A liturgia deste domingo ensina-nos onde encontrar
Deus. Garante-nos que Deus não Se revela na arrogância, no orgulho, na prepotência,
mas sim na simplicidade, na humildade, na pobreza, na pequenez.
A primeira leitura apresenta-nos um enviado de Deus
que vem ao encontro dos homens na pobreza, na humildade, na simplicidade; e é
dessa forma que elimina os instrumentos de guerra e de morte e instaura a paz
definitiva.
No Evangelho, Jesus louva o Pai porque a proposta
de salvação que Deus faz aos homens (e que foi rejeitada pelos “sábios e
inteligentes”) encontrou acolhimento no coração dos “pequeninos”. Os “grandes”,
instalados no seu orgulho e auto-suficiência, não têm tempo nem disponibilidade
para os desafios de Deus; mas os “pequenos”, na sua pobreza e simplicidade,
estão sempre disponíveis para acolher a novidade libertadora de Deus.
Na segunda leitura, Paulo convida os crentes –
comprometidos com Jesus desde o dia do Batismo – a viverem “segundo o Espírito”
e não “segundo a carne”. A vida “segundo a carne” é a vida daqueles que se
instalam no egoísmo, orgulho e auto-suficiência; a vida “segundo o Espírito” é
a vida daqueles que aceitam acolher as propostas de Deus.
1ª leitura: Zc. 9,9-10 - AMBIENTE
O livro de Zacarias é um livro profético com
catorze capítulos. Atualmente, os estudiosos da Bíblia são unânimes em
reconhecer que entre os oito primeiros capítulos e os restantes há uma
diferença tão grande em contextos, estilo, vocabulário e temática, que devemos
falar de dois livros em um e de dois autores diversos. Dado que não conhecemos
o nome do autor do segundo livro (capítulos 9-14), convencionou-se chamar-lhe o
“Deutero-Zacarias”. É ao “Deutero-Zacarias” que pertence este texto que hoje
nos é proposto.
Em que época foram escritos esses textos atribuídos
ao Deutero-Zacarias? As opiniões são divergentes; no entanto, a maioria dos
comentadores coloca estes oráculos no final do séc. IV ou princípios do séc.
III a.C.. O ambiente é claramente pós-exílico. O contexto parece revelar a
época posterior às vitórias de Alexandre da Macedônia, quando o Povo de Deus
estava integrado no império helênico.
O livro do “segundo Zacarias” está marcado por um
forte acento messiânico. Refere-se, com frequência, à figura do Messias,
apresentado como rei, como pastor e como servo do Senhor. Na primeira parte
(cf. Zc. 9,1-11,7), o profeta anuncia a intervenção definitiva de Deus em favor
do seu Povo, na figura do Messias; na segunda parte (cf. Zc. 12,1-14,21), os
oráculos descrevem a salvação e a glória futura de Jerusalém.
MENSAGEM
O Deutero-Zacarias descreve, neste oráculo, o
regresso do rei vitorioso a Jerusalém. A cidade é convidada a alegrar-se e regozijar-se
pois o seu rei, “justo e salvador”, chegou.
A entrada triunfal desse rei justo e vitorioso é,
no entanto, humilde e pacífica: ele não cavalgará um cavalo de guerra (símbolo
do militarismo), mas um “jumentinho, filho de uma jumenta”. A atitude deste
“rei” contrasta claramente com as exibições de força, de poder, de
agressividade dos grandes do mundo…
No entanto, paradoxalmente, este “rei” humilde e
pacífico terá a força para destruir a guerra (ele aniquilará os instrumentos de
morte – os carros de combate, os cavalos de guerra, os arcos de guerra) e para
proclamar a paz universal. O seu “reino” irá “de um mar ao outro mar” e do
“rio” (Eufrates) “até aos confins da terra” (isto é, abarcará a totalidade do
mundo antigo).
