Quando reconhecerdes a minha santidade, eu vos reunirei de todas as nações. Derramarei sobre vós uma água pura, e sereis purificados de todas as faltas. Dar-vos-ei um espírito novo, diz o Senhor (Ez 36,23-26).
Na celebração da Eucaristia nos aproximamos de Jesus, dom do Pai e fonte de água viva para a vida eterna. Nele repousa a esperança que nunca nos decepciona. Disponhamo-nos, nesta liturgia, a beber do poço que é o próprio Cristo, a fim de termos forças para atravessar os desertos da existência, trilhando um caminho de conversão e de vivência solidária.
Leitura do livro do Êxodo - Naqueles dias, 3o povo, sedento de água, murmurava contra Moisés e dizia: “Por que nos fizeste sair do Egito? Foi para nos fazer morrer de sede, a nós, nossos filhos e nosso gado?” 4Moisés clamou ao Senhor, dizendo: “Que farei por este povo? Por pouco não me apedrejam!” 5O Senhor disse a Moisés: “Passa adiante do povo e leva contigo alguns anciãos de Israel. Toma a tua vara com que feriste o rio Nilo e vai. 6Eu estarei lá, diante de ti, sobre o rochedo, no monte Horeb. Ferirás a pedra e dela sairá água para o povo beber”. Moisés assim fez na presença dos anciãos de Israel. 7E deu àquele lugar o nome de Massa e Meriba, por causa da disputa dos filhos de Israel e porque tentaram o Senhor, dizendo: “O Senhor está no meio de nós ou não?” – Palavra do Senhor.
Hoje não fecheis o vosso coração, / mas ouvi a voz do Senhor!
1. Vinde, exultemos de alegria no Senhor, / aclamemos o rochedo que nos salva! / Ao seu encontro caminhemos com louvores / e, com cantos de alegria, o celebremos! – R.
2. Vinde, adoremos e prostremo-nos por terra, / e ajoelhemos ante o Deus que nos criou! / Porque ele é o nosso Deus, nosso pastor, † e nós somos o seu povo e seu rebanho, / as ovelhas que conduz com sua mão. – R.
3. Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: † “Não fecheis os corações como em Meriba, / como em Massa, no deserto, aquele dia / em que outrora vossos pais me provocaram, / apesar de terem visto as minhas obras”. – R.
Leitura da carta de São Paulo aos Romanos – Irmãos, 1justificados pela fé, estamos em paz com Deus, pela mediação do Senhor nosso, Jesus Cristo. 2Por ele tivemos acesso, pela fé, a esta graça, na qual estamos firmes e nos gloriamos, na esperança da glória de Deus. 5E a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. 6Com efeito, quando éramos ainda fracos, Cristo morreu pelos ímpios, no tempo marcado. 7Dificilmente alguém morrerá por um justo; por uma pessoa muito boa, talvez alguém se anime a morrer. 8Pois bem, a prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós quando éramos ainda pecadores. – Palavra do Senhor.
[A forma breve está entre colchetes.]
Glória e louvor a vós, ó Cristo.
