domingo, 6 de agosto de 2023

Festa da Transfiguração do Senhor.

 Por causa de um certo Reino: REFLEXÃO PARA A FESTA DA TRANSFIGURAÇÃO DO  SENHOR (MATEUS 17,1-9)

 O Espírito Santo apareceu na nuvem luminosa, e a voz do Pai se fez ouvir: Este é o meu Filho amado, nele depositei todo o meu amor. Escutai-o (Mt 17,5).

No monte Tabor, Jesus se manifesta aos discípulos em todo o esplendor de sua vida divina, antecipando a glória de sua ressurreição. Nesta festa, somos convidados a nos deixarmos alcançar pela face luminosa do Filho amado de Deus, a ouvir sua voz e seguir seus passos. Na primeira semana deste mês vocacional, recordamos a vocação para o ministério ordenado: diáconos, padres e bispos. Celebremos em gratidão pelo nosso pároco e por todos os padres, neste seu dia, tendo presente também a Jornada Mundial da Juventude, que se encerra hoje em Portugal.

Primeira Leitura: Daniel 7,9-10.13-14

Leitura da profecia de Daniel 9Eu continuava olhando até que foram colocados uns tronos, e um ancião de muitos dias aí tomou lugar. Sua veste era branca como neve e os cabelos da cabeça, como lã pura; seu trono eram chamas de fogo, e as rodas do trono, como fogo em brasa. 10Derramava-se aí um rio de fogo que nascia diante dele; serviam-no milhares de milhares, e milhões de milhões assistiam-no ao trono; foi instalado o tribunal e os livros foram abertos. 13Continuei insistindo na visão noturna, e eis que, entre as nuvens do céu, vinha um como filho de homem, aproximando-se do ancião de muitos dias, e foi conduzido à sua presença. 14Foram-lhe dados poder, glória e realeza, e todos os povos, nações e línguas o serviam: seu poder é um poder eterno que não lhe será tirado, e seu reino, um reino que não se dissolverá. – Palavra do Senhor.

Salmo Responsorial: 96(97)

Deus é rei, é o Altíssimo, / muito acima do universo.

1. Deus é rei! Exulte a terra de alegria, / e as ilhas numerosas rejubilem! / Treva e nuvem o rodeiam no seu trono, / que se apoia na justiça e no direito. – R.

2. As montanhas se derretem como cera / ante a face do Senhor de toda a terra; / e assim proclama o céu sua justiça, / todos os povos podem ver a sua glória. – R.

3. Porque vós sois o Altíssimo, Senhor, † muito acima do universo que criastes, / e de muito superais todos os deuses. – R.

Segunda Leitura: 2 Pedro 1,16-19

Leitura da segunda carta de São Pedro – Caríssimos, 16não foi seguindo fábulas habilmente inventadas que vos demos a conhecer o poder e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, mas, sim, por termos sido testemunhas oculares da sua majestade. 17Efetivamente, ele recebeu honra e glória da parte de Deus Pai, quando do seio da esplêndida glória se fez ouvir aquela voz que dizia: “Este é o meu Filho bem-amado, no qual ponho o meu benquerer”. 18Esta voz, nós a ouvimos, vinda do céu, quando estávamos com ele no monte santo. 19E assim se nos tornou ainda mais firme a palavra da profecia, que fazeis bem em ter diante dos olhos, como lâmpada que brilha em lugar escuro, até clarear o dia e levantar-se a estrela da manhã em vossos corações. – Palavra do Senhor.

Evangelho: Mateus 17,1-9

Aleluia, aleluia, aleluia.

Eis meu Filho muito amado, nele está meu benquerer, / escutai-o, todos vós! (Mt 17,5). – R.

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus – Naquele tempo, 1Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. 2E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. 3Nisto apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus. 4Então Pedro tomou a palavra e disse: “Senhor, é bom ficarmos aqui. Se queres, vou fazer aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”. 5Pedro ainda estava falando quando uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra. E da nuvem uma voz dizia: “Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo meu agrado. Escutai-o!” 6Quando ouviram isso, os discípulos ficaram muito assustados e caíram com o rosto em terra. 7Jesus se aproximou, tocou neles e disse: “Levantai-vos e não tenhais medo”. 8Os discípulos ergueram os olhos e não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus. 9Quando desciam da montanha, Jesus ordenou-lhes: “Não conteis a ninguém esta visão até que o Filho do homem tenha ressuscitado dos mortos”. – Palavra da salvação.

