Obra reforça posição de Bento XVI de que protestantes não são ‘igreja’ de verdade.
O texto tem três parágrafos introdutórios e cinco perguntas e respostas.
O texto tem três parágrafos introdutórios e cinco perguntas e respostas.
O Vaticano divulgou nesta terça-feira (10) um documento datado de 29 de junho último que aponta a Igreja Católica como a única a reunir todos os requisitos da comunidade fundada originalmente por Cristo e seus apóstolos.
O texto, de três parágrafos introdutórios e cinco perguntas e respostas, retoma o polêmico documento “Dominus Iesus”, de responsabilidade do então cardeal Joseph Ratzinger, divulgado no ano 2000.
Assim como o “Dominus Iesus”, o novo texto também é obra da Congregação para a Doutrina da Fé, a antiga casa do atual Papa no Vaticano e o órgão responsável pela pureza teológica do catolicismo. As perguntas e respostas são assinadas pelo atual prefeito da congregação, o cardeal americano William Levada, e por seu secretário, monsenhor Angelo Amato, e chegam com a aprovação oficial de Bento XVI.
O novo texto tem dois significados:
Em primeiro lugar, que a guerra de Bento XVI contra o relativismo continua firme. A divulgação do documento revela uma estratégia coerente do Papa para fazer da Igreja a portadora de uma referência religiosa e moral única, como guardiã da herança cristã. De acordo com esse ponto de vista, não se pode igualar todas as religiões cristãs e colocá-las no mesmo saco, sob pena de tirar dos fiéis (em especial os católicos, claro) uma noção clara e sem ambigüidades de qual é o caminho correto a seguir.
Em segundo lugar, reafirma-se a idéia de que o catolicismo é o único meio pelo qual se pode alcançar a salvação espiritual com a ajuda da fé em Jesus Cristo. Teologicamente, porém, isso não significa que os outros cristãos, ou mesmo os seguidores de religiões não-cristãs, estão automaticamente excluídos dessa salvação, mesmo que não se convertam ao catolicismo. Difícil de entender?
Em segundo lugar, reafirma-se a idéia de que o catolicismo é o único meio pelo qual se pode alcançar a salvação espiritual com a ajuda da fé em Jesus Cristo. Teologicamente, porém, isso não significa que os outros cristãos, ou mesmo os seguidores de religiões não-cristãs, estão automaticamente excluídos dessa salvação, mesmo que não se convertam ao catolicismo. Difícil de entender?
A explicação vem da idéia de “deficiência” ou “defeito” expressa pelo documento “Dominus Iesus”. A doutrina defendida por Bento XVI considera que os não-católicos teriam mais dificuldade (uma “deficiência” mais branda no caso dos cristãos, mais pesada no dos não-cristãos) para a busca do bem e da verdade que leva à salvação do homem. No entanto, se eles seguirem o caminho correto apesar disso, eles seriam, na prática, “adotados” por Cristo e pela Igreja. Resta saber se esse detalhe teológico será suficiente para evitar as reações entristecidas das igrejas protestantes, como as que se seguiram à publicação de “Dominus Iesus” no ano 2000.
O padre Augustine di Noia, subsecretário da Congregação para a Doutrina da Fé, disse que o documento não altera o compromisso com o diálogo ecumênico, mas visa a afirmar a identidade católica nessas conversas.
“A Igreja não está recuando no compromisso ecumênico”, disse Di Noia à rádio do Vaticano. “Mas, como vocês sabem, é fundamental em qualquer tipo de diálogo que os participantes sejam claros sobre sua identidade. Ou seja, o diálogo não pode ser uma ocasião para acomodar ou abrandar aquilo pelo que você realmente se entende.”
Leia o texto na íntegra:
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ
RESPOSTAS A QUESTÕES RELATIVAS A ALGUNS ASPECTOS
DA DOUTRINA SOBRE A IGREJA
DA DOUTRINA SOBRE A IGREJA
INTRODUÇÃO
É de todos conhecida a importância que teve o Concílio Vaticano II para um conhecimento mais profundo da eclesiologia católica, quer com a Constituição dogmática Lumen gentium quer com os Decretos sobre o Ecumenismo (Unitatis redintegratio) e sobre as Igrejas Orientais (Orientalium Ecclesiarum). Muito oportunamente, também os Sumos Pontífices acharam por bem aprofundar a questão, atendendo sobretudo à sua aplicação concreta: assim, Paulo VI com a Carta encíclica Ecclesiam suam (1964) e João Paulo II com a Carta encíclica Ut unum sint (1995).
O sucessivo trabalho dos teólogos, tendente a ilustrar com maior profundidade os múltiplos aspectos da eclesiosologia, levou à produção de uma vasta literatura na matéria. Mas, se o tema se revelou deveras fecundo, foi também necessário proceder a algumas chamadas de atenção e esclarecimentos, como aconteceu com a Declaração Mysterium Ecclesiae (1973), a Carta aos Bispos da Igreja Católica Communionis notio (1992) e a Declaração Dominus Iesus (2000), todas elas promulgadas pela Congregação para a Doutrina da Fé.
A complexidade estrutural do tema, bem como a novidade de muitas afirmações, continuam a alimentar a reflexão teológica, nem sempre imune de desvios geradores de dúvidas, a que esta Congregação tem prestado solícita atenção. Daí que, tendo presente a doutrina íntegra e global sobre a Igreja, entendeu ela dar com clareza a genuína interpretação de algumas afirmações eclesiológicas do Magistério, por forma a que o correcto debate teológico não seja induzido em erro, por motivos de ambiguidade.
