Leituras:
Livro do Profeta
Isaías 35, 4-7a;
Salmo 146 (145), 7.8-9a.9bc-10 (R/ 1.2a);
Carta de São Tiago 2,
1-5;
Marcos 7, 31-37.
COR LITÚRGICA: VERDE
Nesta
páscoa semanal Jesus cura um surdo-mudo. Saber usar esses dois sentidos, a
audição e a fala, nos dias de hoje, passou a ser um grande desafio. As pessoas
quando não exercitam a capacidade de ouvirem umas às outras, passam a ter
dificuldades para se comunicarem. É isso que o Evangelho quer ensinar. Devemos
aprender a ouvir primeiro para então falar. Peçamos, de um modo especial ao
Pai, pela nossa Pátria, para que a “independência” possa ser uma realidade em
nosso país.
1. Situando-nos
Mais uma vez vivemos a graça de estar aqui reunidos e
ouvirmos o nosso Deus falando conosco. E continuamos a ouvir sua Palavra
conforme o relato de Marcos.
Domingo passado, frente aos fariseus e mestres da lei
fanaticamente agarrados a padrões religiosos meramente humanos, dando-se até o
luxo de criticar Jesus por quebrar tais padrões em favor de algo mais
essencial, o nosso Mestre, servindo-se de uma observação crítica do profeta
Isaias, responde-lhes: “Vós abandonais o mandamento de Deus e vos apegais à tradição
humana!” (Mc7,8). Mesmo com todas as críticas e resistência da parte das
autoridades religiosas, Jesus continua seu caminho, atraindo multidões de
deserdados e atendendo-as amorosamente em seus clamores e necessidades. E Ele o
faz sem discriminar ninguém, se é pagão ou judeu, ou quem quer que seja, tanto
faz. Desta forma, como Filho de Deus que é, Ele vai nos mostrando qual é mesmo
a “política” do Reino de Deus para nós.
Lembremo-nos também que amanhã, 7 de setembro, é o dia
da nossa Pátria. Colocamos diante de Deus todo o povo brasileiro, lideranças
eclesiais, governantes e governados, sobretudo os mais pobres deste país, e que
todos possamos de fato encontrar em Jesus um consumado Mestre de vida justa e
fraterna para todos.
2. Recordando a
Palavra
Hoje a liturgia coloca diante de nós Jesus atravessando
uma região povoada por não judeus, isto é, pagãos. Muita gente ao seu redor.
Trazem-Lhe um surdo e com problema de fala. Pedem para Jesus curá-lo pela
imposição das mãos. Jesus retira-se a sós com o moço. Coloca os dedos nos
ouvidos dele. Com saliva toca a língua dele. Olhando para céu, dá um gemido e
ordena: “Éffata”, isto é, “Abre-te”.
Na hora o moço começou a ouvir, a sua língua se soltou e
começou a falar normalmente. E não adiantou Jesus proibir a divulgação do
acontecido. Todo o povo ali maravilhado sai proclamando em alto e bom som: Ele
tem feito tudo bem; faz tanto os surdos ouvirem como os mudos falarem (cf. Mc
7,37).
Bem como profetizou Isaias, carca de 500 anos antes,
intuindo a futura restauração messiânica projetada por Deus: Ânimo, pessoal”
Não tenham medo” Deus virá um dia para salvar ... Os ouvidos dos surdos vão se
abrir e a boca do mudo vai gritar de alegria (cf. Is 35,5). E esse Deus de fato
agora veio: na pessoa de Jesus!
Por isso que hoje cantamos o Salmo 146, exaltando o Deus
libertador do ser humano sofrido (oprimidos, famintos, prisioneiros, cegos,
caídos, estrangeiros, órfãos, viúvas ...). “Louva o Senhor, Minh’alma, louvarei
o Senhor, enquanto eu for vivo, enquanto viver, cantarei hinos a meu Deus”, é o
refrão da exaltação.
De quem Deus veio ao encontro na pessoa de Jesus? Dos
pobres. Sim, dos pobres, deserdados da vida; não importando raça, cor gênero ou
religião. Esta é a grande verdade enfatizada hoje pela Palavra de Deus, também
na carta de São Tiago, como ouvimos na segunda leitura: “Escutai, meus
caríssimos irmãos: não escolheu Deus os pobres aos olhos do mundo para serem
ricos na fé e herdeiros do Reino que prometeu as que o amam?” (Tg 2,5). Logo,
se é assim, quem de fato tem fé em Jesus, também age como ele agiu, a saber:
Jamais discrimina os pobres (cf. Tg 2,1-4).
