Não
é a primeira vez que um sistema político imoral tenta impor-se sobre os
cristãos e obrigá-los ao silêncio em relação à homossexualidade. Os
mártires de Uganda, ainda no século XIX, foram as primeiras vítimas de
uma “ditadura gay”.
Os primeiros missionários cristãos a pisarem no atual território de
Uganda eram protestantes. Em 1877, eles foram acolhidos por Mutesa, o
monarca de "Buganda" – como então era chamado o reino –, ficando livres
para expandir a fé cristã em meio à população. A tolerância do Rei era
tanta, que os missionários podiam pregar Jesus Cristo entre os próprios
membros da sua corte. Mutesa mesmo, no entanto, não estava disposto a
abandonar a poligamia – nem a circuncidar-se, como pedia o Islã. Apesar
de aberto à pregação de todas as religiões, ele ficaria sem escolher
nenhuma.
Dois anos mais tarde, em 1879, era a vez dos católicos serem acolhidos
em seu reino: os Missionários da África – ou "Padres Brancos", como eram
denominados – também passaram a evangelizar Uganda.
Em suas bocas, estava o discurso inflamado contra as práticas pagãs e supersticiosas dos nativos africanos.
Os missionários da época não sacrificavam a fé no altar do "politicamente correto".
Aderir a Cristo significava uma ruptura total com o antigo modo de
vida, uma completa mudança de mentalidade e de comportamento. Ao aderir
àquela "religião estrangeira", os abasomi – como eram chamados
os convertidos à fé cristã – não só abandonavam as velhas tradições de
suas tribos, como eram considerados "rebeldes" por seus compatriotas.
O martírio de José Mukasa
Um desses conversos, o seminarista católico José Mukasa, era
particularmente importante para a evangelização em Buganda. Amigo
pessoal tanto de Mutesa quanto de seu filho Mwanga, Mukasa tinha levado a
fé a muitos dos jovens pajens que trabalhavam na corte real. A sua
posição de influência junto do Rei confirmava ainda mais a sua liderança
e eram muitos os que se faziam católicos graças à sua pregação.
No entanto, aproximava-se o dia em que o mordomo real teria de escolher
entre Deus e César, entre o amor à Igreja e a lealdade ao Rei.
De fato, tão logo assumiu o trono em lugar de seu pai,
Mwanga I demonstrou-se um verdadeiro inimigo da religião cristã.
Os seus motivos eram manifestos. Influenciado por más amizades, Mwanga
começou a praticar a homossexualidade e, não podendo suportar as
críticas da moral cristã a esse comportamento, passou a perseguir
sistematicamente os cristãos de Buganda – tanto anglicanos, quanto
católicos. Também não lhe agradava a rejeição dos cristãos ao tráfico de
escravos, o qual constituía uma importante fonte de recursos para o
reino. Para que pudesse agir como bem entendesse, Mwanga tinha tomado
uma firme decisão: teria que riscar o cristianismo do mapa de seu reino.
No dia 31 de janeiro de 1885, os jovens anglicanos Makko Kakumba, Yusuf
Rugarama e Nuwa Sserwanga foram as primeiras vítimas do rei. Eles foram
desmembrados e queimados no povoado de Busega Natete, por ordem do Rei.
Não contente com a execução, em outubro do mesmo ano, Mwanga ordenou o
assassinato do bispo anglicano James Hannington, alegando "más
intenções" por parte do prelado, só por ele ter entrado no reino por uma
rota mais curta que a tradicional.
Tamanha barbaridade suscitou a indignação de José Mukasa, que – a
exemplo de Natã diante do rei Davi – reprimiu severamente Mwanga, por
matar Hannington sem ao menos dar-lhe a oportunidade de defender-se.
Outra crítica, todavia, fez acender de vez a cólera real: avesso à
homossexualidade do monarca,
Mukasa pediu a Mwanga que parasse de compelir os membros da corte às suas imoralidades.
De fato, a promiscuidade do rei era insaciável e ele não hesitava em
transformar os seus súditos em "parceiros sexuais". Como reação a isso,
José não apenas tinha ensinado os rapazes a resistirem, como fez questão
de deixá-los longe do alcance do Rei.
Perturbado com as críticas de Mukasa, Mwanga jogou-o na prisão e, no
dia 15 de novembro, mandou queimá-lo publicamente, para que servisse de
exemplo a todo o povo de Uganda. Antes de morrer, disse ao seu executor:
"Um cristão que dá a sua vida a Deus não tem razão para temer a
morte. Diga a Mwanga que ele me condenou injustamente, mas eu o perdoo
de todo o meu coração." O carrasco ficou tão impressionado que decapitou-o antes de amarrá-lo e queimar o seu corpo.
O massacre de Namugongo
Muitos outros cristãos caíram nas mãos de Mwanga, totalizando um número
de 45 mártires (22 deles católicos). A perseguição da Coroa à fé cristã
duraria até o dia 27 de janeiro de 1887, com a morte do católico
Jean-Marie Muzeeyi. De todas as atrocidades cometidas por Mwanga, porém,
a pior de todas foi o massacre de Namugongo, quando 26 cristãos, sob a
liderança de São Carlos Lwanga, foram mortos de uma só vez.