Na verdade, sois, Senhor, o Salvador do mundo. / Senhor, dai-me água viva a fim de eu não ter sede! (Jo 4,42.15) – R.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João – Naquele tempo, [5Jesus chegou a uma cidade da Samaria chamada Sicar, perto do terreno que Jacó tinha dado ao seu filho José. 6Era aí que ficava o poço de Jacó. Cansado da viagem, Jesus sentou-se junto ao poço. Era por volta do meio-dia. 7Chegou uma mulher da Samaria para tirar água. Jesus lhe disse: “Dá-me de beber”. 8Os discípulos tinham ido à cidade para comprar alimentos. 9A mulher samaritana disse então a Jesus: “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana?” De fato, os judeus não se dão com os samaritanos. 10Respondeu-lhe Jesus: “Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te pede: ‘Dá-me de beber’, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva”. 11A mulher disse a Jesus: “Senhor, nem sequer tens balde e o poço é fundo. De onde vais tirar a água viva? 12Por acaso, és maior que nosso pai Jacó, que nos deu o poço e que dele bebeu, como também seus filhos e seus animais?” 13Respondeu Jesus: “Todo aquele que bebe desta água terá sede de novo. 14Mas quem beber da água que eu lhe darei, esse nunca mais terá sede. E a água que eu lhe der se tornará nele uma fonte de água que jorra para a vida eterna”. 15A mulher disse a Jesus: “Senhor, dá-me dessa água, para que eu não tenha mais sede nem tenha de vir aqui para tirá-la”.] 16Disse-lhe Jesus: “Vai chamar teu marido e volta aqui”. 17A mulher respondeu: “Eu não tenho marido”. Jesus disse: “Disseste bem que não tens marido, 18pois tiveste cinco maridos e o que tens agora não é o teu marido. Nisso falaste a verdade”. 19A mulher disse a Jesus: [“Senhor, vejo que és um profeta! 20Os nossos pais adoraram neste monte, mas vós dizeis que em Jerusalém é que se deve adorar”. 21Disse-lhe Jesus: “Acredita-me, mulher, está chegando a hora em que nem neste monte nem em Jerusalém adorareis o Pai. 22Vós adorais o que não conheceis. Nós adoramos o que conhecemos, pois a salvação vem dos judeus. 23Mas está chegando a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade. De fato, esses são os adoradores que o Pai procura. 24Deus é espírito, e aqueles que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade”. 25A mulher disse a Jesus: “Sei que o Messias (que se chama Cristo) vai chegar. Quando ele vier, vai nos fazer conhecer todas as coisas”. 26Disse-lhe Jesus: “Sou eu, que estou falando contigo”.] 27Nesse momento, chegaram os discípulos e ficaram admirados de ver Jesus falando com a mulher. Mas ninguém perguntou: “Que desejas?” ou “Por que falas com ela?” 28Então a mulher deixou o seu cântaro e foi à cidade, dizendo ao povo: 29“Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Será que ele não é o Cristo?” 30O povo saiu da cidade e foi ao encontro de Jesus. 31Enquanto isso, os discípulos insistiam com Jesus, dizendo: “Mestre, come”. 32Jesus, porém, disse-lhes: “Eu tenho um alimento para comer que vós não conheceis”. 33Os discípulos comentavam entre si: “Será que alguém trouxe alguma coisa para ele comer?” 34Disse-lhes Jesus: “O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra. 35Não dizeis vós: ‘Ainda quatro meses, e aí vem a colheita’? Pois eu vos digo, levantai os olhos e vede os campos: eles estão dourados para a colheita! 36O ceifeiro já está recebendo o salário e recolhe fruto para a vida eterna. Assim, o que semeia se alegra junto com o que colhe. 37Pois é verdade o provérbio que diz: ‘Um é o que semeia e outro o que colhe’. 38Eu vos enviei para colher aquilo que não trabalhastes. Outros trabalharam, e vós entrastes no trabalho deles”. [39Muitos samaritanos daquela cidade abraçaram a fé em Jesus,] por causa da palavra da mulher que testemunhava: “Ele me disse tudo o que eu fiz”. [40Por isso, os samaritanos vieram ao encontro de Jesus e pediram que permanecesse com eles. Jesus permaneceu aí dois dias. 41E muitos outros creram por causa da sua palavra. 42E disseram à mulher: “Já não cremos por causa das tuas palavras, pois nós mesmos ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo”.] – Palavra da salvação.
No 3.º Domingo da Quaresma, assim como no 4.º e no 5º, a Igreja nos
propõe à meditação episódios específicos do Evangelho de São João,
voltados para a Páscoa do Senhor, a fim de preparar os catecúmenos que
serão batizados na Vigília Pascal. Neste domingo, contemplamos o
emblemático diálogo entre Jesus e a samaritana (cf. Jo 4, 5-42).
Nosso Senhor estava viajando da Judeia para a Galileia, e, ao passar pela Samaria, cansado da viagem e com sede, sentou-se, ao meio-dia, junto a um poço. Diante dessa cena, nenhum de nós pode alegar que Deus não conhece nossos sofrimentos, pois Ele próprio os assumiu e vivenciou, nos menores detalhes, até mesmo no cansaço físico.
O Evangelho relata que, enquanto Jesus estava sentado, venit mulier de Samaria haurire aquam, “veio uma mulher da Samaria para pegar água” (Jo 4, 7). Por analogia, nós somos como esta mulher que se dirige ao poço para buscar água, pois frequentemente recorremos à fonte de água viva para saciar nossa sede e recompor nossas forças espirituais. Muitas vezes, por exemplo, rezamos e participamos da Missa, buscando receber algo de Deus: uma graça, a cura de uma doença, a solução de problemas familiares, a aquisição de um bem material etc.
