terça-feira, 24 de julho de 2018

Nossa Senhora, corredentora? (I)

MARY WITH CHILD
Waiting For The Word | CC BY 2.0

Um debate em torno da hipótese de Nossa Senhora ser, solenemente, definida como Corredentora da humanidade

O bispo de Getafe, Dom Ginés García Beltrán, apresentou, recentemente, na paróquia de Santa Maria Maravilhas de Jesus, na Espanha, o Fórum Diocesano Mariano. Um dos pontos do evento é promover um debate em torno da hipótese de Nossa Senhora ser, solenemente, definida como Corredentora da humanidade. Dado que o tema sempre volta à baila, proporemos, em uma série de quatro artigos, em forma de perguntas e respostas, a temática a fim de orientar clérigos e leigos interessados.
Qual é o objetivo deste artigo? – O objetivo deste artigo é apresentar – com base em Pergunte e Responderemos (PR) n. 425, outubro de 1997, p. 445-450 – aspectos do debate teológico promovido por um grupo de Bispos que deseja obter da Igreja a definição solene de Maria Santíssima como Medianeira, Corredentora e Advogada do gênero humano.
Em que períodos essa corrente foi mais forte? – Essa corrente foi mais forte, especialmente nos anos antecedentes ao Concílio Vaticano II (1962-1965), ou seja, entre 1959 e 1962, por meio de petições diretas de 256 Bispos desejosos de ver proclamado o dogma da “Mediação universal de Maria Santíssima”, além de outros 48 Bispos que pediam a mesma coisa, mas com uma ressalva: “se fosse considerado oportuno”.
A mesma discussão foi retomada, na década de 1990, sobretudo a partir de 1996, com a publicação do livro Mary: coredemptrix, mediatrix, advocata, do Prof. Mark Miravalle, da Universidade Franciscana de Steubenville, em Ohio (Estados Unidos). Tal obra – que tem o prefácio de apoio do Cardeal Edouard Gagnon, defensor da proclamação de mais esse dogma mariano – era, na época, porta-voz de cerca de 40 Cardeais e 500 Bispos (cf. PR, p. 447 e 445).
Como seria definida essa nova fórmula dogmática? – O Prof. Miravalle propõe a seguinte formulação dogmática: “A Corredenção de Maria é aquele privilégio pelo qual a Imaculada sempre Virgem Mãe de Deus cooperou livremente com e sob Jesus Cristo, seu Filho e Redentor, na Redenção histórica da família humana, desde o seu Fiat na Anunciação até o sacrifício do seu coração materno no Calvário; e assim Maria se tornou para nós a Medianeira de todas as graças da Redenção e Advogada do Povo de Deus” (PR, p. 445).
Como se fundamentaria na Tradição o dogma da corredenção de Maria? – Miravalle cita textos patrísticos e, entre outros, um sermão de S. Cirilo de Alexandria (+ 444), que dizia: “Salve Maria, Mãe de Deus (Theotókos), venerável tesouro do mundo inteiro, é por meio de vós que a Ssma. Trindade é adorada e glorificada”. Cita, outrossim, o teólogo russo Sérgio Bulgakov, que escreveu: “A fé em Cristo que não inclua o seu nascimento virginal e a veneração de sua mãe é uma outra fé, é outro Cristianismo diferente do da Igreja Ortodoxa” (PR, p. 446).
Na história, qual seria a importância desse dogma para os dias de hoje? – Para Miravalle a importância atual do dogma é mostrar à humanidade que quem sofre participa, hoje, dos sofrimentos de Cristo, Nosso Senhor, colaborando, assim, com a obra redentora de Jesus. Seria uma oportuna palavra de reconforto aos sofredores de nosso tempo. Eis sua fala: “O exemplo de Maria Corredentora diz à Igreja e ao mundo que o sofrimento é corredentor. Isto tem imediato significado para as tragédias do aborto e da eutanásia, recursos estes que, cada qual a seu modo, negam os efeitos fecundos do sofrimento”.
E mais: O teólogo norte-americano amplia sua visão – juntamente com o teólogo anglicano (ramo cristão dissidente da Igreja Católica a partir do século XVI na Inglaterra) John Maquarre – ao defender que a definição da livre participação de Maria na obra redentora daria uma resposta ao determinismo (sistema filosófico que nega a influência pessoal sobre a determinação de alguém)  professado por Lutero e Karl Barth, assim como pelos materialistas totalitários de direita e de esquerda: a livre cooperação da Virgem Santíssima seria paradigma da liberdade com que todos  os homens podem (e devem) responder ao chamado de Deus, cumprindo a missão a eles confiada. Maria é o símbolo da perfeita harmonia que deve existir entre a vontade de Deus e a resposta dos homens ao plano do Pai (cf. PR, p. 446).





Vanderlei de Lima

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