A
revista GALILEU refere novas experiências feitas por cientistas diversos no
intuito de descobrir o que no ser humano existe além do corpo e que os
religiosos chamam “alma”. Todavia não concebem a noção de espírito, julgando que
a alma se reduz a uma corrente fluída ou coisa semelhante. Por isto não chegaram
até hoje a conclusão alguma.
A revista
GALILEU apresenta uma reportagem intitulada “Em Busca da
Alma”, com a seguinte ementa: “Cientistas debruçam-se sobre o maior enigma da existência humana. E já especulam que redes
cerebrais e até física quântica podem explicar o que há além de nossos corpos”.
- Passamos a expor algumas das mencionadas experiências e o conceito
cristão de alma humana.
1. As pesquisas
A reportagem começa
por relatar o caso de um paciente gravemente enfermo, que dizia ver uma família
inteira (pais e filhos) “desencarnada” a lhe desejar os melhores resultados de
uma cirurgia no cérebro, à qual se submeteria em breve. - Pergunta
a reportagem: não seria o caso de admitir uma vida no além?
Também os casos de
projeciologia ou pretensamente “da alma que sai do corpo e passeia pelos ares”
não seriam a prova de que há dois componentes do ser humano, dos quais um pode
separar-se do outro e contemplar do alto as manobras dos
homens neste mundo?
Estes fatos,
significativos como eram, foram submetidos ao crivo da ciência. Isto foi
efetuado pelo médico norte-americano Duncan MacDougall, que resolveu pesar pacientes em estado terminal antes
e depois de morrerem. Conseguiu o beneplácito de seis indivíduos, que foram
submetidos a tal experiência, e verificou que perdiam entre 11 e
43 gramas depois que morriam -
na média algo como 21 gramas.
Para o pesquisador, este seria o peso da alma, que, ao ‘desencarnar’, torna o corpo mais leve.
Tal conclusão,
porém, não foi aceita pelos cientistas em geral; a pequena baixa de peso foi
atribuída à perda natural de água do corpo, uma vez que ele pára de
funcionar.
Retomando esse tipo
de pesquisa, o Dr.
Gerard Nahum propôs acompanhar a
morte de um paciente com diversos tipos de detector; se algo saísse do corpo do
moribundo juntamente com seu último suspiro, este algo seria detectado pelas
radiações emitidas pelo detector. Todavia não conseguiu, em parte alguma,
pessoas que se oferecessem para a realização do teste.
Insistindo na
pesquisa, o Dr. Peter Brugger, da Universidade de Zurique
(Suíça) retornou aos casos de saída para fora do corpo e julgou poder situar o
princípio vital do homem na área têmporo-parietal do cérebro. A viagem astral
não implicaria passeio fora do corpo, mas seria “um truque produzido pelos
circuitos cerebrais do sujeito. Peter Brugg rejeitou assim as viagens fora do
corpo, qualificando-as como projeções
do cérebro do indivíduo; é o que se
chama “alucinação” em Parapsicologia. Para confirmar tal conclusão, o médico
suíço lembrava o caso de pessoas que têm um membro amputado; referem a sensação
de que a parte do corpo perdida ainda continua onde estava. Tal conjunto de
falsas sensações é chamado “criação de membro fantasma”; prova que o cérebro é
capaz de produzir as mais sofisticadas ilusões. As experiências até aqui
descritas ainda deixam dúvidas, pois os animais inferiores também têm cérebro,
mas não fazem o que o homem faz.
Há então quem diga
que a resposta procurada está na Física quântica, e num estranho conjunto de
regras que explica o funcionamento das coisas na escala de átomos e partículas,
os menores seres que existem, como nos parece. - O físico
britânico Roger Penrose, da Universidade de Oxford, resolveu investigar os
segredos da consciência e concluiu que as fagulhas do pensamento consciente
estão ligadas a fenômenosquânticos, que ocorrem numa escala muito menor e
mais misteriosa do que a dos neurônios
e outras células
cerebrais.
Assim a ciência
contemporânea procura na área da matéria a explicação daquilo que a fé chama
“alma humana”.
Veremos, a seguir,
como entender a alma humana, que, na verdade não se reduz a um órgão ou parte de
um órgão material.