ATUALIZAÇÃO
• Em primeiro lugar, o Deutero-Zacarias deixa clara
a preocupação de Deus com a salvação do seu Povo. Na fase em que o profeta leva
a cabo a sua missão, o Povo de Deus conhece uma relativa tranquilidade; mas é
um Povo subjugado, manipulado, impedido de escolher livremente o seu destino e
de construir o seu futuro. É nesse contexto que o profeta anuncia a chegada de
um rei “justo e salvador”, que vem ao encontro do Povo para libertá-lo e para
lhe oferecer a paz (“shalom” – no sentido de harmonia, bem estar, felicidade plena).
Ora, Deus não perdeu qualidades, nem mudou a sua essência. O Deus que assim
atuou ontem é o Deus que assim atua hoje e que assim atuará sempre. Ao longo da
nossa caminhada de todos os dias, fazemos frequentemente a experiência do
desencanto, da frustração, da privação de liberdade. Sentimo-nos, tantas vezes,
perdidos, sem esperança, incapazes de tomar nas mãos o nosso futuro e de dar um
sentido à nossa vida… Nessas circunstâncias, somos convidados a redescobrir
esse Deus que vem ao nosso encontro, que restaura a nossa esperança e nos
oferece a paz.
Uma certa visão “americanizada” do mundo e da vida
defende a necessidade de armar exércitos formidáveis, de gastar uma
considerável fatia do orçamento das nações em instrumentos de morte cada vez
mais sofisticados, para impor, pela força e pelo medo, a paz e a segurança do
mundo. O Deutero-Zacarias diz-nos que a lógica de Deus é outra: Ele chega
desarmado, pacífico, humilde, sem arrogância e é, dessa forma, que Ele salva e
liberta os homens. Para mim, qual faz mais sentido: a lógica desarmada de Deus
ou a lógica musculada dos senhores do mundo?
A história da salvação mostrou, muitas vezes, que é
através dos pequenos, dos humildes, dos pobres, dos insignificantes que Deus
atua no mundo e o transforma. Deus está mais na viúva que lança no tesouro do
Templo umas pobres moedas do que no capitalista que preenche um cheque chorado
para pagar os vitrais da nova igreja da paróquia; Deus está mais no gesto
simples do pacifista que oferece uma flor a um soldado do que na violência
daqueles que lutam de armas na mão contra os “maus”; Deus está mais no olhar
límpido de uma criança do que na palavra poderosa de um pregador inflamado que
“sabe tudo” sobre Deus… Já aprendi a descobrir esse Deus que se manifesta na
humildade, na pobreza, na simplicidade?
2ª leitura: Romanos
8,9.11-13 - AMBIENTE
Continuamos a ler a carta aos Romanos. Ela
apresenta-nos um Paulo amadurecido que, depois de vários anos de incansável
trabalho missionário, expõe, de forma serena, a sua reflexão sobre a salvação
(numa altura em que a questão da salvação era uma questão teológica “quente”:
os judeo-cristãos acreditavam que, para chegar à salvação, era preciso
continuar a cumprir a Lei de Moisés; e os judeo-pagãos não manifestavam nenhuma
vontade de se submeter aos ritos da Lei judaica).
Na perspectiva de Paulo, a salvação é um dom não
merecido (porque todos vivem mergulhados no pecado – cf. Rm. 1,18-3,20), que
Deus oferece por pura bondade aos homens, a todos os homens (cf. Rm. 3,1-5,11).
Essa salvação chega-nos através de Jesus Cristo (cf. Rm. 5,12-8,39); e atua em
nós pelo Espírito (cf. Rm. 8,1-39).
O texto que hoje nos é proposto faz parte de um
capítulo em que Paulo reflete sobre a vida no Espírito. O pensamento teológico
de Paulo atinge aqui um dos seus pontos culminantes: todos os grandes temas
paulinos (o projeto salvador de Deus em favor dos homens; a ação libertadora de
Cristo, através da sua vida de doação, da sua morte e da sua ressurreição; a
nova vida que faz dos crentes Homens Novos e os torna filhos de Deus) se cruzam
aqui.