No entanto, de forma paradoxal, a mulher que foi buscar água ouve de Jesus Cristo — o Logos eterno e perfeito que sustenta todo o universo — o seguinte pedido: Da mihi bibere, “Dá-me de beber” (Jo 4, 7). Aqui se apresenta uma das maiores provas do amor de Deus por nós: mesmo sem necessitar de nada, Ele pede algo de nossas vidas, mostrando assim que não é indiferente a nós e às nossas necessidades, mas se coloca ao nosso lado para vivê-las e santificá-las.
O belíssimo hino Dies Irae (que era entoado na missa dos Fiéis Defuntos e que, na liturgia atual, é cantado no final do ano litúrgico) expressa, em clara referência ao episódio da samaritana, que Jesus nos busca constantemente, a ponto de ficar extenuado:
Quaerens me, sedisti lassus:
redemisti Crucem passus:
tantus labor non sit cassus.
Procurando a mim, sentastes exausto
Sofrendo na Cruz, redimistes-me
Que tanto trabalho não seja em vão.
Nesses versos, vemos um paralelo entre o encontro de Jesus com a mulher samaritana e a condição humana perante a Encarnação do Verbo de Deus: Nosso Senhor veio a este mundo e desgastou-se por nossa salvação. E mesmo não precisando de nós, Ele pede-nos de beber, pede que correspondamos ao ato de amor extremo que Ele realizou por nós.
Nesta Quaresma, a Igreja exorta-nos a mudar de atitude: a parar de nos dirigirmos a Deus apenas para pedir e olharmos para o Cristo Crucificado que, do alto da Cruz, diz-nos: Sitio, “tenho sede” (Jo 19, 28). Nosso Senhor tem sede do nosso amor, não porque dele necessite ou por carência afetiva, mas porque assumiu a condição de necessitado, desejando nosso amor e consolação. Deus, amor eterno, perfeito e infinito, embora não precise, quer o nosso amor.
E Ele o faz porque isto é o melhor para nós. Amando a Jesus, o Filho de Deus, seremos divinizados por Ele, pois nos tornamos aquilo que amamos. O amor tem essa característica de nos colocar no nível daquilo que amamos. Desse modo, quem ama realidades elevadas, por elas é elevado. Já quem ama as coisas baixas, rebaixa-se ao nível delas. Por isso, a Igreja, como mãe e mestra, exorta-nos a elevar nossos corações ao Deus Altíssimo: Sursum corda! E como as coisas do alto nos parecem tão inatingíveis, Deus, que não necessita de nada, desce até nós e se faz necessitado, estende a mão e nos pede de beber. No entanto, com esse gesto, Ele está, na verdade, resgatando-nos do abismo em que muitas vezes nos encontramos, devido ao nosso coração nômade que vive mendigando afeto, sem fixar morada definitiva.
Ao pedir, pois, à samaritana: “Dá-me de beber”, Jesus estende a mão para resgatá-la do abismo dos falsos amores em que ela vivia, a fim de elevá-la ao conhecimento do Amor Eterno. Sem entender, a mulher ainda tenta argumentar com Jesus: “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana?”. Ao que Ele responde: “Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te pede: ‘Dá-me de beber’, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva”. Vemos aqui outro elemento fundamental: para amar a Deus, primeiro precisamos conhecê-lo, pois ninguém ama o que não conhece. No diálogo com a samaritana, Jesus vai se dando a conhecer, de modo que, ao perceber parcialmente quem Ele era, ela afirma: “Vejo que és profeta”. Nosso Senhor, porém, mostra que Ele é muito mais que um profeta, revelando-se à samaritana como a fonte de água viva que irá saciá-la.
Em termos práticos, precisamos primeiramente mudar a nossa atitude diante de Deus. Deixemos de procurá-lo como a samaritana, apenas para haurir “água”, e procuremos dar a Ele algo de nossas vidas. Nosso Senhor nos diz: “Dá-me de beber”, porque, quando o amamos, acontece algo de sobrenatural e extraordinário: somos elevados às alturas divinas, a fim de bebermos da única fonte de água que pode realmente saciar-nos.
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