2. Alma humana: que é?
2.1. Princípio vital
É por um princípio
vital que os viventes são vivos. Esse princípio é chamado anima
(em latim), alma
(em português). A sua
existência se depreende das seguintes observações:
1) O vivente animal está profundamente imerso no
mundo material. Consta de água (60%),
substâncias orgânicas (35,6%), substâncias minerais
(4,4%). Mais: quatro elementos simples
(oxigênio, carbono, hidrogênio, nitrogênio) constituem 95% da matéria viva. Oito
elementos simples (cálcio, enxofre, fósforo, sódio, potássio, cloro,
magnésio, ferro) constituem 4,99% da mesma. Outros elementos,
0,01%.
2) Ao mesmo tempo, porém, o
vivente emerge acima do mundo meramente químico por algo que se
chama o seu princípio vital (anima). É a anima
que dá a animação ou faz o
ser
animado, vivente.
Todos os elementos estão em
contínuo fluxo no organismo vivo. O metabolismo faz que sejam assimilados e
eliminados constantemente. Periodicamente (no homem, de sete em sete anos), o
vivente não é, materialmente, mais o mesmo. Todavia o que
assegura a unidade e a continuidade do vivente, cuja matéria está em
constante troca, é o seu princípio vital ou a sua anima.
Esta dá e conserva a organização dos
elementos materiais.
2.2. Três tipos de princípio
vital
Distinguem-se três graus de
vida e, por conseguinte, três tipos de princípio vital:
1) Vida vegetativa: possui apenas quatro propriedades básicas: nutrição,
crescimento, reprodução, irritabilidade.
2) Vida sensitiva: além de nutrir-se, crescer, reproduzir-se e irritar-se,
é capaz de conhecer… Conhecer pelos sentidos orgânicos (externos e internos)
objetos concretos, materiais: esta cor, este som, este odor, este gosto, esta
temperatura, esta dureza…
3) Vida intelectiva: além de ter as propriedades vegetativas e sensitivas, é dotada de conhecimento das essências,
das noções universais, abstratas. Por exemplo, das imagens de flor bela,
paisagem bela, criança bela, melodia bela, atitude bela… deduzimos a noção
universal de BELEZA (harmonia das partes componentes do ser). Paralelamente,
chegamos à noção de JUSTIÇA, AMOR, BONDADE, HOMEM…
Por conseguinte,
distinguem-se o princípio vital vegetativo, o sensitivo e
o intelectivo. Pode-se falar também de alma vegetativa, alma sensitiva e alma intelectiva. Na linguagem
comum, porém, alma costuma
designar apenas o princípio vital humano.
A alma
vegetativa e a sensitiva são materiais,
pois as funções que elas preenchem no corpo, não ultrapassam os limites da
matéria; até mesmo o conhecimento sensitivo é o conhecimento do concreto
corpóreo,que se faz mediante os órgãos corpóreos dos sentidos.
A alma
intelectiva, porém, é espiritual, pois as
suas funções ultrapassam os limites da matéria. Pelo conhecimento intelectual a
pessoa lêdentro (intelligit,
intus legit), isto é,
abstrai do concreto, corpóreo, material… para formar um conceito imaterial:
BELEZA (não esta flor bela, nem
esta paisagem bela
concretamente), JUSTIÇA (não esta justa sentença, este justo comportamento, concretamente)…
É pelo AGIR, que
conhecemos o SER. Onde há agir imaterial, que transcende a matéria, somos
logicamente levados a concluirá existência de um princípio de agir ou de um ser
imaterial, que transcende a matéria ou, ainda, é espiritual.
2.3. Espírito
Espírito é o ser real que não tem corpo, isto é, carece
de extensão, quantidade, peso, tamanho…, mas é dotado de inteligência e vontade.
Vê-se assim que a palavra espírito tem acepção mais ampla do que o vocábulo
alma. A chave abaixo
exprime a diferença:
Espírito incriado, não unido à matéria:
Deus
criado, não unido à
matéria: anjo
criado, unido à
matéria, para nela se aperfeiçoar: alma humana (espiritual)
O espírito que é o
princípio vital do organismo humano, é chamado alma
humana intelectiva ().
