Jesus não foi um homem que "pretendeu" ser Deus, mas o Verbo que se fez carne e veio morar entre nós.
Os cristãos confessam, desde sempre, que Jesus Cristo é Deus. São João
escreve que a Palavra, que "estava junto de Deus" e "era Deus" (
Jo 1, 1), "se fez carne e veio morar entre nós" (Jo 1,
14). São numerosos os discursos de Cristo em que Ele deixa claro ser
muito mais que um simples homem – todo o Evangelho de São João está
permeado de declarações desse teor –, sendo este o motivo alegado pelos
judeus para condená-Lo à morte: "Não queremos te apedrejar por causa de
uma obra boa, mas por causa da blasfêmia. Tu, sendo apenas um homem, pretendes ser Deus" (Jo 10, 33).
Se, naquela época, até quem não seguia Nosso Senhor tinha clara
consciência da grandeza do que Ele anunciava, hoje, muitos – atribuindo a
si o apelido de "cristãos" – têm advogado, covardemente, uma "terceira
opção": ao invés de rejeitar ou aceitar de vez a mensagem do Evangelho,
recorrem a uma leitura distorcida das Escrituras, reduzindo a figura de
Jesus à de "um grande profeta, um mestre de sabedoria, um modelo de
justiça" [1], cujas máximas valeriam, no máximo, como "guias
motivacionais". Para essas pessoas, a Bíblia não é o livro que traz a
revelação de Deus, mas tão somente um "manual de autoajuda"; e a Igreja
não é um edifício espiritual, mas uma construção puramente material,
voltada apenas aos cuidados e necessidades deste mundo.
Antes de mais nada, importa denunciar o grave equívoco desse ponto de
vista, que não pode ser aceito sem se cometer um grande e grave atentado
à razão. Se Jesus não é "o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do
mundo" (
Jo 1, 29), nem "o pão que desceu do céu" e que dá a vida eterna (Jo 6, 41), nem "a porta das ovelhas" (Jo 10,
7) – realidades que ninguém usaria senão para se referir à divindade –,
então, ou é um mentiroso, que queria enganar os outros, ou um louco,
que não sabia sequer quem ele mesmo era. Ora, que grandeza pode haver na
mentira e na loucura? Ou Jesus é Deus, ou não é nada. Et tertium non datur [2].
É preciso reconhecer, porém, como é cômodo relegar Nosso Senhor à
posição de "apenas um homem". Se é assim, as suas palavras realmente não
vinculam, nem obrigam ninguém a nada; são apenas reflexões morais e
sociais, como as de qualquer pensador antigo. Daria no mesmo, então,
citar Confúcio, Dalai Lama, Buda, Chico Xavier ou Jesus Cristo. Afinal,
se são todos homens, com igual tratamento deveriam ser acolhidas suas
mensagens: como palavras humanas.
A prática da Igreja primitiva, no entanto, atesta: os discípulos sempre
creram que pregavam uma doutrina autenticamente divina. Em carta a
Tessalônica, por exemplo, o Apóstolo agradece a Deus "sem cessar,
porque, ao receberdes a palavra de Deus que ouvistes de nós,
vós a recebestes não como palavra humana, mas como o que ela de fato é: palavra de Deus, que age em vós que acreditais" (1 Ts 2,
13). Tanto ontem, como hoje, a fé católica não mudou. Diante das vozes
enganadoras que pretendem reduzir a imagem de Cristo à de um chefe
religioso qualquer, urge dizer "não": a boa-nova do Evangelho não é
"palavra humana", mas, verdadeiramente, "palavra de Deus".
Foi o que disse o Cardeal Joseph Ratzinger – depois, Papa Bento XVI –, na virada do novo milênio,
quando publicou a declaração Dominus Iesus,
"sobre a unicidade e a universalidade salvífica de Jesus Cristo e da
Igreja". Em 2000 – ou, "em pleno século XXI", diriam os mais
escandalizados –, a Igreja recordava que "os homens (...) só poderão
entrar em comunhão com Deus através de Cristo" [3]. À época, os meios de
comunicação "rasgaram as vestes", acusando São João Paulo II e o
Vaticano de arrogância e intolerância religiosa. É que, com a Dominus Iesus,
a Igreja denunciava taxativamente as opiniões mundanas a respeito de
Jesus, das quais a mídia moderna se faz porta-voz tão ardorosa:
"Na reflexão teológica contemporânea é frequente fazer-se uma aproximação de Jesus de Nazaré, considerando-o uma figura histórica especial, finita e reveladora do divino de modo não exclusivo, mas complementar a outras presenças reveladoras e salvíficas. O Infinito, o Absoluto, o Mistério último de Deus manifestar-se-ia assim à humanidade de muitas formas e em muitas figuras históricas: Jesus de Nazaré seria uma delas." [4]
Nesse sentido, a fé católica é profundamente intolerante, sobretudo,
porque é fiel à palavra de Cristo, que não temeu apontar a si mesmo como
"o caminho, a verdade e a vida", fora do qual ninguém pode ir ao Pai (
Jo 14, 6). Essa expressão - dita pelo mesmo Jesus que perdoou
os pecadores arrependidos, curou os doentes e saciou os pobres - mostra
como a misericórdia divina está profundamente unida à verdade da Sua
mensagem, que repele todo erro, toda mentira… e toda falsa religião.
Ao argumento dos judeus de que Jesus, sendo apenas um homem, se fazia
Deus, a Igreja responde, em consonância com dois mil anos de Tradição e
Magistério: Jesus não foi um homem que
pretendeu ser Deus. Ao contrário, Ele foi Deus, que, não se
apegando ciosamente à natureza divina, "despojou-se, assumindo a forma
de escravo e tornando-se semelhante ao ser humano" (Fl 2, 7). Eis o que creem os cristãos.
Por Equipe Christo Nihil Praeponere
Referências
- Papa Francisco, Angelus, 24 de agosto de 2014
- Sobre isso, cf. RC 221: Como provar que Jesus é Deus?
- Dominus Iesus, 12
- Ibidem, 9
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