O Espírito aparece como o elemento fundamental que
dá unidade a toda esta reflexão. Ele está presente por detrás desse projeto
salvador que Deus tem em favor do homem e do qual Paulo não se cansa de dar
testemunho.
MENSAGEM
Jesus, o Deus/Homem, gastou a vida a cumprir o
projeto do Pai de dar vida ao homem. A sua ação acabou por chocar com os
interesses dos senhores do mundo, e Ele foi morto na cruz.
No entanto, essa morte na cruz não foi o “fim da
linha”: o Espírito de Deus, sempre presente em Jesus, ressuscitou-O (pois, no
projeto de Deus, o oferecer a vida para concretizar o plano do Pai não pode
gerar morte, mas vida plena e definitiva).
Ora, Jesus ofereceu aos seus discípulos o mesmo
Espírito. Os discípulos têm de estar conscientes de que, se viverem como Jesus
e se fizerem da vida um dom a Deus e aos irmãos, receberão essa mesma vida nova
e definitiva que o Espírito deu a Jesus.
Sobretudo, Paulo convida os cristãos a tirarem as
conclusões práticas desta realidade: se viverem “segundo a carne”, morrerão
(isto é, não encontrarão a vida definitiva); mas se viverem segundo o Espírito,
ressuscitarão para a vida nova.
Temos aqui uma das mais interessantes e sugestivas
antíteses paulinas: a “carne” e o “Espírito”. Viver “segundo a carne” é, na
perspectiva de Paulo, viver em oposição a Deus – ou seja, viver fechado a Deus,
numa vida de egoísmo, de autismo, de auto-suficiência que leva o homem a
prescindir dos mandamentos, das propostas e dos valores de Deus; “viver segundo
o Espírito” é, na perspectiva de Paulo, viver em relação com Deus, escutando as
suas propostas e sugestões, na obediência aos projetos de Deus e na doação da
própria vida aos homens.
Os cristãos são, portanto, veementemente exortados
por Paulo a fazerem a sua escolha. Sobretudo, Paulo está interessado em
demonstrar aos crentes que só o seguimento de Cristo garante ao homem a vida
definitiva.
ATUALIZAÇÃO
• À luz dos critérios que hoje presidem à
construção do mundo, a vida de Jesus foi um rotundo fracasso. Ele nunca desempenhou
qualquer cargo público nem teve jamais conta num banco qualquer; mas viveu na
simplicidade, na humildade, no serviço, sem ter para si próprio uma pedra onde
reclinar a cabeça. Ele nunca foi apoiado pelas “cabeças pensantes” da sua
terra; apenas foi escutado pela gente humilde, marginalizada, condenada a uma
situação de escravidão, de pobreza, de debilidade. Ele nunca se proclamou chefe
de um movimento popular; apenas ensinou, àqueles que O seguiam, que Deus os ama
e que quer fazer deles seus filhos. Ele nunca se sentou num trono, a dar ordens
e a distribuir benesses; mas foi abandonado por todos, condenado a uma morte
infame e pregado numa cruz. No entanto, Ele venceu a morte e recebeu de Deus a
vida plena e definitiva. Paulo diz aos crentes a quem escreve: não vos
preocupeis com aqueles valores a que o mundo chama êxito, realização,
felicidade; mas tende a coragem de gastar a vida do mesmo jeito de Jesus, a fim
de encontrardes a vossa realização plena, a vida definitiva.
• Paulo ensina que a vida “segundo a carne” gera
morte; e que a vida “segundo o Espírito” gera vida. O que é viver “segundo a
carne”? Olhando para o mundo e para a vida da Igreja, quais são os sintomas que
eu noto da vida “segundo a carne”? O que é viver “segundo o Espírito”? Olhando
para o mundo e para a vida da Igreja, quais são os sintomas que eu noto da vida
“segundo o Espírito”?
