Uma tradição muito antiga, que
atravessou os séculos e ficou plasmada em muitas obras de arte, afirma
que a primeira aparição de Cristo ressuscitado foi à sua Mãe Santíssima.
É natural que Jesus, que ficava feliz
trazendo alegria aos que amava, tivesse levado a primeira alegria da
Ressurreição à sua Mãe. Não era ela quem mais a merecia? Ela que tinha
acreditado firmemente, desde o momento da Encarnação, que aquele seu
filho e filho do Altíssimo, era – como o anjo Gabriel lhe havia
anunciado – o Messias descendente de Davi, que reinaria eternamente e
seu Reino não teria fim (Lc 1, 33).
Maria uniu-se ao Redentor em todos os
momentos da sua vida e especialmente na Paixão, oferecendo sua imensa
dor juntamente com o sacrifício do Filho. Ali ouviu dos lábios de Jesus
agonizante a sua “nomeação” como Mãe dos discípulos, mãe de todos os
homens: “Mulher, eis aí teu filho”… (Jo 19,26). Por isso, certamente
merecia receber as primícias da alegria da Ressurreição.
É muito bonito pensar que, naqueles
momentos de escuridão quase total que envolveu os discípulos após a
morte de Jesus, a única luz de esperança que não se apagou foi o coração
de Maria. Esse coração maternal, que acabava de ser atravessado por uma
espada de dor, como profetiza Simeão (cf. Lc 2, 35), foi, ao mesmo
tempo, a única lâmpada que ardia com a luz da santa esperança. Ela foi a
única que, no silêncio do sábado santo, esperou na ressurreição do
terceiro dia.
A mãe que ensina a confiar
Certamente,
ao longo de toda a sua vida, ela viveu e encarnou a esperança como
ninguém. Acreditou no anúncio do Anjo Gabriel, entregou-se sem duvidar
ao que Deus lhe pedia – <> -, e
desse solo fecundo da fé, brotou-lhe a esperança como uma planta viçosa,
como uma fonte de água viva.
Conta São Lucas que, quando Maria –
pouco depois da Anunciação – foi visitar a sua prima Isabel, esta louvou
Nossa Senhora em alta voz: Feliz a que acreditou, porque se cumprirão
todas as coisas que lhe foram ditas da parte do Senhor (Lc 1, 39-45).
Maria acreditou, esperou, e viu realizados nela todos os sonhos de Deus.
Por isso a Igreja a chama Mãe da santa esperança, e por isso nós a
invocamos como Mãe da misericórdia, vida, doçura e esperança nossa… Não
são apenas belas palavras. Estão cheias de conteúdo, pois descrevem a
missão que Jesus lhe confiou em favor de todos nós, irmãos de Cristo
(cf. Rm 8,29) e filhos dela (cf. Jo 19,26).
Quando Jesus nos deu Maria como Mãe, na
agonia na Cruz, garantiu-nos a esperança. É verdade que a nossa
esperança deve estar, toda ela, colocada em Deus. Só Deus é o motivo e a
fonte radical da esperança, que, sem a sua graça, não pode existir. Mas
Ele deu-nos uma Mãe – a sua Mãe – para que, com a ternura de seu
coração, nos ensinasse a confiar; para que nos amparasse e nos guiasse
na vida e, como a mãe leva a criança pela mão, nos conduzisse ao
encontro de Cristo e finalmente nos introduzisse no Céu.
Uma das orações mais antigas dirigidas a
Nossa Senhora, que ainda hoje muitos católicos sabem de cor, diz: “À
vossa proteção nos acolhemos, Santa Mãe de Deus; não desprezeis as
súplicas que nossas necessidades vos dirigimos, mas livrai-nos sempre de
todos os perigos, ó Virgem gloriosa e bendita. Rogai por nós, santa Mãe
de Deus, para que sejamos dignos das promessas de Cristo”. Desde os
primeiros séculos, a esperança do cristão se refugiava nela.
Na verdade, o Espírito Santo –
inspirador da Sagrada Escritura – deixou-nos motivos mais do que
suficientes para que aprendêssemos a confiar na “Esperança nossa”.
Bastaria lembrar a cena das bodas de Caná (Jo 2,1-11), onde a petição de
Maria – suave, discreta, sussurrada ao ouvido – obteve de Jesus o seu
primeiro milagre, a transformação da água em vinho.
Naquela festa de bodas, começou a faltar
o vinho. Maria teve pena dos noivos. Aquilo podia estragar a alegria do
banquete. Então disse a Jesus: “Não têm vinho!” A resposta do Filho
parece um balde de água fria – “Mulher, isto nos compete a nós? A minha
hora ainda não chegou”; mas Maria não deixou ele confiar, e com toda a
paz disse aos serventes: “Fazei tudo o que ele vos disser”… Não precisou
fazer mais nada. Logo Jesus mandou aos serventes encher de água umas
grandes talhas que lá se encontravam, e depois indicou que fosse servida
aos convidados. Foi o melhor vinho da festa!
Maria adiantou assim – Deus tem os seus
planos! – a hora dos milagres de Jesus. E graças a esse primeiro
milagre, obtido pela intercessão da Virgem, o Evangelho diz que Cristo
manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele. Tudo, pela
solicitude de Maria, pela ternura do seu coração. Se Jesus fez isso, a
pedido de Maria, o que não fará por nós? É como se Ele próprio nos
estivesse dizendo: “Vocês veem? Confiem na Mãe! Confiem que Eu a ouvirei
sempre! Ela conseguirá de mim o que quiser”.
