A
palavra estigma vem do grego stigma = picada dolorosa. Originariamente
indicava a marca impressa no gado com ferro quente, em sinal de
apropriação por parte do boiadeiro. Passou a designar, em linguagem
cristã, as chagas infligidas ao corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo por
ocasião de sua Paixão. E, por último, significa as feridas que pessoas
piedosas trazem em sua carne reproduzindo as chagas de Jesus.
Não há noticia de pessoas estigmatizadas antes do século XIII. O
primeiro caso registrado é o de São Francisco de Assis, que, aos
14/09/1224, recebeu em seu corpo os sinais da Paixão de Jesus. Após esse
Santo, vários outros casos ocorreram na história da Igreja até nossos
dias.
Também se observa que os cristãos protestantes apresentam
pouquíssimos casos de estigmas, ao passo que os ortodoxos orientais não
os conhecem em absoluto. A razão disto é que o fenômeno dos estigmas
está associado à contemplação da Paixão dolorosa de Cristo, devoção esta
que tomou grande incremento no Ocidente a partir do século XIII por
causa dos relatos dos cruzados e outros peregrinos que, voltando da
Terra Santa, narravam minúcias da Paixão do Senhor como as haviam
observado nos lugares sagrados.
Os estigmas vêm a ser um fenômeno que a Psicologia, a Medicina e a
Teologia têm estudado intensamente, a fim de lhe dar uma explicação
satisfatória, ou seja, sem ceder a um falso misticismo como também sem
cair no naturalismo racionalista. Na verdade, há vários casos de pessoas
estigmatizadas, que não podem ser elucidados todos da mesma maneira. É o
que passamos a verificar.
Como explicar os estigmas?
Procurando sintetizar o que a pesquisa transmite aos estudiosos, pode-se dizer o seguinte:
É inegável a influência do psiquismo sobre o corpo humano. O medo faz
empalidecer, dilata as pupilas, provoca suor frio, gaguejar… A vergonha
faz enrubescer… Em certos casos ditos “crepusculares” (como os da
consciência adormecida, hipnose…) as imagens se tornam mais vivas e
efetuam um processo psicoplástico: eczemas, dermografia (sinais ou
letras na pele), acne (erupção pustulenta resultante de inflamação),
paralisia de certas funções do organismo…
Alguns pesquisadores admitem que uma ideia muito viva e estimada
possa chegar a produzir sinais corpóreos. Assim a sugestão incutida a
uma pessoa muito sensível pode redundar em marcas no corpo dessa pessoa
correspondentes ao objeto sugerido. Ver a propósito ainda o Apêndice
deste Módulo e o Módulo seguinte.
Na base destas verificações, pode-se afirmar que a contemplação da
Paixão do Senhor em grau muito intenso pode produzir lesões na pele
do(a) contemplante, lesões semelhantes àquelas que se encontram no
objeto contemplado. Em tal caso, os estigmas são a expressão do grau de
elevação do sentimento religioso da pessoa, e evidenciam a que ponto
pode chegar a força psíquica do indivíduo. É esta a explicação que se dá
a casos de pessoas muito santas que apresentam estigmas: S. Francisco
de Assis, S. Catarina de Sena, S. Gema Galgani, Frei Pio de Pietrelcina…
A santidade de vida desses fiéis exclui qualquer processo fraudulento,
qualquer tendência a fazer teatralidade ou tragédia, provocar compaixão…
O Senhor Deus concede a tais pessoas a graça de participarem
corporalmente da Paixão de Cristo, atendendo assim a um anseio das
mesmas, desejosas de se configurar ao Senhor Jesus; nessas pessoas a
graça de Deus serve-se da índole particularmente sensível de sua
personalidade para provocar os sinais da Paixão de Cristo.
Todavia nem todos os casos de estigmas podem ser diagnosticados com segurança e clareza.
Há casos em que os estigmas aparecem juntamente com vários sintomas
doentios e que parecem ter causa na configuração mórbida da pessoa
estigmatizada e não na graça de Deus. De modo especial salienta-se a
histeria; a pessoa histérica assume frequentemente comportamentos e
estilo de vida teatrais, exibicionistas, procurando chamar a atenção dos
outros, impressionando-os ou cativando a sua simpatia ou a sua
compaixão; daí a facilidade com que tais pessoas podem querer parecer-se
com Jesus Cristo Crucificado por mitomania ou por um desejo doentio. Em
alguns casos o anseio psicológico da dramatização ou de impressionar os
outros pode ter produzido a configuração corpórea correspondente, sem
que se possa dizer que tais pessoas tenham sido especialmente
enriquecidas pela graça de Deus. Não é necessário que essa dramatização
histérica seja efeito consciente e premeditado da parte da pessoa
estigmatizada; o inconsciente pode levá-Ia a apresentar a configuração
estigmatizada, de modo que não se pode dizer que todos os histéricos são
mentirosos e hipócritas.
Estes dados complexos relacionados com a Psicologia e Fisiologia
tornam polivalente o fenômeno dos estigmas. Cada caso há de ser
considerado de per si. Haverá mesmo casos em que não se poderá definir
com clareza a índole do fenômeno: seria realmente uma graça de Deus ou
resultaria unicamente da natureza mórbida da pessoa em foco? É de crer
que não raro os dois fatores se conjugam entre si.
Em todo caso, porém, será sempre de grande valia a análise do
contexto em que ocorrem os estigmas como também a consideração do teor
de vida ou do comportamento geral da pessoa estigmatizada. Se o
exercício das virtudes (amar a Deus e ao próximo, espírito de
penitência, prática da oração) é notório, pode-se crer que os estigmas
são a resposta do Senhor Deus à piedade do(a) seu(sua) servo(a).
Ainda se deve notar que nem todas as chagas que aparecem no corpo
humano podem ser tidas como estigmas. Geralmente os estigmas aparecem e
desaparecem instantaneamente (podem aparecer, por exemplo, na noite de
quinta para sexta-feira e desaparecer na noite seguinte, devendo o mesmo
fenômeno reaparecer na semana seguinte). Além disto, os estigmas não
são acompanhados de supuração; são persistentes, apesar de todos os
tratamentos e cuidados médicos que se lhe dispensem.
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