• O cristão tem de viver “segundo o Espírito”. É
desse jeito que eu vivo? Estou aberto à ação renovadora e libertadora do
Espírito que recebi no dia do meu Batismo?
Evangelho - Mateus
11,25-30 - AMBIENTE
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus.
Por aquele tempo, Jesus pronunciou estas palavras: 11 25 “Eu te bendigo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequenos. 26 Sim, Pai, eu te bendigo, porque assim foi do teu agrado. 27 Todas as coisas me foram dadas por meu Pai; ninguém conhece o Filho, senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelá-lo. 28 Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei. 29 Tomai meu jugo sobre vós e recebei minha doutrina, porque eu sou manso e humilde de coração e achareis o repouso para as vossas almas. 30 Porque meu jugo é suave e meu peso é leve.
Palavra da Salvação.
Por aquele tempo, Jesus pronunciou estas palavras: 11 25 “Eu te bendigo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequenos. 26 Sim, Pai, eu te bendigo, porque assim foi do teu agrado. 27 Todas as coisas me foram dadas por meu Pai; ninguém conhece o Filho, senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelá-lo. 28 Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei. 29 Tomai meu jugo sobre vós e recebei minha doutrina, porque eu sou manso e humilde de coração e achareis o repouso para as vossas almas. 30 Porque meu jugo é suave e meu peso é leve.
Palavra da Salvação.
Após o “discurso da missão” e o envio dos
discípulos ao mundo para continuarem a obra libertadora de Jesus (cf. Mt.
9,36-11,1), Mateus coloca no seu esquema de Evangelho uma secção sobre as
reações e as atitudes que as várias pessoas e grupos tomam frente a Jesus e à
sua proposta de “Reino” (cf. Mt. 11,2-12,50). O nosso texto integra esta
secção.
Nos versículos anteriores ao texto que nos é hoje
proposto (cf. Mt 11,20-24), Jesus havia dirigido uma veemente crítica aos
habitantes de algumas cidades situadas à volta do lago de Tiberíades (Corozaim,
Betsaida, Cafarnaum), porque foram testemunhas da sua proposta de salvação e
mantiveram-se indiferentes. Estavam demasiado cheios de si próprios, instalados
nas suas certezas, calcificados nos seus preconceitos e não aceitavam
questionar-se, a fim de abrir o coração à novidade de Deus.
Agora, Jesus manifesta-Se convicto de que essa
proposta rejeitada pelos habitantes das cidades do lago encontrará acolhimento
entre os pobres e marginalizados, desiludidos com a religião “oficial” e que
anseiam pela libertação que Deus tem para lhes oferecer.
O nosso texto consta de três “sentenças” que,
provavelmente, foram pronunciadas em ambientes diversos deste que Mateus nos
apresenta. Dois desses “ditos” (cf. Mt. 11,25-27) aparecem também em Lucas (cf.
Lc. 10,21-22) e devem provir de um documento que reuniu os “ditos” de Jesus e
que tanto Mateus como Lucas utilizaram na composição dos seus evangelhos. O
terceiro (cf. Mt. 11,28-30) é exclusivo de Mateus e deve provir de uma fonte
própria.
MENSAGEM
A primeira sentença (cf. Mt. 11,25-26) é uma oração
de louvor que Jesus dirige ao Pai, porque Ele escondeu “estas coisas” aos
“sábios e inteligentes” e as revelou aos “pequeninos”.
Os “sábios e inteligentes” são certamente esses
“fariseus” e “doutores da Lei”, que absolutizavam a Lei, que se consideravam
justos e dignos de salvação porque cumpriam escrupulosamente a Lei, que não
estavam dispostos a deixar pôr em causa esse sistema religioso em que se tinham
instalado e que – na sua perspectiva – lhes garantia automaticamente a
salvação. Os “pequeninos” são os discípulos, os primeiros a responder
positivamente à oferta do “Reino”; e são também esses pobres e marginalizados
(os doentes, os publicanos, as mulheres de má vida, o “povo da terra”) que
Jesus encontrava todos os dias pelos caminhos da Galileia, considerados
malditos pela Lei, mas que acolhiam, com alegria e entusiasmo, a proposta
libertadora de Jesus.
