A
pergunta é oportuna para tratarmos de um tema mais necessário do que
nunca e sobre o qual precisamos ter ideias muito claras. Tanto mais por
vivermos num mundo em que a fé vai minguando a ponto de poder ser
comparada a uma grama rala e escassa, num terreno seco e árido.
Para quem não tem fé, a oração entra na lista das coisas inúteis e sem sentido. Aliás, para muitos, sem nenhum
sentido. Estamos na era de um avanço tecnológico assombroso posto ao
alcance de todos, desde a mais tenra idade. Até crianças de menos de
dois anos chegam a agarrar o smartphone de algum irmãozinho
mais velho, e deslizam o polegar sobre a telinha, procurando imitá-lo. A
pequenina vê os irmãos falarem com seus (ou suas) coleguinhas de escola
através daquele aparelho e forma imediatamente a noção de que esse
objeto transmite a voz deles para outras crianças que estão não se sabe
onde. De qualquer modo, ela vê que o tal aparelhinho faz essa conexão
“mágica”.
Diante desse fato, que se tornou banal hoje em dia, o adulto, que não
vive mais no embalo dos sonhos de infância, pode se perguntar: para os
homens se comunicarem entre si, a ciência e a tecnologia colocaram à
nossa disposição vários meios; mas para eu me comunicar com Deus, que
instrumento usar? Não há nenhum instrumento humano! Nada há neste mundo
que possa estabelecer minha comunicação com Deus!
Para responder à pergunta do consulente, que versa sobre a questão
específica da oração aos santos, convém esclarecer primeiro como se faz a
oração dirigida diretamente a Deus.
Como pode o homem comunicar-se com Deus?
Ora, numa definição muito simples, a oração consiste precisamente em
falar com Deus! Definição essa que tem a chancela de um grande Doutor da
Igreja. Segundo Santo Tomás de Aquino, a oração é a elevação da mente a
Deus: elevatio mentis apud Deum. Portanto, uma elevação de minha alma, que é espírito, até Deus, que é puro espírito.
Obviamente, para realizar essa operação, não existe nenhum smartphone
espiritual. Colocado diante da definição de Santo Tomás, e tendo em
mente os avanços da ciência, talvez alguém levante a hipótese abstrusa
de que nosso cérebro possa emitir algum tipo de onda ou feixe de
partículas eletromagnéticas que transmitam até Deus nossa oração. Tanto
mais quanto nossa atividade mental — intelectiva ou volitiva — deve, de
alguma maneira, repercutir nos elementos constitutivos de nosso cérebro.
Aliás, a literatura médica apresenta como certo que idosos com
atividade intelectual intensa estão menos sujeitos a certos tipos de
degenerescência cerebral. Portanto, nossa oração exclusivamente mental
produz repercussões físicas e biológicas benéficas em nosso próprio
cérebro.
Voltando ao tema que nos ocupa, o dado mais relevante a ter em
consideração é que um dos elementos envolvidos nessa comunicação
espiritual é um Ser infinito. Então, se procurarmos no homem que
faculdades ele tem para comunicar-se com a infinitude de Deus, a
resposta pareceria negativa, porque o finito não pode atingir o
infinito! Mas a resposta deve ser procurada do outro lado, isto é, do
lado de Deus: como pode Deus colocar-se ao alcance do homem para ouvir o
que ele tem a dizer-Lhe?
Então, a solução do problema fica muito fácil. Aprendemos no Catecismo
que todos os atributos divinos são infinitos. Assim como Ele é
onipotente — tudo pode fazer e criou o mundo do nada — também é
onisciente, isto é, conhece tudo o que se passa no universo, inclusive
os anseios mais íntimos e secretos do coração humano. Basta, portanto,
formularmos em nosso coração um desejo ou pensamento que Deus
imediatamente toma conhecimento dele. Para falarmos com os grandes deste
mundo, precisamos pedir audiência (que não nos será concedida sem os
devidos apadrinhamentos...). Mas para falar com Deus, o atendimento é
instantâneo, a qualquer hora do dia ou da noite. Que grande honra e
felicidade sermos atendidos na hora, pelo Senhor e Criador do Universo!
Os santos veem em Deus as orações que lhes dirigimos
A oração dirigida diretamente a Deus fica assim explicada. E as orações
que a Ele dirigimos através de Nossa Senhora e dos santos? É claro que
estes não têm uma visão direta do coração humano como Deus tem. Mas Deus
quis associá-los na suprema tarefa da salvação das almas. Sobretudo
Maria Santíssima, sua Mãe Imaculada, a quem Ele constituiu como
Medianeira de todas as graças.
