma aberração! O verdadeiro cristão é aquele que segue o caminho do Calvário, que se põe aos pés de Deus não mais para falar "sempre de si" ou "de suas mesquinhas preocupações", mas para "interessar-se pelas preocupações do Salvador" [1]. De fato, não sabemos a razão da existência do mal. Por que Deus, Todo-Poderoso, permite que seus filhos sofram? Por que não abrevia, com Sua misericórdia, as fadigas desta vida, levando-nos logo para a morada eterna? Isso sempre será um mistério. O que podemos dizer, acompanhados pelo Catecismo da Igreja, é que Deus, "em sua providência toda-poderosa, pode extrair um bem de um mal, mesmo moral, causado por suas criaturas" [2]. E a Cruz é a maior prova disso. Deus manifesta sua grandeza na Redenção.
Assim, pede-nos São Pedro: "Os que sofrem segundo a vontade de Deus entreguem suas vidas ao Criador, que é fiel, e dediquem-se à prática do bem" ( 1 Pd 4, 19). A exortação é clara. A paciência nas provações não significa se acomodar e esperar uma intervenção divina. Significa tornar-se instrumento da graça de Deus. Entregar-se e agir. Eis o que nos pede o primeiro papa. Eis o que fizeram todos os santos nos momentos de grandes provações da Igreja. Entregaram suas vidas ao Criador, confiando em Sua fidelidade, e dedicaram-se diligentemente à restauração de todas as coisas em Cristo. Fala-nos alto o testemunho de São Francisco de Assis que, após ouvir o chamado de Deus: "Vai e reconstrói a minha Igreja", assumiu a eminente responsabilidade de viver as três virtudes evangélicas — a pobreza, a castidade e a obediência — de maneira radical e irrepreensível. O caráter irrevogável de seu apostolado deitou raízes tão profundas que ainda hoje se podem colher os frutos.
Outro santo a quem podemos recorrer como fonte de inspiração para nossa vida apostólica é São João Maria Vianney [3]. Há uma porção de elementos dignos de nota em seu ministério, e sobre os quais iremos meditar posteriormente. Detenhamo-nos primeiro nestes dois: oração e mortificação. Duas palavras fora de moda e mal compreendidas atualmente. Mas que, contempladas através dos olhos do Cura d'Ars, ganham uma importância fundamental. Esses dois elementos — oração e mortificação — foram as grandes pilastras do empreendimento espiritual de Vianney. "O meu rosário pode mais que cem sermões", dizia.
Quando foi designado pároco de Ars, o Vigário Geral de São João Maria Vianney disse-lhe o seguinte: "É uma paróquia pequena, onde não há muito amor a Deus. Deverá levá-lo para lá". Na época, Ars era apenas uma aldeia da região de Dombes, a 35 quilômetros de Lião, na França. Fora um lugar de verdadeiro fervor cristão. Mas as loucuras da Revolução Francesa não a pouparam dos ataques à fé católica. Aos poucos, o vilarejo esfriou e caiu em desgraça. A ignorância religiosa alastrou-se por quase todos os costumes: profanação do domingo, bailes, bebedeiras, blasfêmias etc. Tudo isso estava presente no cotidiano dos paroquianos. E estava também presente nas meditações do novo pároco.
Vianney não mediu esforços. Como primeiro ato para recuperação daquelas almas, consagrou-as à Virgem Santíssima, àquela que sempre fora seu grande amor mesmo antes de conhecê-la. Logo pela manhã, ainda com os primeiros raios de sol bastante tímidos, já se podia ver o sacerdote, com sua lamparina, dirigindo-se da casa paroquial à igreja. Ia para rezar e pedir a conversão de seus fiéis. Entre lágrimas, o santo implorava ao bom Deus: "Concedei-me a conversão de minha paróquia. Consinto em sofrer quanto quiserdes, durante toda a minha vida… Sim, durante cem anos as dores mais atrozes, contanto que se convertam". E assim prosseguia entre terços, liturgia das horas e Sacrifício Eucarístico.
A mortificação foi a segunda arma do santo. Era preciso açoitar o velho Adão, dizia, para conseguir a salvação de seu rebanho e a própria. Impôs-se penitências severas. Todas as noites, durante uma hora, rasgava seu corpo com a disciplina, uma pequena corda com pedacinhos de chumbo, ferro e pregos na ponta. O cilício também não faltava. Ademais, fazia jejuns frequentes, com uma dieta à base de batatas, muitas vezes, já bolorentas. Pouco dormia. E, ainda assim, nos momentos em que se permitia descansar, fazia-o em um chão duro com a cabeça repousada em um "travesseiro" de madeira. Anos mais tarde, admitiria ter exagerado: "Quando se é jovem, cometem-se muitas imprudências". Contudo, "independentemente das penitências concretas a que se sujeitava o Cura d'Ars, continua válido para todos o núcleo do seu ensinamento: as almas custam o sangue de Cristo" [4]. Por isso, cada um de nós deve "contribuir com a sua parte para o 'alto preço' da redenção" [5].
Embora nem todos sejam chamados a penitências tão duras quanto às de São João Maria Vianney, há, sim, uma quantidade enorme de renúncias que podemos fazer em nosso dia a dia, como forma de expiação e reparação ao Sagrado Coração de Jesus. O Cura d'Ars elenca algumas delas:
Meu amigo, o demônio não faz muito caso da disciplina e de outros instrumentos de penitência. O que o põe em debandada são as privações no comer, no beber e no dormir. Nenhuma coisa o faz temer tanto como isso. Por outro lado, nada é tão agradável a Deus como isso. Ah, como tenho experimentado essas coisas.
O santo pároco de Ars enfrentou pacientemente as provações de sua comunidade, abandonando-se à esperança divina, cuja força emanava precisamente de sua oração e mortificação. Não seria, portanto, esse o caminho a seguir em face das provações que enfrentamos na Igreja de hoje? Não deveríamos rezar mais, confiar mais em Sua graça, por meio também do oferecimento diário de nós mesmos, em vez de perdermos tempo precioso, sobretudo na Internet, em discussões vazias e murmurações diabólicas? No testemunho dos santos de todos os séculos encontramos as respostas para essas e outras indagações. Meditemos um pouco nestes pontos e façamos um sincero exame de consciência antes de partirmos para as próximas questões. Como dizia Santa Teresa d'Ávila: "A paciência obtém tudo". 












Por Equipe Christo Nihil Praeponere

Referências

  1. MIRIBEL, Elisabeth de. Edith Stein: como ouro purificado pelo fogo. 4. ed. Aparecida: Editora Santuário, 1998, pp. 148
  2. Catecismo da Igreja Católica, 312
  3. TROCHU, Francis. O Cura d'Ars; GHÉON, Henri. O Cura d'Ars. São Paulo: Quadrante, 1998.
  4. Bento XVI, Carta para a proclamação do Ano Sacerdotal, 16 de junho de 2009
  5. Idem

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