A segunda sentença (cf. Mt. 11,27) relaciona-se com
a anterior e explica o que é que foi escondido aos “sábios e inteligentes” e
revelado aos “pequeninos”. Trata-se, nem mais nem menos, do “conhecimento”
(quer dizer, uma “experiência profunda e íntima”) de Deus.
Os “sábios e inteligentes” (fariseus e doutores da
Lei) estavam convencidos de que o conhecimento da Lei lhes dava o conhecimento
de Deus. A Lei era uma espécie de “linha direta” para Deus, através da qual
eles ficavam a conhecer Deus, a sua vontade, os seus projetos para o mundo e
para os homens; por isso, apresentavam-se como detentores da verdade,
representantes legítimos de Deus, capazes de interpretar a vontade e os planos
divinos.
Jesus deixa claro que quem quiser fazer uma
experiência profunda e íntima de Deus tem de aceitar Jesus e segui-l’O. Ele é
“o Filho” e só Ele tem uma experiência profunda de intimidade e de comunhão com
o Pai. Quem rejeitar Jesus não poderá “conhecer” Deus: quando muito, encontrará
imagens distorcidas de Deus e aplicá-las-á depois para julgar o mundo e os
homens. Mas quem aceitar Jesus e O seguir, aprenderá a viver em comunhão com
Deus, na obediência total aos seus projetos e na aceitação incondicional dos
seus planos.
A terceira sentença (cf. Mt. 11,28-30) é um convite
a ir ao encontro de Jesus e a aceitar a sua proposta: “vinde a Mim”; “tomai
sobre vós o meu jugo…”.
Entre os fariseus do tempo de Jesus, a imagem do
“jugo” era aplicada à Lei de Deus (cf. Si. 6,24-30; 51,26-27) – a suprema norma
de vida. Para os fariseus, por exemplo, a Lei não era um “jugo” pesado, mas um
“jugo” glorioso, que devia ser carregado com alegria.
Na realidade, tratava-se de um “jugo” pesadíssimo.
A impossibilidade de cumprir, no dia a dia, os 613 mandamentos da Lei escrita e
oral, criava consciências pesadas e atormentadas. Os crentes, incapazes de
estar em regra com a Lei, sentiam-se condenados e malditos, afastados de Deus e
indignos da salvação. A Lei aprisionava em lugar de libertar e afastava os
homens de Deus em lugar de conduzi-los para a comunhão com Deus.
Jesus veio libertar o homem da escravidão da Lei. A
sua proposta de libertação plena dirige-se aos doentes (na perspectiva da
teologia oficial, vítimas de um castigo de Deus), aos pecadores (os publicanos,
as mulheres de má vida, todos aqueles que tinham publicamente comportamentos
política, social ou religiosamente incorretos), ao povo simples do país (que,
pela dureza da vida que levava, não podia cumprir escrupulosamente todos os
ritos da Lei), a todos aqueles que a Lei exclui e amaldiçoa. Jesus garante-lhes
que Deus não os exclui nem amaldiçoa e convida-os a integrar o mundo novo do
“Reino”. É nessa nova dinâmica proposta por Jesus que eles encontrarão a
alegria e a felicidade que a Lei recusa dar-lhes.
A proposta do “Reino” será uma proposta reservada a
uma classe determinada (os pobres, os débeis, os marginalizados) em detrimento
de outra (os ricos, os poderosos, os da “situação”)? Não. A proposta do “Reino”
destina-se a todos os homens e mulheres, sem exceção… No entanto, são os pobres
e débeis aqueles que já desesperaram do socorro humano, que têm o coração mais
disponível para acolher a proposta de Jesus. Os outros (os ricos, os poderosos)
estão demasiado cheios de si próprios, dos seus interesses, dos seus esquemas
organizados, para aceitar arriscar na novidade de Deus.