As coisas então se passam assim: a alma faz uma oração, digamos a Santo
Antonio, fazendo determinado pedido; em sua contínua contemplação de
Deus, Nossa Senhora e o santo invocado veem que aquela pessoa suplica
sua intercessão para a obtenção de determinada graça; Nossa Senhora,
constituída como tesoureira dos méritos de Jesus Cristo, obtém de Deus a
concessão daquela graça; e Deus então atende ao pedido daquela alma,
associando os méritos de Santo Antonio aos méritos de Jesus Cristo. No
fim do processo, a alma tem a sensação verdadeira de que obteve a graça
pela intercessão de Santo Antonio. Tudo muito justo, autêntico e
razoável.
A objeção protestante de que os méritos dos santos de nada nos valem
perante Deus não leva em conta que eles valem muito, por estarem
associados aos méritos de Jesus Cristo, que são o fundamento absoluto de
todas as graças concedidas aos homens. O papel de Nossa Senhora, como
Medianeira de todas as graças, fica também devidamente realçado. Máxime
se tivermos em vista seu título de Co-Redentora, ainda não proclamado,
mas cujo fundamento teológico é defendido por mariólogos de peso.
Suponho que seja exatamente esse o esclarecimento que o missivista pedia em sua pergunta: “Que acontece quando rezamos aos santos?”.
Que orações fazer? Que graças pedir?
O missivista pergunta, por fim, que orações deve fazer diariamente. Aí é
melhor deixar ao critério do próprio interessado. Vale um princípio
geral: reze aquelas orações que mais lhe tocam o coração. As quais,
aliás, podem variar de acordo com as disposições de alma no momento em
que a pessoa se encontra.
Não obstante, nunca o fiel deve deixar de fazer a oração da manhã, ao
levantar, e a oração da noite, antes de dormir. Um bom católico nunca
deixará de rezar o terço diariamente, e se possível o Rosário inteiro
(três terços). A oração do Angelus ao meio-dia e às seis horas da tarde costuma fazer parte do rol diário de orações.
Mas há uma prática que não poderia deixar de ser destacada: o
oferecimento das ações e sofrimentos do dia segundo as intenções do
apostolado do Sagrado Coração de Jesus, largamente difundido nas
associações religiosas arraigadas na Igreja antes do Concílio Vaticano
II. Se bem que, em seguida ao Concílio, essas associações tenham sido
postas de lado, combatidas como antiquadas, e mesmo fechadas em
consequência de uma mal entendida participação dos fieis no Santo
Sacrifício da Missa — que dispensaria as devoções tradicionais — o
oferecimento do dia permaneceu como prática normal de um certo número de
católicos. Conviria revalorizá-lo.
Mas a dessacralização e a laicização do mundo avançaram muito nos
últimos 50 anos. Seria bom — e a nosso ver, mesmo necessário — que nas
intenções do oferecimento do dia fosse incluída a eliminação do laicismo
e a restauração da civilização cristã. Sem isso, não haverá a
reevangelização do mundo, tão preconizada pelos últimos Pontífices; a
semente do Evangelho seria lançada em terreno árido e pedregoso, e se
chegasse a brotar, logo se extinguiria, segundo a célebre parábola do
semeador de que falou Nosso Senhor Jesus Cristo (cfr. Mt 13,5-6; Mc
4,5-6; Lc 8,6).
Assim, tomo a iniciativa de propor a seguinte fórmula, que sugiro aos
leitores, submetendo-a, porém, respeitosamente, à autoridade
eclesiástica competente:
Ofereço-Vos, ó meu Deus, em união com o Santíssimo Coração de
Jesus, por meio do Imaculado Coração de Maria, as orações, obras,
sofrimentos, más surpresas e decepções deste dia, em reparação de nossas
ofensas, e por todas as intenções pelas quais Vós Vos imolais
continuamente sobre o Altar. Eu Vo-los ofereço muito especialmente pela
restauração da civilização cristã, e sua extensão em todo o mundo, com o
cumprimento das promessas de Nossa Senhora em Fátima, em particular a
implantação do Reino do Imaculado Coração de Maria ali anunciado.
Palavra do Sacerdote,Revista catolicismo
E-mail para o autor: catolicismo@terra.com.br
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