Anthony van Dyck (1599–1641) | WIKIPEDIA
O que significa a expressão "desceu à mansão dos mortos", que rezamos no Credo?
O
nosso Credo ensina que “Jesus desceu à mansão dos mortos”. Isso
significa que, de fato, Ele morreu e que, por Sua morte por nós, venceu a
morte e o diabo, o dominador da morte (Hb 2,14).
São João disse que Ele veio a nós para “destruir as obras do demônio”
(1 Jo 3,8). O profeta Isaias já tinha anunciado que: “Ele foi eliminado
da terra dos vivos” (Is 53,8), mas o salmista disse que “Minha carne
repousará na esperança, porque não abandonarás minha alma no Hades nem
permitirás que teu Santo veja a corrupção” (Sl 15, 8-11; At 2,26-27).
Jesus morreu, mas Sua alma, embora separada de Seu corpo, ficou unida
à Sua Pessoa Divina, o Verbo, e desceu à morada dos mortos para abrir
as portas do céu aos justos que o haviam precedido (cf. Cat. §637). Para
lá foi como Salvador, proclamando a Boa Nova aos espíritos que ali
estavam aprisionados.
Os Santos Padres da Igreja, dos primeiros séculos, explicaram bem
isso. São Gregório de Nissa (†340) disse: “Deus [o Filho] não impediu a
morte de separar a alma do corpo, segundo a ordem necessária à natureza,
mas os reuniu novamente um ao outro pela Ressurreição, a fim de ser Ele
mesmo, em Sua pessoa, o ponto de encontro da morte e da vida, e
tornando-se, Ele mesmo, princípio de reunião para as partes separadas”
(Or. Catech., 16: PG: 45,52B).
São João Damasceno (†407), doutor da Igreja e patriarca de
Constantinopla ensinou que: “Pelo fato de que, na morte de Cristo, a Sua
alma tenha sido separada da carne, a única pessoa não foi dividida em
duas pessoas, pois o corpo e alma de Jesus existiram da mesma forma
desde o início na pessoa do Verbo; e na Morte, embora separados um do
outro, ficaram cada um com a mesma e única pessoa do Verbo” (De fide
orthodoxa, 3, 37: PG 94, 109 BA).
A Escritura chama de ‘Morada dos Mortos’, Inferno, Sheol ou Hades, o
estado das almas privadas da visão de Deus; são todos os mortos, maus ou
justos, à espera do Redentor. Mas o destino deles não é o mesmo como
mostra Jesus na parábola do pobre Lázaro recebido no “seio de Abraão”.
Jesus não desceu aos infernos (= interior) para ali libertar os
condenados nem para destruir o inferno da condenação, mas para libertar
os justos, diz o Catecismo (§ 633).
Assim, a Boa Nova foi anunciada também aos mortos, como fala São
Pedro (1Pd 4,6). Esta descida de Jesus ao Hades é o cumprimento, até sua
plenitude, do anúncio do Evangelho da salvação, e é a última fase da
missão de Cristo, é a extensão da redenção a todos os homens de todos os
tempos e de todos os lugares.
São João disse que Cristo desceu ao seio da terra [um modo de falar],
a fim de que “os mortos ouçam a voz do Filho de Deus, e os que a
ouvirem vivam” (Jo 5,25). Assim, Jesus, “o Príncipe da vida”, “destruiu
pela morte o dominador da morte, isto é, o diabo, e libertou os que
passaram toda a vida em estado de servidão, pelo temor da morte” (Hb
2,5).
A partir de agora, Cristo ressuscitado “detém a chave da morte e do
Hades” (Ap 1,18), e “ao nome de Jesus todo joelho se dobra no Céu, na
Terra e nos Infernos” (Fl 2,10). Uma antiga homilia, de um autor grego
desconhecido, e que a Igreja colocou na segunda leitura da Liturgia das
Horas, no dia de Sábado Santo, diz:
“Um grande silêncio reina, hoje, na terra, um grande silêncio e uma
grande solidão. Um grande silêncio, porque o Rei dorme. A terra tremeu e
acalmou-se, porque Deus adormeceu na carne e foi acordar os que dormiam
desde séculos. Ele vai procurar Adão, nosso primeiro Pai, a ovelha
perdida. Quer visitar todos os que se assentaram nas trevas e à sombra
da morte. Vai libertar de suas dores aqueles dos quais é filho e para os
quais é Deus: Adão, acorrentado, e Eva com ele cativa. “Eu sou teu Deus
e por causa de ti me tornei teu filho. Levanta-te, tu que dormes, pois
não te criei para que fiques prisioneiro do Inferno: Levanta-te dentre
os mortos, eu sou a Vida dos mortos.”
O Papa beato João Paulo II, falando sobre este mistério, disse:
“Depois da deposição de Jesus no sepulcro, Maria é a única que permanece
a ter viva a chama da fé, preparando-se para acolher o anúncio jubiloso
e surpreendente da ressurreição. A espera vivida no Sábado Santo
constitui um dos momentos mais altos da fé da Mãe do Senhor. Na
obscuridade que envolve o universo, Ela se entrega plenamente ao Deus da
vida e, recordando as palavras do Filho, espera a realização plena das
promessas divinas” (L’Osservatore Romano, ed. port. n.21, 24/05/1997,
pág. 12 (240).
(via Felipe Aquino)
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