RESPOSTAS ÀS QUESTÕES
Primeira questão: Terá o Concílio Ecuménico Vaticano II modificado a precedente doutrina sobre a Igreja?
Resposta: O Concílio Ecuménico Vaticano II não quis modificar essa doutrina nem se deve afirmar que a tenha mudado; apenas quis desenvolvê-la, aprofundá-la e expô-la com maior fecundidade.
Foi quanto João XXIII claramente afirmou no início do Concílio[1]. Paulo VI repetiu-o[2] e assim se exprimiu no acto de promulgação da Constituição Lumen gentium: “Não pode haver melhor comentário para esta promulgação do que afirmar que, com ela, a doutrina transmitida não se modifica minimamente. O que Cristo quer, também nós o queremos. O que era, manteve-se. O que a Igreja ensinou durante séculos, também nós o ensinamos. Só que o que antes era perceptível apenas a nível de vida, agora também se exprime claramente a nível de doutrina; o que até agora era objecto de reflexão, de debate e, em parte, até de controvérsia, agora tem uma formulação doutrinal segura”[3]. Também os Bispos repetidamente manifestaram e seguiram essa mesma intenção[4].
Segunda questão: Como deve entender-se a afirmação de que a Igreja de Cristo subsiste na Igreja católica?
Resposta: Cristo “constituiu sobre a terra” uma única Igreja e instituiu-a como “grupo visível e comunidade espiritual”[5], que desde a sua origem e no curso da história sempre existe e existirá, e na qual só permaneceram e permanecerão todos os elementos por Ele instituídos[6]. “Esta é a única Igreja de Cristo, que no Símbolo professamos como sendo una, santa, católica e apostólica […]. Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste na Igreja Católica, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele”[7].
Na Constituição dogmática Lumen gentium 8, subsistência é esta perene continuidade histórica e a permanência de todos os elementos instituídos por Cristo na Igreja católica[8], na qual concretamente se encontra a Igreja de Cristo sobre esta terra.
Enquanto, segundo a doutrina católica, é correcto afirmar que, nas Igrejas e nas comunidades eclesiais ainda não em plena comunhão com a Igreja católica, a Igreja de Cristo é presente e operante através dos elementos de santificação e de verdade nelas existentes[9], já a palavra “subsiste” só pode ser atribuída exclusivamente à única Igreja católica, uma vez que precisamente se refere à nota da unidade professada nos símbolos da fé (Creio… na Igreja “una”), subsistindo esta Igreja “una” na Igreja católica[10].
Terceira questão: Porque se usa a expressão “subsiste na“, e não simplesmente a forma verbal “é“?
Resposta: O uso desta expressão, que indica a plena identidade da Igreja de Cristo com a Igreja católica, não altera a doutrina sobre Igreja; encontra, todavia, a sua razão de verdade no facto de exprimir mais claramente como, fora do seu corpo, se encontram “diversos elementos de santificação e de verdade”, “que, sendo dons próprios da Igreja de Cristo, impelem para a unidade católica”[11].
“Por isso, as próprias Igrejas e Comunidades separadas, embora pensemos que têm faltas, não se pode dizer que não tenham peso ou sejam vazias de significado no mistério da salvação, já que o Espírito se não recusa a servir-se delas como de instrumentos de salvação, cujo valor deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja católica”[12].
Quarta questão: Porque é que o Concílio Ecuménico Vaticano II dá o nome de “Igrejas” às Igrejas orientais separadas da plena comunhão com a Igreja católica?
Resposta: O Concílio quis aceitar o uso tradicional do nome. “Como estas Igrejas, embora separadas, têm verdadeiros sacramentos e sobretudo, em virtude da sucessão apostólica, o Sacerdócio e a Eucaristia, por meio dos quais continuam ainda unidas a nós por estreitíssimos vínculos”[13], merecem o título de “Igrejas particulares ou locais”[14] , e são chamadas Igrejas irmãs das Igrejas particulares católicas[15].
“Por isso, pela celebração da Eucaristia do Senhor em cada uma destas Igrejas, a Igreja de Deus é edificada e cresce”[16]. Como porém a comunhão com a Igreja católica, cuja Cabeça visível é o Bispo de Roma e Sucessor de Pedro, não é um complemento extrínseco qualquer da Igreja particular, mas um dos seus princípios constitutivos internos, a condição de Igreja particular, de que gozam essas venerandas Comunidades cristãs, é de certo modo lacunosa[17].
Por outro lado, a plenitude da catolicidade própria da Igreja, governada pelo Sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele, encontra na divisão dos cristãos um obstáculo à sua realização plena na história[18].
Quinta questão: Por que razão os textos do Concílio e do subsequente Magistério não atribuem o título de “Igreja” às comunidades cristãs nascidas da Reforma do século XVI?
Resposta: Porque, segundo a doutrina católica, tais comunidades não têm a sucessão apostólica no sacramento da Ordem e, por isso, estão privadas de um elemento essencial constitutivo da Igreja. Ditas comunidades eclesiais que, sobretudo pela falta do sacerdócio sacramental, não conservam a genuína e íntegra substância do Mistério eucarístico[19], não podem, segundo a doutrina católica, ser chamadas “Igrejas” em sentido próprio[20].
O Santo Padre Bento XVI, na Audiência concedida ao abaixo-assinado Cardeal Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, ratificou e confirmou estas Respostas, decididas na Sessão ordinária desta Congregação, mandando que sejam publicadas.
William Cardeal Levada
Prefeito
Prefeito
Angelo Amato, SDB,
Arcebispo tit. de Sila
Arcebispo tit. de Sila
reporterdecristo.com
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