Reflexão

 Circunstâncias (Mt 17, 1; Mc 9, 2; Lc 9, 28). — V. 1. Seis dias depois do colóquio com os discípulos em Cesaréia de Filipe, Jesus tomou consigo a Pedro, Tiago e João, seu irmão, os mesmos que admitira como testemunhas da ressurreição da filha de Jairo (cf. Mc 5, 37; Lc 8, 51) e havia de admitir na agonia do Horto (cf. Mt 26, 37). Quanto ao número de dias, estão de acordo Mateus e Marcos, mas Lucas escreve: Passados uns oito dias, o que alguns explicam dizendo que o evangelista numera o termo a quo e o termo ad quem, enquanto os outros não. Talvez o mais adequado seja dizer, com Maldonado, que Lucas não indica o tempo de maneira precisa, mas confusa, e por isso diz “uns”, isto é, “cerca de”.

E os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha, para que Ele se entregasse à oração e eles contemplassem a sua glória. Muito disputam os autores sobre o monte em que se deram estes acontecimentos. — a) Uma antiga tradição, de que são testemunhas Orígenes (cf. In Ps. 88, 13: PL 12, 1547), S. Cirilo de Jerusalém (cf. Catech. 12, 16: PL 33, 744), S. Jerônimo (Epist. 46, 12 e 108, 13: PL 22, 491) etc., afirma que se trata do monte Tabor (hoje Djebel el-Tor, a 321m acima da planície circundante e 615m acima do Mar Mediterrâneo), opinião defendida ainda hoje por bons autores [1]. — b) Há no entanto quem rejeite esta tradição como infundada e opine que o monte da Transfiguração foi algum cômoro do Antilíbano ou, mais provavelmente, o grande Hérmon (hoje Djebel el-Sheikh) [2]. As principais razões em que se baseia esta sentença são: 1.ª) segundo Políbio (Hist. V 70, 6), no tempo de Antíoco, o Grande, em 218 a.C., no sopé do monte Tabor (Itabyrium ou Atabyrium) havia uma cidade, que Antíoco conquistara e fortificara. Embora não seja certo que ela ainda existisse no tempo de Cristo, Flávio Josefo (cf. Bell. jud. IV 1, 8) afirma que, no ano 67 d.C., havia ali uma planície amuralhada e habitantes que “não tinham outra água além da chuva”. Isso porém não parece concordar com a narração evangélica, que supõe um lugar deserto. 2.ª) Os evangelistas situam o fato da Transfiguração imediatamente após o colóquio em Cesaréia de Filipe, sem fazer menção alguma a um possível retorno à Galiléia; sinal, portanto, de que tanto uma coisa com outra aconteceram na mesma região.

Resposta: Estas razões não têm peso suficiente para obrigar-nos a rejeitar a tradição. Com efeito, à 1.ª pode-se muito bem responder que Flávio Josefo, na obra citada e em sua Vita, não chama ao Tabor nem “cidade” nem “aldeia”, nomes com que designa, nas mesmas passagens, outros locais habitados, mas “monte”. Além disso, não seria de estranhar que, em tempos de rebelião, os habitantes daquela zona o tenham-se refugiado no topo do monte, nas ruínas de uma antiga cidade. A melhor resposta à 2.ª é que Cristo e seus discípulos poderiam, sem nenhum dificuldade, ter percorrido o caminho de volta num espaço de seis dias; de fato, os próprios evangelistas parecem supor que Cristo estava retornando à Galiléia, já que o descrevem, ao descer do monte, rodeado de turbas e escribas (cf. Mt 17, 14; Mc 9, 14; Lc 9, 37) e, ao sair dali, já percorrendo a Galileia (cf. Mt 17, 21; Mc 9, 28).

2. Cristo se transfigura (cf. Mt 17, 2-9; Mc 9, 3-9; Lc 9, 29-36). — V. 2. E foi transfigurado (μετεμορφώθη) diante deles (Lucas diz: Enquanto orava, transformou-se o seu rosto); como tenha sido essa transmutação, declara-se logo em seguida: O seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como neve (em grego, ὡς τὸ φῶς: como luz), isto é, apareceu envolto de claridade celeste. — É mais vívida a descrição de Marcos: Suas vestes tornaram-se resplandecentes e de uma brancura tal, que nenhum lavadeiro sobre a terra as pode fazer assim tão brancas.

V. 3. Nisto apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus. Lucas acrescenta: Que apareceram envoltos em glória, e falavam da morte dele (τὴν ἔξοδον αὐτοῦ), isto é, do êxodo ou partida dele deste mundo, pela morte, ressurreição e ascensão, que se havia de cumprir em Jerusalém, isto é, falavam da morte de Cristo como fim e complemento da Lei e dos Profetas. “Por Moisés é significada a Lei, por Elias são significados os Profetas, pelo Senhor é significado o Evangelho: Cristo apareceu, pois, entre Moisés e Elias, como se o Evangelho fôra confirmado pela Lei e os Profetas” (S. Agostinho, In Joan., tract. XVII, 3). Lucas complementa a narração: Entretanto, Pedro e seus companheiros tinham-se deixado vencer pelo sono (donde talvez se possa inferir que tudo sucedera à noite); ao despertarem (διαγρηγορήσαντες, isto é, resistindo ainda ao sono, ou acordados do sono), viram a glória de Jesus e os dois personagens em sua companhia.