Esta, portanto, é espiritual ou não
material. Se a alma humana é espiritual, também é imortal, pois a imortalidade é
propriedade de todo espírito ().
2.4. Espiritualidade da alma
humana
Para averiguar se a
alma humana é espiritual ou não, devemos levar em conta o seguinte princípio: o
ser e o agir de determinada realidade devem ser correlativos entre si.
Consequentemente, se vejo que determinada substância tem por
efeito “salgar” alimentos, digo obviamente que o seu ser consta de cloro e sódio
(NaCI); se outra substância é corrosiva,
suporei que seja um ácido, como o ácido sulfúrico (H2S04).Se, pois, desejo saber se a alma humana é espiritual ou
se é material: se verificar que as atividades da alma humana ultrapassam as
virtualidades da matéria, concluirei que o próprio ser da alma humana
é imaterialou espiritual.
Analisemos, pois, as
atividades da alma humana:
1) Percepção do universal
É certo que o ser humano,
além de conhecer os objetos concretos, singulares e materiais que lhe ocorrem, é
também capaz de conceber noções abstratas, universais, percebendo o essencial; é
apto a reconhecer proporções, relações de dependência ou causalidade e de
finalidade.
Com efeito, depois de ver
um homem, uma mulher, uma criança, um ancião, um gordo, um magro…, a
inteligência humana se emancipa das diferenças motivadas por cor, tamanho, sexo,
idade… define todos esses indivíduos como participantes da mesma essência ou
natureza; são todos seres humanos, iguais entre si pela natureza (que a
inteligência apreende), embora diferentes uns dos outros pelos aspectos que os
olhos percebem.
Paralelamente, depois de
ver diversos objetos belos (uma flor, uma paisagem, um animal, uma escultura…),
a inteligência humana se emancipa dos elementos extrínsecos e concretos que apreende, e formula a definição da
beleza. A partir da percepção de situações justas e injustas, formula as noções
universais de justiça e injustiça.
A Psicologia Experimental,
por sua vez, corrobora estas afirmações mediante a seguinte
experiência:
Disponha-se uma série de
vasilhas fechadas, na primeira das quais se coloca o alimento de um macaco. O
animal, posto diante de tal série, não sabe onde encontrar a sua ração; o
operador então abre a primeira vasilha e lhe mostra o seu
alimento.
Repita-se a experiência,
encerrando na segunda vasilha o alimento, e não na primeira. O animal,
recolocado diante da série, é guiado pela memória sensitiva e, recordando-se do
ocorrido no dia anterior, vai à primeira vasilha. O operador então o coloca
diante do segundo recipiente, do qual o animal se serve.
Num terceiro ensaio,
coloque-se o alimento fechado no terceiro recipiente: guiado pelas impressões
sensíveis do ensaio anterior, o macaco se dirige para o segundo vaso… Caso se
multipliquem as experiências, verifica-se que o animal procura de cada vez o
recipiente em que no ensaio anterior encontrou o que lhe interessava. Nunca
chega a abstrair dessas diversas
experiências a lei da progressão que as rege. Nunca se desvencilha das notas
concretas da vasilha em que, por último, encontrou a sua ração, deduzindo que
não é o fato de ser a segunda, a terceira ou a quarta vasilha que interessa, mas
o fato de ser a vasilha n + 1(fórmula em que n
designa o número da
experiência anterior). Ora uma criança sujeita a tal tese, depois de quatro ou
cinco experiências, consegue abstrair a lei n
+ 1
do fenômeno.
Destes ensaios se
conclui que o animal, por mais semelhante que seja ao homem, jamais se
desembaraça da percepção do concreto, material; ele percebe o primeiro, o
segundo, o terceiro objetos… postos à sua frente, mas é incapaz de perceber a
proporção que há entre esses objetos:
1 =
n + 1
2 =
n + 1
3 =
n + 1
4 =
n + 1
5 =
n + 1
Na coluna da
esquerda temos acima a lista dos termos concretos, particulares, ao passo que na
coluna da direita temos a fórmula universal e a indicação de proporção. Ora
passar da coluna da esquerda para a da direita, percebendo a constante
n
+ 1
por debaixo das variações
2, 3, 4, 5… é algo que só a inteligência faz, porque só esta
abstrai do concreto. O animal irracional não se eleva ao abstrato, universal. Por conseguinte, o irracional não tem princípio de
conhecimento ou princípio vital imaterial ou espiritual; a alma do macaco ou do
animal irracional é material. Ao contrário, o homem, que é capaz de abstrair do
concreto singular, possui um princípio vital ou uma alma imaterial ou
espiritual.
