O tema deste
3º domingo pode girar à volta da pergunta: “e nós, que devemos fazer?” Preparar
o “caminho” por onde o Senhor vem significa questionar os nossos limites, o
nosso egoísmo e comodismo e operar uma verdadeira transformação da nossa vida
no sentido de Deus.
O Evangelho
sugere três aspectos onde essa transformação é necessária: é preciso sair do
nosso egoísmo e aprender a partilhar; é preciso quebrar os esquemas de
exploração e de imoralidade e proceder com justiça; é preciso renunciar à
violência e à prepotência e respeitar absolutamente a dignidade dos nossos
irmãos. O Evangelho avisa-nos, ainda, que o cristão é “baptizado no Espírito”,
recebe de Deus vida nova e tem de viver de acordo com essa dinâmica.
A primeira
leitura sugere que, no início, no meio e no fim desse “caminho de conversão”,
espera-nos o Deus que nos ama. O seu amor não só perdoa as nossas faltas, mas
provoca a conversão, transforma-nos e renova-nos. Daí o convite à alegria: Deus
está no meio de nós, ama-nos e, apesar de tudo, insiste em fazer caminho
conosco.
A segunda
leitura insiste nas atitudes corretas que devem marcar a vida de todos os que
querem acolher o Senhor: alegria, bondade, oração.
1ª leitura: Sf. 3,14-18a - AMBIENTE
O profeta
Sofonias prega em Jerusalém, durante a primeira fase do reinado de Josias (séc.
VII a.C.). Nas décadas anteriores, o rei ímpio Manassés abriu o país aos costumes
dos povos vizinhos, erigiu altares aos deuses estrangeiros (chegando a colocar
no templo de Jerusalém a imagem da deusa Astarte), dedicou-se à adivinhação e à
magia e multiplicou as injustiças, sobretudo contra os mais pobres e mais
débeis. Entretanto, subiu ao trono o rei Josias, que procurou alterar este
estado de coisas e promover uma verdadeira reforma religiosa; mas, na época em
que Sofonias exerce o seu ministério profético, os erros de Manassés ainda se
fazem sentir.
Neste
contexto, Sofonias ataca a idolatria cultual, as injustiças, o materialismo, a
despreocupação religiosa, os abusos da autoridade: todo este quadro configura
uma situação de grave infidelidade à “aliança”; Deus não irá, diz o profeta,
pactuar com esta situação.
No entanto,
a intenção de Sofonias não é somente anunciar o castigo… A sua mensagem é,
antes de mais, um apelo à conversão, primeiro passo para a salvação. O que o
profeta pede ao seu Povo é que se volte de novo para Jahwéh, assuma as suas
responsabilidades para com Deus e viva de acordo com os compromissos assumidos
no âmbito da “aliança”. O texto que vamos ver, no entanto, está incluído nas
“promessas de salvação”: aí, o profeta traça o quadro desse tempo novo de
alegria e de felicidade, que há-de suceder-se à conversão de Judá.
MENSAGEM
O texto que
hoje nos é proposto é um convite à alegria, porque foi revogada a sentença que
condenava Judá. O amor de Deus pelo seu Povo venceu. A partir de agora, Deus
residirá no meio do seu Povo; e essa nova comunhão entre Jahwéh e Judá é uma
garantia de segurança, de felicidade e de vida em plenitude. Mais: o amor de
Deus – esse amor que nada consegue desmentir nem apagar – vai renovar o coração
do Povo e fazer com que Judá volte para os caminhos da “aliança”; e o próprio
Deus Se alegrará com essa transformação.
ATUALIZAÇÃO
A reflexão e
atualização da Palavra podem fazer-se à volta dos seguintes pontos:
• Nunca é
demais sublinhar a essência de Deus: o amor. Neste texto, o amor de Deus não só
introduz na relação com o Povo um dinamismo de perdão; mas esse amor faz ainda
mais: provoca a própria conversão do Povo. Esta consciência de que Deus nos
ama, muito para além das nossas falhas e fraquezas, e que o seu amor nos
transforma, nos torna menos egoístas e mais humanos, é uma das mais belas
constatações que os crentes podem fazer.