A Mãe de Misericórdia
É por isso que os santos e os bons
teólogos dizem que Nossa Senhora é a <>, que maneira hiperbólica – mas realista – de
referir-se ao poder das súplicas de Maria diante de Jesus.
São Bernardo, o “trovador da Virgem”,
gostava de compará-la ao aqueduto que recebe a água da fonte (a água da
graça, da fonte que é Deus) e a faz chegar a nós, da mesma maneira que
um aqueduto recolhia então a água das fontes de montes e vales elevados e
a conduzia até os povoados. E dizia: “Recebendo a plenitude da graça da
própria fonte do coração do Pai, no-la torna acessível […]. Com o mais
intimo, pois, da nossa alma, com todos os afetos do nosso coração e com
todos os sentimentos e desejos da nossa vontade, veneremos Maria, porque
esta é a vontade daquele Senhor que quis que tudo recebêssemos por
Maria”.
Que ânimo isso nos dá! Não é verdade
que, ás vezes, custa-nos quase acreditar na misericórdia divina,
especialmente depois de termos abusado muito dela, com tantos
arrependimentos insinceros, de tantas reincidências meio cínicas? E, no
entanto, nem no pior dos casos devemos desesperar da misericórdia de
Deus, ainda que nos vejamos afundados – como o filho pródigo – na mais
suja lama do pecado.
Nessa triste situação, ninguém como
Maria para ajudar-nos. Ela é Mãe. No tenhamos medo, por mais imundos e
machucados que estejamos. Ela não deixará de facilitar um bom banho às
suas crianças. Ela nos moverá ao arrependimento sincero, ela nos levará –
se for preciso, pela orelha – até à Confissão, e nos carregará
finalmente no colo, limpos e felizes.
“Se eu fosse leproso – escrevia São
Josemaria -, minha mãe me abraçaria. Sem medo nem repugnância alguma,
beijar-me-ia as chagas. – Pois bem, e a Virgem Santíssima? Ao sentir que
temos lepra, que estamos chagados, temos de gritar: Mãe! E a proteção
de nossa Mãe é como um beijo nas feridas, que nos obtém a cura”.
A poderosa Intercessora
A confiança em Nossa Senhora sempre foi
tão grande entre os bons cristãos que alguns até “exageraram”. Mas
exageraram de uma maneira bonita, assim como se amplia um detalhe de uma
flor belíssima, muito além do seu tamanho normal, para poder apreciá-la
melhor. Não há “mentira” nisso! Um exemplo entre mil são uns versos do
“poeta da esperança”, o já citado Charles Péguy, que põe na boca de Deus
Pai as seguintes palavras:
“Eu não vi no mundo – diz Deus – nada mais belo que uma criança que adormece fazendo a sua oração […]”.
[O poeta estende-se, em versos tocantes,
falando da maravilha que é a criança que dorme rezando, e aí nenhuma
das coisas que diz é exagero].
“Nada é tão belo! – continua Deus a
dizer –. E este é mesmo um ponto em que a Virgem Santa está de acordo
comigo. Lá em cima (no Céu).
Posso dizer até que este é o único ponto
em que estamos plenamente de acordo. Pois geralmente os nossos
pareceres são contrários.
Porque ela está do lado da misericórdia, e Eu…, bem, é preciso que Eu esteja do lado da justiça”.
São versos que fazem sorrir (e comovem
um pouquinho), mas são <> pelo sentimento de
confiança em Maria que transmitem. Junto dela, só um cego espiritual, um
tolo ou um demônio, podem perder a esperança.
Foi assim que o entenderam os cristãos
desde o começo. Não podemos esquecer o que nos mostra a Sagrada
Escritura, nos Atos dos Apóstolos, logo depois da Ascensão do Senhor.
Jesus
tinha-se despedido indicando aos seus que permanecessem em Jerusalém,
“até que sejais revestidos da força do Alto” (Lc 24,49), ou seja, até a
vinda do Espírito Santo, no dia de Pentecostes. Pois bem, no livro dos
Atos diz-se que todos – os Apóstolos, os discípulos, as santas mulheres –
obedeceram, e se reuniram, durante dez dias, no Cenáculo, com Maria, a
Mãe de Jesus. Lá, junto dela, como uma família apinhada junto da Mãe,
perseveravam unanimemente na oração (cf. At 1,12-14).
Junto de Nossa Senhora, tornava-se fácil
cumprir o que Jesus tinha ordenado. Sempre é assim! A única coisa que
Ela nos pede é a que pediu aos serventes de Caná: “Fazei tudo o que Ele
vos disser”. E ela mesma ficará solicita, junto de nós, para nos ajudar a
cumpri-lo.
Por isso, uma vida espiritual impregnada
de devoção a Nossa Senhora é uma vida espiritual sadia, voltada
inteiramente para o cumprimento da Vontade de Deus. “Antes, sozinho, não
podias… – dizia São Josemaria. – Agora, recorreste à Senhora, e, com
Ela, que fácil!”.
Retirado do livro: “A Ressurreição e a Esperança Cristã”. Pe. Francisco Faus. Ed. Quadrante.
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