“O
tempo para procurar Deus é esta vida. O tempo para encontrar Deus é a
morte. O tempo para desfrutar Deus é a eternidade”. São Francisco de
Sales
O Livro da Sabedoria diz que “Deus não é o
autor da morte nem se alegra na perda dos viventes. Pois Ele criou todas
as coisas para a existência” (Sb 1,13-14).
Esta é uma pergunta
que muitos fazem: Por que Deus não criou um mundo perfeito? Por que
permitiu o pecado acontecer e a morte entrar na história humana?
Não
podemos duvidar da grandeza, bondade e sabedoria de Deus em seus santos
desígnios. Se Ele permitiu que o pecado original acontecesse, e a morte
entrasse na história da humanidade, é porque tinha algo **ainda melhor e
mais belo para o homem**, segundo nos ensinam os sábios, doutos e
santos doutores da Igreja.
São
Leão Magno, doutor da Igreja (†460), e Santo Tomás de Aquino, também
doutor (†1274) respondem por que Deus não impediu o primeiro homem de
pecar.
São Leão Magno: “A graça inefável de Cristo deu-nos bens
melhores do que aqueles que a inveja do demônio nos havia subtraído”
(Sermão 73,4).
Santo Tomás de Aquino: “Nada obsta a que a natureza
humana tenha sido destinada a **um fim mais elevado** após o pecado.
Com efeito, Deus permite que os males aconteçam para tirar deles um bem
maior. Donde a palavra de São Paulo: ‘Onde abundou o pecado superabundou
a graça’ (Rm 5,20). E o canto do Exultet: ‘Ó feliz culpa, que mereceu
tal e tão grande Redentor’” (S.Th. III, 1, 3, ad 3), (CIC §412). Não
podemos duvidar de Deus.
O Catecismo responde por que Deus não criou um mundo perfeito:
“Segundo
seu poder infinito, Deus sempre poderia criar algo melhor (Santo Tomás,
S. Th. 1.25.6). Todavia, em sua sabedoria e bondade infinitas, Deus
quis livremente criar um mundo **em estado de caminhada** para sua
perfeição última […] Juntamente com o bem físico existe, portanto, o mal
físico, enquanto a criação não houver atingido sua perfeição” (Santo
Tomás, Suma Contra os Gentios, III,I).
Para que os anjos e os
homens pudessem ser “imagem e semelhança de Deus”, necessariamente
tinham que ser criados livres, **podendo até rejeitar o próprio Deus**.
Santo Agostinho explica bem o **mistério da liberdade humana** e do
pecado que gera a morte:
“Os anjos e os homens, criaturas
inteligentes e livres, devem caminhar para seu destino último por
**opção livre e amor preferencial**. Podem, no entanto, desviar-se. E,
de fato, pecaram. Foi assim que o mal moral entrou no mundo,
incomensuravelmente mais grave do que o mal físico. Deus não é de modo
algum, nem direta nem indiretamente, a causa do mal moral (**O livre
Arbítrio**, I,1.2). Todavia, permite-o, respeitando a liberdade de sua
criatura e, misteriosamente, sabe auferir dele o bem: ‘Pois o Deus
Todo-Poderoso […], por ser soberanamente bom, nunca deixaria qualquer
mal existir em suas obras se não fosse bastante poderoso e bom para
fazer resultar o bem do próprio mal’” (Enchiridion 3,11).
Deus deu
a Adão o dom preternatural da **ciência infusa:** as luzes necessárias
no plano religioso e moral para que agisse corretamente como o Patriarca
da humanidade; por isso Deus não foi injusto com ele após o pecado.
Alguém pode perguntar: Deus Pai sabia que Adão seria infiel, tornando
infelizes todos os seus descendentes? Por que colocou tanta
responsabilidade sobre Adão?
Deus é onisciente e conhecia a
desobediência de Adão antes de acontecer; mas Deus não a provocou. O
fato de Deus ser onisciente não anula a nossa liberdade de decidir e de
agir. Para impedir que Adão pecasse, o Criador teria que retirar dele o
livre arbítrio que havia lhe dado como a sua **mais importante e
essencial característica humana**, fazendo-o sua “imagem e semelhança”.