Apontado pelo Rei como novo mordomo da corte, Lwanga não demoraria a
causar novos problemas à Coroa. Assim como Mukasa, de fato, Carlos sabia
ser "necessário antes obedecer a Deus que aos homens" (
At 5, 29). Uma de suas primeiras preocupações à frente do
palácio foi justamente proteger os jovens cristãos dos desejos
luxuriosos do monarca. Certa vez, um dos pajens se recusou a manter
relações sexuais com o soberano. Perguntado qual era o seu motivo, ele
respondeu que estava recebendo catequese de um católico. Tomado pela
ira, Mwanga chamou o responsável à sua presença, tomou sua lança e
decepou a sua cabeça, sem piedade. 26 de maio de 1886, Daniel
Ssebuggwawo é a vítima da vez.
Ainda insatisfeito, o Rei convocou toda a corte para o dia seguinte.
Carlos Lwanga, prevendo o que haveria de acontecer, deu o sacramento aos
quatro catecúmenos que ainda não tinham recebido o Batismo – entre
eles, uma criança de 14 anos, chamada Kizito. No outro dia, logo de
manhã, Mwanga separou de sua corte todos os cristãos e, depois de pedir
inutilmente que abandonassem a sua fé, condenou-os todos à morte.
"Quem dentre vocês não tiver a intenção de rezar, pode ficar aqui ao
lado do trono; aqueles, porém, que quiserem rezar, reúnam-se contra
aquele muro", teria dito o Rei, na ocasião. Lwanga foi o primeiro a
dirigir-se ao muro, seguido por outros tantos. Mwanga, então,
perguntou-lhes: "Mas vocês rezam de verdade?", ao que Carlos respondeu:
"Sim, meu senhor, nós rezamos e queremos continuar até a morte".
Alguns deles foram mortos ainda naquele mês, como o católico Nowa
Mawaggali, que padeceu estraçalhado por cães selvagens. A maioria,
porém, estava destinada a morrer em Namugongo, no dia 3 de junho de
1886.
Era uma quinta-feira da Ascensão do Senhor e os prisioneiros,
sentenciados à fogueira, estavam tranquilos e alegres diante de seu
veredito. A fila de condenados partia ao lugar da execução, rezando bem
alto e recitando o Catecismo pelo caminho. O pequeno Kizito simplesmente
sorria, como se tudo aquilo não passasse de uma brincadeira.
Testemunhas oculares relatavam a alegria e a confiança dos mártires,
encorajando uns aos outros, enquanto eram amontoados em uma grande
fogueira por seus carrascos.
"Invoque o seu Deus, e veja se ele pode salvá-lo", disse um deles. "Pobre louco", replicou São Carlos Lwanga.
"Você está me queimando, mas é como se estivesse derramando água sobre o meu corpo."
Os outros prisioneiros estavam igualmente calmos. Das chamas ardentes,
só se ouviam as suas orações e canções, que ressoavam cada vez mais
alto.
Quem assistiu à execução atesta nunca ter visto ninguém morrendo daquela forma.
"Semente de novos cristãos"
São Carlos Lwanga e os outros 21 mártires católicos de Uganda foram
beatificados pelo Papa Bento XV, em 6 de junho de 1920, e canonizados
por Paulo VI, em 18 de outubro de 1964.
Recentemente, durante viagem apostólica à África, o Papa Francisco
visitou o Santuário dos Mártires de Namugongo e celebrou uma Missa em
sua honra. "O testemunho dos mártires mostra a quantos, ontem e hoje,
ouviram a sua história que os prazeres mundanos e o poder terreno não dão alegria e paz duradouras",
disse o Santo Padre. "São a fidelidade a Deus, a honestidade e
integridade da vida e uma autêntica preocupação pelo bem dos outros que
nos trazem aquela paz que o mundo não pode oferecer."
Assim como em outros tempos da Igreja, o sangue desses homens valorosos
foi um incentivo para a conversão de muitos outros. O reino de terror
instaurado por Mwanga não teve o efeito pretendido: ao invés de
diminuir, o número de cristãos só aumentou cada vez mais. Realmente,
como escreve Tertuliano, "
sanguis martyrum semen christianorum – o sangue dos mártires é semente de novos cristãos".
Hoje, Uganda é um país majoritariamente cristão, graças ao exemplo
desses jovens mártires, que resistiram a um governo ímpio para guardar a
sua fé e a sua castidade. Notoriamente, trata-se do país africano que
mais avanços obteve no combate à AIDS, graças a um programa de saúde que
envolve principalmente – mais do que a simples distribuição de
preservativos – a abstinência e a fidelidade no casamento.
O programa já foi elogiado por especialistas e apontado como o mais eficaz na contenção do vírus HIV.
A primeira-dama do país, Janet Museveni,
fala abertamente aos universitários sobre a castidade.
"Honrem seus corpos como templo de Deus", ela diz. "Não tomem atalhos
nem ponham em perigo suas vidas, utilizando meios inventados pelo homem,
como os preservativos, e indo contra o plano de Deus para suas vidas."
Para quem teve Mwanga no passado, é alentador ter uma posição tão
contundente a favor da moral católica guiando o futuro de Uganda. Que
São Carlos Lwanga e seus 21 companheiros mártires sigam intercedendo
pela África e por todo o mundo, a fim de que a castidade que os conduziu
ao martírio arda no coração dos nossos jovens e também os leve a um
testemunho irrepreensível de amor a Cristo.
Por Equipe Christo Nihil Praeponere
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