TEMPOS DE PECADO.
Por que o catolicismo está em declínio?
Uma das minhas preocupações sociológicas é: por que o catolicismo
entrou em acentuado declínio no último meio século nos países mais
modernizados e prósperos do mundo, como os Estados Unidos, o Canadá e
grande parte da Europa?
A resposta mais popular para esta pergunta é que o declínio
é todo culpa do Concílio Vaticano II. Mas eu rejeito essa resposta. Se o
Vaticano II teve um papel na queda, foi um papel bem pequeno. Os
fatores importantes devem ser encontrados em outros lugares. Pode haver
uma centena deles, mas um fator deve ser predominante.
O cristianismo
é uma religião de salvação, ou seja, a sua oferta é nos salvar do
pecado. De acordo com a história cristã, Deus se encarnou em Jesus
Cristo, sofreu e morreu na cruz para nos salvar dos nossos pecados. A
premissa, portanto, é que nós, seres humanos, somos pecadores. Sérios
pecadores.
Mas... e se não fôssemos? A consequência seria não
precisarmos de salvação do pecado. E se somos pecadores, mas não nos
sentimos pecadores, também não vamos sentir a necessidade da salvação. E
o cristianismo, desta forma, não fará sentido para nós.
Em
geral, nós, homens e mulheres modernos, não nos sentimos pecadores. Não
seriamente, pelo menos. Sim, admitimos que não somos perfeitos. Qualquer
um de nós pode fazer uma lista das suas imperfeições: às vezes, comemos
ou bebemos um pouco demais; muitas vezes nos exercitamos pouco; não
lemos bons livros o suficiente; cometemos pequenos atos de indelicadeza
de tempos em tempos, e assim por diante. Mas nada realmente pecaminoso o
bastante para que o Criador e Sustentador do universo se faça homem e
venha sofrer e morrer para expiar a nossa grande maldade.
Admitimos que alguns seres humanos são realmente muito maus: Hitler,
Stalin, Osama bin Laden, Charles Manson e alguns outros. Mas eles são
atípicos na humanidade. O resto de nós, seres humanos normais, fica
horrorizado com os crimes de Hitler e companhia. Esta é a prova de que
nós não somos tão maus, não é? Então, não precisamos de salvação do pecado. E não precisamos de uma religião que nos ofereça esta salvação. Não é de admirar que o catolicismo esteja em declínio.
Houve um tempo, séculos atrás, em que as pessoas no mundo cristão (o
que hoje chamamos de "mundo ocidental", já que não podemos mais chamá-lo
com precisão de mundo cristão) tinham um forte senso da sua tendência a
pecar e, portanto, uma forte sensação de precisar da salvação. Foi
nessa atmosfera que o catolicismo floresceu.
Mesmo com a
grande Reforma Protestante, esse forte sentimento de pecado persistiu.
Os primeiros líderes protestantes, como Lutero e Calvino, tinham o mesmo
senso do pecado humano que qualquer católico; talvez ainda mais forte.
Mas as coisas mudaram no século 18. A ideia de que a natureza humana é
inclinada ao mal foi gradualmente substituída pela ideia oposta: a de
que a natureza humana é inclinada ao bem. O pensador que melhor
expressou essa ideia foi Jean-Jacques Rousseau, muitas vezes chamado de
"pai do Romantismo". Mas, se Rousseau era uma poderosa influência no
pensar e no sentir do século 18, é porque ele apenas expressava, com
palavras persuasivas, o que todo mundo, ou pelo menos um grande número
de pessoas, já estava a ponto de pensar e sentir também.
Deve-se admitir que esta substituição da ideia católica de pecado
original pela ideia moderna de bondade humana teve algumas consequências
boas muito importantes. Por um lado, facilitou o advento da democracia,
já que, se os seres humanos são bons, podemos confiar neles para
governar a si mesmos. Além disso, trouxe uma grande confiança em nossos
próprios poderes criativos, o que gerou um enorme progresso econômico e
tecnológico. Mas, e isso também tem de ser admitido, minou a razão de
ser do catolicismo. Existe alguma chance de ressurgir a velha visão católica da propensão humana ao pecado?
Sim, se entrarmos em outro tempo de maldade como o de Hitler e Stalin.
Era relativamente fácil acreditar em pecado original durante o tempo de
Hitler e Stalin, que ofereciam demonstrações diárias de maldade. Mas
será que não há outra maneira de recuperarmos o nosso senso de
necessidade da salvação?
Tudo depende do que queremos dizer
com pecado. Se o pecado é questão de gestos sensacionais de imoralidade
(assassinato, estupro, roubo, apropriação indébita, abuso sexual de
crianças, autodestruição com drogas e álcool etc.), é claro que a
maioria de nós não é pecadora e não precisa da redenção cristã. Mas se o
pecado é a falta de santidade, a redenção é tudo de que precisamos,
porque só Deus é verdadeiramente santo. Nós, humanos, não somos santos
nem podemos nos fazer santos. Podemos tornar-nos santos sendo salvos do
nosso estado pecaminoso de falta de santidade, mas apenas por graça de
Cristo.
A raiz do problema, creio eu, é que nós, humanos modernos,
não acreditamos de verdade em Deus. Acreditamos mais ou menos. Se
realmente acreditássemos em Deus, teríamos um forte senso da santidade
de Deus e, por conseguinte, um forte senso da nossa própria falta de
santidade, ou seja, do nosso pecado. Isto, por sua vez, nos faria sentir
a necessidade de ser salvos do pecado.
O catolicismo reflorescerá, em suma, quando reflorescer a genuína e sólida fé em Deus.
David Carlin
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