Se Deus retirasse de Adão a liberdade de escolha ele o tornaria indigno,
**uma marionete** de Deus, um mero **robô teleguiado**, um animal
irracional. Deus não quis isso para o homem.
Mas Deus sabia como
remediar o erro de sua amada criatura, usando de maior sabedoria e
bondade. Ele usaria o próprio erro de Adão para derramar **maior amor e
maior bondade** sobre a humanidade. Deus não faz o que achamos que Ele
deveria fazer, porque **Ele faz algo muito mais sábio e grandioso**,
embora a gente não compreenda, e possa parecer-nos até injusto. Deus
quis “respeitar até o fim a liberdade do homem”, mas soube servir-se da
própria ruína do homem para beneficiá-lo ainda mais. “Ó feliz culpa que
nos deu um tão grande Redentor”. Deus se fez homem; pode haver honra e
glória maior para nós?
Se Deus permitiu o pecado de Adão, não é
somente porque saberia dar-lhe um remédio posteriormente, mas também
porque previa a **glória de Cristo Redentor**, que supera em muito a
miséria da catástrofe humana inicial. Na sua onipotência e amor, Deus
saberia recompensar a miséria do pecado de Adão. Enfim, Deus não teria
permitido o pecado original se **no mesmo instante divino e eterno** não
tivesse previsto a Redenção. E uma Redenção que custou a vida do Seu
Filho único!…
Cristo veio ao mundo como Instaurador de uma ordem
de coisas ainda mais maravilhosa do que a inicial; não veio apenas para
restabelecer o homem no estado donde decaíra, mas para elevá-la a um
destino **mais sublime**. Por isso a Liturgia reza:
“Ó Deus,
admirável na criação do ser humano, e mais ainda na sua redenção,
dai-nos a sabedoria de resistir ao pecado e chegar à eterna alegria, por
NSJC” (Oração da coleta da Vigília Pascal).
“Senhor Pai Santo
[…]. No momento em que Vosso Filho assume nossa fraqueza, a natureza
humana recebe uma incomparável dignidade: ao tornar-se ele um de nós,
nós nos tornamos eternos” (Prefácio da Oração Eucarística do Natal III).
“Quando
Cristo se manifestou em nossa carne mortal, vós nos recriastes na luz
eterna de sua divindade” (Prefácio da Oração Eucarística da Epifania).
A
conclusão da Teologia sobre tudo isso é que o Paraíso conquistado por
Cristo para os que o amarem, **será ainda melhor** que o Paraíso
inicial.
O Papa João Paulo II falou sobre isso em suas Catequeses.
Ele explica-nos que, para Deus, **garantir a liberdade humana, é mais
importante que correr o risco de ver o homem errar**. Sem a liberdade o
homem não seria humano; se errar, Deus sabe consertar o seu erro.
“A
palavra de Deus afirma de forma clara e peremptória que ‘a maldade não
triunfa contra a sabedoria de Deus’ (Sb 7,30) e que Deus **permite o mal
no mundo com fins mais elevados**, mas não quer esse mal… No plano
eterno de Deus e em sua ação providencial na história do homem, todo
mal, e de forma especial o mal moral – o pecado – é submetido ao bem da
redenção e da salvação precisamente mediante a cruz e a ressurreição de
Cristo. Pode-se afirmar que, Nele, Deus tira o bem do mal. O tira em
certo sentido, do mesmo mal que supõe o pecado, que foi a causa do
sofrimento do Cordeiro imaculado e de sua terrível morte na cruz como
vítima inocente pelos pecados do mundo. A liturgia da Igreja não duvida
em falar, neste sentido, da ‘felix culpa’” (cf. Exultet da Liturgia da
Vigília Pascal – Catequese, 11 de junho de 1986, n. 1).
O Papa
João Paulo II deixou-nos uma página magistral sobre a questão do
sofrimento implantado no mundo pelo pecado; pode ser lido no livro
**Cruzando o limiar da esperança** (pp. 71-73). Você pode ler também sua
Carta Apostólica **Salvifici Doloris** (11 de fevereiro de 1984).
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