Observe-se também: não há transição entre o material e o
imaterial (ou espiritual). O espiritual não é a matéria rarefeita ou gasosa
energética, pois mesmo a matéria rarefeita e a energia elétrica são dimensionáveis mediante números ou estão sujeitas à quantidade, ao
passo que o espírito não é quantitativo nem comensurável.
2) A consciência de si
mesmo
Verifica-se que os animais têm conhecimento de objetos que
os cercam, ameaçando-os ou favorecendo-os. O ser humano, além deste tipo
de conhecimento, possui o conhecimento de si mesmo ou a autoconsciência; o homem
não somente sente dor, mas sabe que sente dor ou que está lesado fisicamente;
este fator aumenta enormemente a sua dor, pois o sujeito
humano percebe que a sua moléstia o impede de trabalhar devidamente, o que pode
prejudicar a sua família, a sua carreira, o
seu ideal… Possuindo o conhecimento dos objetos e de si mesmo, o homem concebe o
plano de ordenar o mundo e a si mesmo, dominando fatores estranhos ao seu ideal,
superando paixões desregradas, cultivando boas tendências, etc. Isto tudo escapa
às possibilidades de um animal irracional, pois este conhece o seu objeto
concreto, singular, e é incapaz e se emancipar das notas concretas deste e de se
voltar para si mesmo de maneira sistemática a fim de se conhecer. O ser humano,
ao contrário, realiza esta introspecção, porque o seu
princípio de conhecimento (intelecto) é capaz de ultrapassar o seu objeto
concreto, material para atingir o próprio sujeito…
3) A cultura e o progresso
Verifica-se que o homem
intervém no ambiente natural que o cerca, modificando-o de acordo com as suas
intenções e os seus planos; cria assim a cultura, que se sobrepõe à natureza,
adaptando-a ao homem; assim é que surgem casas, estradas, cidades, fábricas,
artefatos… Essa atividade científica e técnica, social e ética, artística e
religiosa, não é o produto de processos fisiológicos apenas ou de fatores
materiais e econômicos tão somente, mas se deve à ação intelectiva e
planejadora da inteligência e à liberdade de arbítrio do ser humano.
Com efeito, ao conhecer a natureza que o cerca, o homem apreende as relações
entre meios e fins ou as proporções entre diversos termos e concebe projetos
para melhorar o seu ambiente (o seu habitat natural, a sua alimentação, o seu vestuário, as
expressões de sua arte, de seus sentimentos religiosos…); vai assim construindo
civilizações sucessivas… Ora o animal é incapaz de progredir em suas expressões,
porque é guiado por instintos; assim o animal, embora certeiro e apurado em seus
movimentos instintivos, é incapaz de dar contas a si mesmo do que faz e dos
porquês da sua atividade; é, por isto, incapaz de se corrigir ou de se
ultrapassar. Em última análise, a raiz da diferença entre o comportamento do
homem e o do animal reside no fato de que o homem tem um princípio vital ou um
princípio de atividades imaterial
ou espiritual, ao passo que o animal tem
uma alma material ou confinada pelas potencialidades da
matéria.
São estas algumas reflexões
que o cristão oferece a quem se põe em busca da alma.
Observa-se uma diferença
entre intelectivo e
racional.
Intelectivo é todo ser que
conhece noções universais, distinguindo essência e
acidentes.
Racional é o ser cuja
inteligência não é intuitiva, mas progressiva, passando de premissas a
conclusões para estabelecer novas premissas e chegar a ulteriores
conclusões.
O ser humano, por exemplo, é intelectivo racional (aos poucos vai penetrando a verdade).
Deus e os anjos são intelectivos não racionais,
mas intuitivos.
Vê-se que não há
meio-termo entre matéria e
espírito ou entre corpo material e alma espiritual
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