Acolhendo a proposta de Jesus e seguindo-O, os
pobres e oprimidos encontrarão o Pai, tornar-se-ão “filhos de Deus” e
descobrirão a vida plena, a salvação definitiva, a felicidade total.
ATUALIZAÇÃO
• Na verdade, os critérios de Deus são bem estranhos,
vistos de cá de baixo, com as lentes do mundo… Nós, homens, admiramos e
incensamos os sábios, os inteligentes, os intelectuais, os ricos, os poderosos,
os bonitos e queremos que sejam eles (“os melhores”) a dirigir o mundo, a fazer
as leis que nos governam, a ditar a moda ou as ideias, a definir o que é
correto ou não é correto. Mas Deus diz que as coisas essenciais são muito mais
depressa percebidas pelo “pequeninos”: são eles que estão sempre disponíveis
para acolher Deus e os seus valores e para arriscar nos desafios do “Reino”.
Quantas vezes os pobres, os pequenos, os humildes são ridicularizados, tratados
como incapazes, pelos nossos “iluminados” fazedores de opinião, que tudo sabem
e que procuram impor ao mundo e aos outros as suas visões pessoais e os seus
pseudo-valores… A Palavra de Deus ensina: a sabedoria e a inteligência não
garantem a posse da verdade; o que garante a posse da verdade é ter um coração
aberto a Deus e às suas propostas (e com frequência, com muita frequência, são
os pobres, os humildes, os pequenos que “sintonizam” com Deus e que acolhem
essa verdade que Ele quer oferecer aos homens para os levar à vida em
plenitude).
• Como é que chegamos a Deus? Como percebemos o seu
“rosto”? Como fazemos uma experiência íntima e profunda de Deus? É através da
filosofia? É através de um discurso racional coerente? É passando todo o tempo
disponível na igreja a mudar as toalhas dos altares? O Evangelho responde:
“conhecemos” Deus através de Jesus. Jesus é “o Filho” que “conhece” o Pai; só quem
segue Jesus e procura viver como Ele (no cumprimento total dos planos de Deus)
pode chegar à comunhão com o Pai. Há crentes que, por terem feito catequese,
por irem à missa ao domingo e por fazerem parte do conselho pastoral da
paróquia, acham que conhecem Deus (isto é, que têm com Ele uma relação estreita
de intimidade e comunhão)… Atenção: só “conhece” Deus quem é simples e humilde
e está disposto a seguir Jesus no caminho da entrega a Deus e da doação da vida
aos homens. É no seguimento de Jesus – e só aí – que nos tornamos “filhos” de
Deus.
• Como nos situamos face a Deus e à proposta que
Ele nos apresenta em Jesus? Ficamos fechados no nosso comodismo e instalação,
no nosso orgulho e auto-suficiência, sem vontade de arriscar e de pôr em causa
as nossas seguranças, ou estamos abertos e atentos à novidade de Deus, a fim de
perceber as suas propostas e seguir os seus caminhos?
• Cristo quis oferecer aos pobres, aos
marginalizados, aos pequenos, a todos aqueles que a Lei escravizava e oprimia,
a libertação e a esperança. Os pobres, os débeis, os marginalizados, aqueles
que não encontram lugar à mesa do banquete onde se reúnem os ricos e poderosos,
continuam a encontrar – no testemunho dos discípulos de Jesus – essa proposta
de libertação e de esperança? A Igreja dá testemunho da proposta libertadora de
Jesus para os pobres? Como é que os pequenos e humildes são acolhidos nas
nossas comunidades? Como é que acolhemos aqueles que têm comportamentos social
ou religiosamente incorretos?
P. Joaquim Garrido, P. Manuel
Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
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