Algumas
pessoas, às vezes até teólogos, muito enganados, querem fazer da Igreja
Católica uma democracia como as demais. Um exemplo disso partiu de
alguns católicos austríacos que publicaram em 1998 o Manifesto “Nós
somos Igreja”. O Manifesto pedia mudanças na disciplina da Igreja, a
abolição do celibato sacerdotal, a ordenação de mulheres, e outras
coisas.
Em 20/11/98 em um discurso aos bispos da Áustria no Vaticano, São João Paulo II explicou com clareza que:
“Sobre a Verdade Revelada nenhuma «base»
pode decidir. A verdade não é o produto de uma «Igreja que vem de
baixo», mas um dom que vem «do alto», de Deus. A verdade não é uma
criação humana, mas dom do céu. O próprio Senhor a confiou a nós,
sucessores dos Apóstolos, a fim de que – revestidos de «um carisma da
verdade» (Dei Verbum, 8) – a transmitamos integralmente, a conservemos
com zelo e a exponhamos com fidelidade (cf. Lumen gentium, 25)”.
A Igreja não pode ser considerada como
uma democracia igual às outras e “as bases” não podem decidir através da
maioria ou de pesquisa de opinião, porque a verdade Revelada, confiada à
Igreja, é um dom do Alto confiado à hierarquia, e não nascida do povo.
Em outras palavras, a Igreja veio do Pai, através do Filho, guiada,
assistida e conduzida pelo Espírito Santo. O povo não pode tomar o lugar
de Deus na Igreja; por isso não tem sentido a tão propagada “Igreja
Popular”.
Aliás, sobre isso, é interessantíssimo
ler o livro com esse título, de D. Boaventura Kloppenburg, grande bispo
emérito de Novo Hamburgo no RS, falecido em 2009, que teve grande
participação no Concílio Vaticano II.
A Igreja não é uma república
democrática; “é um mistério”; um sacramento, através do qual Cristo
“toca”, pelos sacramentos, cada ser humano para salvá-lo. “Para o
Concílio o mistério da Igreja consiste no fato que, através de Cristo,
nós temos acesso ao Pai num só Espírito, para participarmos assim da
mesma natureza divina (cf. Lumen gentium, 3-4; Dei Verbum, 1)”, disse o
Papa.
Falando aos bispos da Áustria, ele se
referiu a alguns pontos especiais, disse por exemplo: “mesmo se a maior
parte da sociedade decidisse diferentemente, a dignidade de cada ser
humano continua inviolável desde o início da vida no seio materno até
seu fim natural, desejado por Deus”. E ainda: apesar das contínuas
manifestações, como se se tratasse de uma questão disciplinar, “a Igreja
não recebeu do Senhor a autoridade de conferir a ordenação sacerdotal
às mulheres”. O Papa já tinha declarado isso na Carta Apostólica
Ordinatio Sacerdotalis (22 maio 1994). Eis o que disse:
“Para que seja excluída qualquer dúvida
em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição da
Igreja divina, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cf.
Lc 22, 32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de
conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve
ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja”.
Outro aspecto que o Papa abordou com os bispos da Áustria foi a questão mal interpretada do “Povo de Deus”. Disse:
“A expressão bíblica “povo de Deus”
(Iaós tou Theou) foi entendida no sentido de um povo estruturado
politicamente (demos) de acordo com as normas válidas para todas as
sociedades. E, como a forma de regime mais próxima da sensibilidade
atual é a democracia, difundiu-se entre um certo número de fieis a
exigência de uma democratização da Igreja. Vozes neste sentido se
multiplicaram também em seu país, como além de suas fronteiras”.
Neste discurso o Papa lembra que há dois
vocábulos gregos para designar “povo”, “laós” e “démos”. Todavia os
escritos do Novo Testamento usam exclusiva o termo “laós” quando
descrevem o povo santo de Deus. De “laós” deriva-se o adjetivo “lailós”,
leigo, membro do povo santo de Deus, povo santo que corresponde à
“qahal” do Antigo Testamento. Esse povo santo tem sua organização
hierárquica instituída pelo próprio Deus, diferente da constituição
democrática do “demos” ou do povo civil (D. Estevão Bettencourt).