V. 4. Então Pedro, sem saber o que dizia (cf. Lc 9, 33), isto é, fora de si por causa de grande alegria, tomou a palavra e disse: Senhor, é bom, isto é, grato e prazeroso, ficarmos aqui. Se queres, vamos fazer (em grego, ποιήσω: vou fazer) aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés, e outra para Elias, para nos deliciarmos sem cessar com este espetáculo, ou para que ponhas neste monte, com Moisés e Elias, o trono de tua glória. De resto, com efeito, não seria difícil construir as tendas com ramos de terebinto e carvalho, abundantes no monte Tabor. — Nota S. Marcos que os Apóstolos estavam sobremaneira atemorizados, isto é, com aquela reverência e aquele pavor de que são tomados os homens ao verem coisas extraordinárias. Tal pavor, contudo, não excluía a alegria e o gozo.

V. 5. Pedro ainda estava falando, quando uma nuvem luminosa, sinal e símbolo da presença divina (cf. Ex 16, 10; 19, 9.16 etc.), os cobriu, a saber: a Jesus, Moisés e Elias, tirando-os da vista dos Apóstolos, com sua sombra; e da nuvem uma voz dizia: Este é o meu Filho amado [3], no qual eu pus todo meu agrado. Escutai-o, isto é, obedecei-lhe como Legislador e crede nele como Mestre.

V. 6-8. Aterrorizados pela aparição da nuvem e pelo som da voz celeste, caíram os Apóstolos com o rosto em terra, até que Jesus se aproximasse e os tocasse com a mão, como também nós fazemos quando desejamos acordar alguém sonolento. Tendo os discípulos voltado a si, desapareceu a visão celeste e, olhando eles logo em derredor, já não viram ninguém, senão só a Jesus com eles. Os Apóstolos então ergueram os olhos e não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus.

V. 9. Ao descerem do monte, Jesus lhes ordenou que não contassem a ninguém, provavelmente nem aos demais Apóstolos, o que viram antes da Ressurreição: até que o Filho do Homem tenha ressuscitado dos mortos. A proibição de divulgar este fato tem o mesmo motivo que outras ordens semelhantes de Cristo após a realização de um milagre, isto é, para não acirrar ainda mais o ânimo de seus inimigos e evitar que o povo o procure mais pelo desejo de ver maravilhas que pela doutrina da salvação.

Marcos nota que os discípulos não entenderam o que queria dizer: ser ressuscitado dentre os mortos.

Reflexão. — 1) Por que Cristo quis transfigurar-se? a) Para corroborar em nós a fé na Ressurreição. b) Para erguer e confirmar nossa esperança. c) Para acender em nós o fogo da caridade divina. d) Para consolar com a luz da glória a sua Igreja, peregrina pelas trevas do mundo. e) Para mostrar-nos quem de fato Ele é: Deus encarnado. f) Para dar ao seu Corpo místico ocasião de festa e alegria espirituais, muito distintas dos excessos e bacanais do mundo. — 2) As quatro transfigurações do homem: a) a desfiguração, do estado de graça para o de pecado; b) a recriação, do estado de pecado para o de graça; c) a condenação, dos prazeres do mundo para os suplícios da geena; d) e a glorificação, das misérias desta vida para o descanso da pátria celeste [4].

Referências

  1. Na Igreja grega, a festa da Transfiguração (6 de ago.) é conhecida como τὸ θαβώριον.
  2. Assim pensavam Calmet, Patrizi, Fillion, Le Camus, Plummer etc.
  3. Cristo é Filho de Deus não somente κατ’ εξοχήν, isto é, por excelência ou mais do que os outros (pela plenitude infinita da graça habitual), mas também por ser Filho único, unigênito, por consubstancialidade, como sempre entendeu a Tradição e claramente se deduz da aposição de “amado” (dilectus, ὁ ἀγαπητός = caríssimo, termo com que a Septuaginta frequentemente traduz o hebraico יָחִיד, “único” (cf. Gn 22, 2.12.16; Jr 6, 26; Am 8, 10; Zc 12, 10; Pr 4, 3); é, portanto, Filho natural, eterno, único, coigual.
  4. Esta homilia é uma tradução levemente adaptada de H. Simón, Prælectiones Biblicæ. Novum Testamentum. 4.ª ed., iterum recognita a J. Prado. Marietti, 1930, vol. 1, pp. 403–405, n. 280–281.

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