sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Deus é culpado do mal que há no mundo?

  
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A revista VEJA (n.2433 de 8/7/2015) publicou uma entrevista com o astrofísico americano Neil Degrasse Tyson, divulgador da ciência como Carl Sagan, com o título “A busca pela origem de tudo”. Lamentavelmente o cientista abandona o campo da pura ciência para opinar no campo da teologia, que ele nada entende, e age, então, como incoerente.

Entre outras citações, querendo negar a existência de Deus, ele afirma que se Deus existe, então, temos de aceitar que Ele “Deixa pessoas inocentes serem atropeladas na rua… permite que uma criança morra de leucemia… Ou ainda faz vistas grossas diante de furações e vulcões que matam milhares. Se Deus está por trás de tudo, é muito bom em matanças…” (p. 18).
É triste ver um cientista que nada entende do pecado original e de teologia, opinando sem qualquer base sobre Deus e sua ação no mundo. Ora, a teologia é uma ciência, e requer capacitação nela para se tirar conclusões sobre Deus. Este cientista age como se eu, físico e matemático, quisesse opinar sobre neurociências ou obstetrícia. Eu seria um irresponsável. Se alguém quiser prescrever receitas médicas sem ser médico, será chamado de charlatão; e quem dá receitas sobre Deus e suas ações sem ter estudado teologia?
Alguém contou uma história interessante que aconteceu na Inglaterra: Um indivíduo descabelado sujo pôs-se de pé, no meio de um curioso grupo de pessoas que escutavam um pregador no Hyde Park de Londres. Dirigiu-se ao orador e fez-lhe uma pergunta que era um grito de indignação: “O senhor diz que Deus veio ao mundo faz dois mil anos… Como é possível então que o mundo continue cheio de ladrões, adúlteros e assassinos?”.
Fez-se um silêncio muito grande. Todos os que estavam presentes acharam que era uma objeção para a qual não havia resposta. Mas o pregador olhou-o serenamente e respondeu: “Tem toda a razão. Mas a água também existe há milhões de anos, e, no entanto…, repare como você está sujo!”

Assim como aquele homem podia servir-se ou não da água, nós, os homens, temos a possibilidade de usar bem ou mal da nossa liberdade; inteligência, vontade, etc.. Mas quem é responsável por essa decisão somos nós, não Deus. Deus confiou no homem, aceitou correr o risco de nos fazer livres, para sermos grandes, sua imagem e semelhança, e permitiu até que o homem pudesse usar mal dessa liberdade para se opor a Ele, como também fizeram muitos anjos.
Deus nos deu inteligência para discernir o bem do mal; colocou em nós a Consciência, a Sua voz que nos diz: “faça o bem, evite o mal”, como uma lei natural que independe de religião, crença ou nação. Deu-nos a memória para guardar o que é bom e o que é mal, e a vontade para fazer o bem e não o mal. Além de tudo Ele mostra-nos a sua bondade espelhada em todas as criaturas, especialmente em nós. Basta olharmos para dentro de nós e para fora, que veremos a bondade, o amor, a grandeza, o poder e a delicadeza de Deus.
Como a Igreja explica o mistério da “aparente impotência de Deus”? Por vezes, Deus pode parecer ausente e incapaz de impedir o mal. O sofrimento está ligado às limitações próprias das criaturas e, sobretudo, à questão do mal moral, o pecado. “O salário do pecado é a morte” (Rom 6,23).
Santo Agostinho perguntava: “De onde vem o mal?”. “Eu perguntava de onde vem o mal e não encontrava saída”, em sua própria busca sofrida não encontrara saída, a não ser em sua conversão ao Deus vivo. Pois “o mistério da iniquidade” (2 Ts 2,7) só se explica à luz do “Mistério da piedade”. É a revelação do amor divino em Cristo que nos mostra a extensão do mal e a superabundância da graça. Precisamos, pois, abordar a questão da origem do mal fixando o olhar de nossa fé Naquele que, e só Ele, é o Vencedor do mal, ensina a Igreja.
Esta é a pergunta que fazem os ateus: “Se Deus é Todo-Poderoso, Criador do mundo ordenado e bom, cuida de todas as suas criaturas, por que então o mal existe?”
Para esta pergunta misteriosa, não há uma resposta rápida. É o conjunto da fé cristã que constitui a resposta a esta pergunta. Diz o nosso Catecismo que: “Não há nenhum elemento da mensagem cristã que não seja, por uma parte, uma resposta à questão do mal” (§309).
Alguém ainda pode perguntar: “Mas por que Deus não criou um mundo tão perfeito que nele não possa existir mal algum?”
São Tomás de Aquino responde que, segundo seu poder infinito, Deus sempre poderia criar algo melhor. “Todavia, em sua sabedoria e bondade infinitas, Deus quis livremente criar um mundo “em estado de caminhada” para sua perfeição última. Juntamente com o bem físico existe o mal físico, enquanto a criação não houver atingido sua perfeição” (cf. CIC, §310).
Deus criou os anjos e os homens, inteligentes e livres, que devem caminhar para seu destino último livremente e por amor ao Criador. Mas podem se desviar. E, de fato, pecaram. Foi assim que o mal moral entrou no mundo, muito mais grave do que o mal físico. Deus não é de modo algum a causa do mal moral. Deus permite isso respeitando a liberdade de sua criatura, mas sabe, misteriosamente, do mal tirar o bem. Santo Agostinho disse que “Deus Todo-Poderoso…, por ser soberanamente bom, nunca deixaria qualquer mal existir em suas obras se não fosse bastante poderoso e bom para fazer resultar o bem do próprio mal” (Enchiridion 3,11).

Com o passar do tempo, Deus, em sua providência todo-poderosa, pode tirar um bem das consequências de um mal, mesmo moral, causado por suas criaturas, como, por exemplo, no caso de José do Egito. Ele foi vendido por seus irmãos, por inveja; mas Deus fez dele o governador do Egito que, mais tarde salvou o seu povo da fome.
“Não fostes vós, diz José a seus irmãos, que me enviastes para cá, foi Deus; – o mal que tínheis a intenção de fazer-me, o desígnio de Deus o mudou em bem a fim de – salvar a vida de um povo numeroso” (Gn 45,8; 50,20).
Do maior mal cometido pela humanidade, a rejeição e homicídio do Filho de Deus, por causa de nossos pecados, Deus, tirou o maior dos bens: a glorificação de Cristo e a nossa Redenção. Mas, nem por isso o mal não se converte em um bem.



Prof. Felipe Aquino

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