Assim, a Igreja não é nem república nem
monarquia; é “um mistério”, um sacramento, uma realidade divino-humana,
que tem seu princípio de autoridade em Jesus Cristo, e não no povo.
Se a Igreja tivesse nascida do povo e
fosse mantida por ele, já teria sucumbido há muito tempo como os reinos
que passaram pela terra. A Igreja é infalível (cf. Cat. §891/2) e
invencível (cf. Mt 16,18) é porque é divina. Cristo se faz representar
por ministros que Ele escolhe, tendo à frente o sucessor de Pedro, o
Papa. Entretanto, o Papa governa a Igreja com o colegiado dos Bispos,
mas isso não quer dizer nem de longe que a Igreja seja uma mera
democracia. É muito mais, é transcendente, por isso não é entendida
pelos homens e mulheres mundanos, que a querem “adaptada aos modismos”.
A Igreja usa o voto para decidir muitas
coisas, inclusive a eleição do Papa, e muitas outras decisões
importantes, mas nada que se refere à Revelação; às verdades básicas da
fé, pode ser decidido no voto do clero ou do povo. O nosso Credo tem
dois mil anos e jamais será modificado, porque foi Revelado por Deus e
não inventado pelo povo. Se dependesse do voto do povo já teria sido
despedaçado e sumido.
Da mesma forma o ministério dos Bispos e
presbíteros não dispensa a participação dos leigos, ao contrário, cada
vez a valoriza mais, como fez o Concilio Vaticano II (cf. L G nº 32);
mas o governo da Igreja é diferente dos governos civis, o poder sagrado
vem de Jesus Cristo e não do povo. A visão de fé da Igreja supera as
normas de qualquer república democrática moderna; a colegialidade que
Cristo desejou para a Igreja transcende os esquemas humanos. E isso é a
garantia da Igreja ser infalível (em fé e em moral) e invencível. Se ela
fosse conduzida pelo povo as Promessas do Senhor não poderiam ser
cumpridas.
Na Igreja o Papa exerce o poder supremo e
incontestável porque isso é vontade de Cristo. A Pedro Ele disse: “tudo
o que você ligar na terra eu ligo no céu” (Mt 16,19) e lhe deu “as
chaves” da Igreja, “germe do Reino de Deus” (LG 4). Da mesma forma disse
aos Apóstolos: “tudo o que vocês ligarem na terra eu ligo no céu” (Mt
18,18). E mais: “quem vos ouve a mim ouve, quem vos rejeita a mim
rejeita, e quem me rejeita, rejeita Aquele que me enviou” (Lc10,16). E
os enviou em seu Nome: Ide!
Esta é a lógica de Deus para a salvação
do mundo: O Pai enviou o Filho, e o Filho enviou a Igreja. A Igreja vem
do Alto e não de baixo, como querem alguns. Isto seria a sua total
ruína. Aos bispos da Áustria o Papa disse em 1998:
“Ao
Sucessor de Pedro foi confiada a missão de confirmar na fé os seus
irmãos (cf. Lc 22, 32) e de ser, na Igreja, «o princípio e o fundamento
perpétuo e visível da unidade de fé e comunhão» (LG, 18), pela qual,
aliás, todos os Bispos, juntamente com ele, são a modo próprio
responsáveis”.
“Uma Igreja concebida exclusivamente
como comunidade humana não seria capaz de encontrar respostas adequadas à
aspiração humana e a uma comunhão capaz de sustentar e dar sentido à
vida. As suas palavras e ações não poderiam resistir diante da gravidade
das questões que pesam sobre os corações humanos”. “A Igreja como
mistério consola-nos e, ao mesmo tempo, encoraja-nos. Ela transcende-nos
e, como tal, pode tornar-se embaixadora de Deus”. “Ai da Igreja se
estivesse muito empenhada nas questões temporais, e não encontrasse o
tempo para se ocupar das temáticas que se referem ao eterno!”
Graças a Deus a Igreja nasceu de Deus e é
por Ele mantida; não queiramos mudar isso. O Catecismo diz que “A
Igreja é um projeto nascido no coração do Pai” (§758).
Prof. Felipe Aquino
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