3. Atualizando a
Palavra
Voltemos ao evangelho. E o vemos? Um judeu no meio de
uma multidão de sofridos: Jesus. Com uma atenção toda personalizada, Ele “toca”
o surdo-mudo, coloca-lhe os dedos nos ouvidos, aplica-lhe saliva na língua,
eleva os olhos para o alto, dá um gemido, diz “Éffata”, “abre-te”. Total
proximidade do humano concreto. Total sintonia com o divino. A era messiânica
sonhada pelos profetas se concretiza.
Essa cura é bem um sinal que nos revela a missão de
Jesus neste mundo. Ele não veio com um “político poderoso” destacado (separado)
da plebe, mas como um humilde conviva e servo dos pobres. Esse é o verdadeiro e
divino Messias Salvador! E dessa foram desmascara-se todo um padrão de
triunfalismo messiânico instalado como parasita na mente dos adeptos da
religião judaica.
O fato de Jesus recomendar “insistentemente” para não
contar nada a ninguém sobre o milagre acontecido, mostra de que jeito Deus é e
como, consequentemente, o Filho de Deus age. Ele não gosta de “aparecer”,
esnobar-se. Detesta a autorreferência espetacular. Importa apenas que os excluídos
sejam transformados em filhos do Reino, participantes do banquete da vida. “A
glória de Deus é a vida do ser humano”, dirá Santo Irineu no século II.
Nessa linha, o Evangelho de hoje vem mostrar que o
entusiasmo popular sobre o milagre acontecido não tem a ver com uma espécie de
triunfalismo político-messiânico, mas com um alegre reconhecimento – e
precisamente dos pagãos” – sobre a eficácia da presença do Reino de Deus entre
nós.
E tem um sentido ainda mais profundo, a saber, também os
pagãos são chamados a ter ouvidos abertos para ouvir e língua solta para
testemunhar o Reino acontecendo: “Tudo ele tem feito bem. Faz os surdos ouvirem
e os mudos falarem” (Mc 7,37). Todos são chamados! Mas não se trata só de ouvir
com os ouvidos e testemunhar com a boca! Trata-se também de ouvir com o coração
aberto e testemunhar com um agir pautado no espírito de Jesus, como ouvimos na
segunda leitura.
Tocamos, portanto, numa certeza fundamental de nossa fé:
Deus deseja que todos tenham vida. E a religião é para o bem da humanidade.
“Mas, muitas vezes, a religião é usada para dominar as pessoas, para que fiquem
quietas e não lutem contra a exploração pelos poderosos. Será isso promover a
vida do ser humano? Dizem que os que sofrem serão recompensados na eternidade.
Mas isso não justifica que se faça sofrer aqui na terra.
Também a vida neste mundo pertence a Deus: é o aperitivo
da vida eterna (...) Deus não pode servir para legitimar nenhuma opressão. A
verdadeira religião liberta o ser humano do mal, também o mal político e
econômico. Religião que pactua com a opressão não é a de Jesus. O cristianismo
deve servir para o bem do ser humano: o bem de todos e do homem todo” (KONINGS,
J. Liturgia dominical. Mistério de Cristo e formação dos fiéis (ambos A – B –
C), Petrópolis, Vozes, 2003, p.321).
Somos cristãos e cristãs, discípulos e discípulas do
grande Mestre de vida, o Filho de Deus chamado Jesus de Nazaré. Diante do que
ouvimos d’Ele hoje, chegamos a esta conclusão: “Para que o povo excluído de
hoje possa exclamar ‘Tudo ele tem feito bem’, muito ainda deve mudar na maneira
de vivermos os ensinamentos e o exemplo de Jesus!” (Ibidem).
Deus nos ajude e nos encoraje nesta busca de mudança
(conversão) dentro de nós e entre nós.
4. Ligando a Palavra
com ação eucarística
Por isso que, logo no início da nossa celebração,
pedimos por todos os que creem no Cristo: pedimos a verdadeira liberdade e a
herança eterna. Isto é, que livres de todo apego e opressão, mergulhemos de
cabeça e corpo inteiro nas dimensões do Reino da vida plena para todos.
Depois, em clima orante de ação de graças, na Oração
Eucarística, lembramos diante de Deus a pessoas de Jesus, que “sempre se
mostrou cheio de misericórdia pelos pequenos e pobres, pelos doentes e
pecadores, colocando-se ao lado dos perseguidos e marginalizados”.
Esse Jesus que, “com a vida e a palavra”, anunciou ao
mundo que Deus é Pai e cuida de todos como filhos e filhas, (Oração Eucarística
VI-D - Jesus que passa fazendo o bem). Esse Jesus que, enfim, se faz Corpo por
nós entregue e Sangue por nós e por todos derramado para a remissão dos
pecados. E é desse Jesus que, enfim, nos alimentamos, pedindo ao Pai “viver com
ele para sempre” (Oração depois da comunhão) para produzirmos frutos de justiça
e paz no mundo em que vivemos.
Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!
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