As exigências do cristianismo não toleram a pusilanimidade nem a barganha com o depósito da fé
Quando o então Cardeal Joseph Ratzinger, num debate com o filósofo
ateu Paolo Flores D'arcais, em 2000, mencionou a palavra tolerância numa
explicação, não pôde deixar de notar o espanto da plateia e, até mesmo,
do mediador do encontro. Reação previsível, se se levar em consideração
a imagem negativa imputada ao futuro Bento XVI, devido ao seu trabalho
na Congregação para Doutrina da Fé. É certo que, nos dias de
hoje, em que a falsa tolerância foi elevada à categoria de virtude
cardeal, qualquer movimento que sugira uma repreensão motivada por um
erro é, apressadamente, tachado de intolerante. Daí a fama de cardealpanzer de Bento XVI que, como "colaborador da Verdade", tinha consciência do seu dever de debelar o erro. A
tolerância a qualquer custo é uma doença da mentalidade moderna, na
qual conta mais uma pseudo harmonia e comunhão do que a verdade. E nesta
seara, infelizmente, também se inserem muitos católicos.
Essa dificuldade nasce, sobretudo, da falta de clareza com que se
tratam assuntos de delicada importância, incluindo a religião. Em nome
do bem-estar e da paz, prefere-se adotar uma posição moderada, sem
"paixões", como declaram alguns, mesmo que isso custe um alto preço.
Ora, a tolerância só tem sentido dentro de um contexto de amor à verdade
e à justiça, não de pusilanimidade. Não é à toa que as casas de
prostituição são popularmente conhecidas como casas de tolerância.
Quando se coloca a tolerância como regra suprema do bem, não é estranho
que apareçam na história câmaras de gás, gulags e paredões. Ou então,
mais condizente com o momento atual, clínicas de aborto e embriões
congelados para pesquisa.
Deve-se separar pecado e pecador, ser tolerante com a pessoa, mas
nunca com o mal. E, em certos casos, a tolerância exige, sim, uma justa
pena, pois a disciplina também é uma forma nobre de amar. Se é verdade
que Cristo mandou deixar que cresçam juntos joio e trigo, também não é
menos verdade que ele tenha pego num chicote para expulsar os vendilhões
do templo. No itinerário do amor cristão também está o zelo pelo bem
integral - físico, moral e espiritual - do irmão que, muitas vezes,
passa pela correção fraterna. Todavia, denunciou Bento XVI na sua
mensagem para Quaresma de 2012, "parece que a cultura
contemporânea perdeu o sentido do bem e do mal, sendo necessário
reafirmar com vigor que o bem existe e vence, porque Deus é «bom e faz o
bem» (Sl 119/118, 68)".
O respeito humano que impera em muitos ambientes católicos é um dos
principais motivos da apostasia na Igreja. Uma vez que se abandona o
sentido autêntico da fé, perde-se também a noção de bem e mal e, em
última instância, a noção de verdade. Esse é o mal da propalada
tolerância. Em termos mais duros, dizia o escritor Gustavo Corção sobre o
esfriamento dos católicos no Brasil, "na consideração das causas o
número um, a triste primazia, deve ser dada ao catolicismo liberal, ao
catolicismo complacente, ao catolicismo tolerante, ao catolicismo que
traz a Igreja a moleza, a falta de caráter, a esperteza, que são os
vícios de nossas virtudes, o modo brasileiro de deteriorar o que seria
bondade e magnanimidade se lograsse retificação e purificação". Como
remédio, aconselhava Corção, "nós, aqui no Brasil, precisamos
aprender a dura e viril arte de não transigir(...) E para isso temos de
lutar em duas grandes frentes: na formação moral, e na difusão da
Doutrina".
Não é católico quem não professa o credo dos apóstolos. O coração do
fiel deve ser universal o suficiente para acolher todo o depósito da fé
e, com ele, todas a suas exigências. E isso requer intolerância. Sim, a
intolerância para dizer não aos pruridos de novidades que afastam da sã
doutrina, para dizer não à ditadura do relativismo. A santa
intrasigência dos mártires para responder sim ao que é sim, e não ao que
é não. A ousadia para respeitar a liberdade do outro, sem, contudo,
fazer descontos em questões não negociáveis. Em suma, ser intolerante o
suficiente para remar contra a maré de mentiras e falsas promessas, como
pediu o Papa Francisco aos jovens da JMJ-Rio 2013, e buscar em Cristo a
única e verdadeira felicidade, “em que se revela a origem e a
consumação da história” (Cf. Lumen Fidei, 35).
Por: Equipe Christo Nihil Praeponere
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