• O que
renova o mundo e o transforma não é o medo, mas o amor. O medo provoca insegurança,
pessimismo, angústia, sofrimento, bloqueamento; o amor é que faz crescer, é que
cria dinamismos de superação, é que nos torna mais humanos, é que nos faz
confiar, é que potencia o encontro e a comunhão… Devemos ter isto bem presente
quando formos chamados a anunciar o Evangelho e a proclamar a proposta de
salvação que o nosso Deus faz aos homens.
• Também é
necessário sublinhar a constatação de que Deus não desiste de vir ao nosso
encontro e de residir no meio de nós. Ele tem uma proposta de salvação que
quer, a todo o custo, apresentar-nos. Não é uma constatação consoladora, frente
às dificuldades, às angústias, às inseguranças que dia a dia preenchem a nossa
existência?
•
Finalmente, convém notar o apelo à alegria… A constatação de que Deus nos ama e
que reside no meio de nós com uma proposta de salvação e de felicidade para
todos os que O acolhem não pode provocar senão uma imensa alegria no coração
dos crentes. Damos sempre testemunho dessa alegria? Será que as nossas
comunidades são espaços onde se nota a alegria pelo amor e pela presença de
Deus?
2ª leitura: Fl. 4,4-7 - AMBIENTE
Paulo, na
prisão, recebeu a ajuda fraterna dos Filipenses. Retribui com uma carta em que
manifesta o seu afeto pela comunidade cristã de Filipos. Depois de agradecer a
Deus pela sensibilidade dos Filipenses ao anúncio do Evangelho (cf. Fl. 1,11),
de informar a comunidade sobre a sua situação pessoal (cf. Fl. 1,12-26), de
dirigir exortações várias à comunidade (cf. Fl. 1,27-2,18), de dar notícias
sobre Timóteo e Epafrodito (cf. Fl. 2,19-30) e de denunciar as acusações que
lhe fazem os seus adversários (cf. Fl. 3,1-21), Paulo – consciente de que ainda
nem tudo é perfeito nesta comunidade exemplar – apresenta um conjunto de
recomendações diversas de caráter prático. Este texto contém algumas dessas
recomendações.
MENSAGEM
A primeira e
mais importante recomendação de Paulo é um convite à alegria. Trata-se de algo
tão fundamental, que Paulo repete duas vezes no espaço de um versículo:
“alegrai-vos”. A palavra aqui utilizada (o verbo “khairô”) leva-nos a essa
“alegria” (“khara”) que os anjos anunciam aos pastores, a propósito do
nascimento de Jesus em Belém. É, portanto, uma alegria que resulta da presença
salvadora do Senhor Jesus no meio dos homens. Depois, Paulo acrescenta outras
recomendações: a bondade, a confiança, a oração (de súplica e de ação de
graças) São estas algumas das atitudes que devem acompanhar o cristão que
espera a vinda próxima do Senhor: alegria, porque a sua libertação plena está a
chegar; tolerância e mansidão para com os irmãos; serena confiança em Deus;
diálogo com Deus, agradecendo-Lhe os dons e apresentando-Lhe as suas dores e
dificuldades.
ATUALIZAÇÃO
• A alegria,
constitutiva da experiência cristã, deve estar especialmente presente neste
tempo de espera do Senhor. Não é uma alegria que resulta dos êxitos desportivos
da nossa equipa, nem do nosso êxito profissional, nem do aumento da nossa conta
bancária, mas é uma alegria pela presença iminente do Senhor nas nossas vidas,
como proposta libertadora. É a certeza da presença libertadora do Senhor que a
nossa alegria deve anunciar aos homens nossos irmãos.
• A bondade
e a indulgência com que acolhemos os que nos rodeiam têm de ser, também,
distintivos de quem espera o Senhor. Será possível que Deus nasça quando o
caminho do nosso coração está fechado com cadeias de intolerância, de
prepotência, de incompreensão?
• A espera
do Senhor faz-se, também, num diálogo contínuo com Ele. Não é possível estar
disponível para O acolher, quando estamos indiferentes e não partilhamos com
Ele, a cada instante, as nossas alegrias e as nossas dificuldades, os nossos
sonhos e as nossas esperanças. Não é possível acolher alguém com quem não
comunicamos e de quem não nos sentimos próximos.
Evangelho: Lc. 3,10-18 - AMBIENTE
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus.
10 A multidão perguntava a João: "Que devemos fazer?"
11 Ele respondia: "Quem tem duas túnicas dê uma ao que não tem; e quem tem o que comer, faça o mesmo".
12 Também publicanos vieram para ser batizados, e perguntaram-lhe: "Mestre, que devemos fazer?"
13 Ele lhes respondeu: "Não exijais mais do que vos foi ordenado".
14 Do mesmo modo, os soldados lhe perguntavam: "E nós, que devemos fazer?" Respondeu-lhes: "Não pratiqueis violência nem defraudeis a ninguém, e contentai-vos com o vosso soldo".
15 Ora, como o povo estivesse na expectativa, e como todos perguntassem em seus corações se talvez João fosse o Cristo,
16 ele tomou a palavra, dizendo a todos: "Eu vos batizo na água, mas eis que vem outro mais poderoso do que eu, a quem não sou digno de lhe desatar a correia das sandálias; ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo.
17 Ele tem a pá na mão e limpará a sua eira, e recolherá o trigo ao seu celeiro, mas queimará as palhas num fogo inextinguível".
18 É assim que ele anunciava ao povo a boa nova, e dirigia-lhe ainda muitas outras exortações.
Palavra da Salvação.
10 A multidão perguntava a João: "Que devemos fazer?"
11 Ele respondia: "Quem tem duas túnicas dê uma ao que não tem; e quem tem o que comer, faça o mesmo".
12 Também publicanos vieram para ser batizados, e perguntaram-lhe: "Mestre, que devemos fazer?"
13 Ele lhes respondeu: "Não exijais mais do que vos foi ordenado".
14 Do mesmo modo, os soldados lhe perguntavam: "E nós, que devemos fazer?" Respondeu-lhes: "Não pratiqueis violência nem defraudeis a ninguém, e contentai-vos com o vosso soldo".
15 Ora, como o povo estivesse na expectativa, e como todos perguntassem em seus corações se talvez João fosse o Cristo,
16 ele tomou a palavra, dizendo a todos: "Eu vos batizo na água, mas eis que vem outro mais poderoso do que eu, a quem não sou digno de lhe desatar a correia das sandálias; ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo.
17 Ele tem a pá na mão e limpará a sua eira, e recolherá o trigo ao seu celeiro, mas queimará as palhas num fogo inextinguível".
18 É assim que ele anunciava ao povo a boa nova, e dirigia-lhe ainda muitas outras exortações.
Palavra da Salvação.
O Evangelho
de hoje vem na sequência daquele que refletimos no passado domingo: o profeta
João Batista indica, com pormenores concretos e a grupos concretos, como
proceder para percorrer esse caminho de “metanoia” e preparar a “vinda do
Senhor”.
MENSAGEM
A primeira
parte do Evangelho de hoje (vs. 10-14) é uma secção própria de Lucas. Pôr as
pessoas as perguntar “o que devemos fazer” é habitual em Lucas (cf. At. 2,37;
16,30; 22,10): sugere uma abertura à proposta de salvação que vem de Deus. João
Batista propõe, então, três atitudes concretas para quem quer fazer a
experiência de conversão e de encontro com o Senhor que vem: ao povo em geral,
João Batista recomenda a sensibilidade às necessidades de quem nada tem e a
partilha dos bens; aos publicanos, pede que não explorem, que não se deixem
convencer por esquemas de enriquecimento ilícito, que não despojem ilegalmente
os mais pobres; aos soldados, pede que não usem de violência, que não abusem do
seu poder contra fracos e indefesos… Repare-se como João Batista põe em relevo
os “crimes contra o irmão”: tudo aquilo que atenta contra a vida de um só homem
é um crime contra Deus; quem o comete, está fechando o seu coração e a sua vida
à proposta libertadora que Cristo veio trazer.
Na segunda
parte do Evangelho (vs. 15-18), João Batista anuncia a chegada do batismo no
Espírito Santo, contraposto ao batismo “na água” de João. O batismo de João é,
apenas, uma proposta de conversão; mas o batismo de Jesus consiste em receber
essa vida de Deus que atua no coração do homem, transforma o homem velho em
homem novo, faz do homem egoísta e fechado em si um homem novo, capaz de
partilhar a vida e amar como Jesus. Faz-se, aqui, referência a essa
transformação que Cristo operará no coração de todos os que estão dispostos a
acolher a sua proposta de libertação: começará, para eles, uma nova vida, uma
vida purificada (fogo), uma vida de onde o pecado e o egoísmo foram eliminados,
uma vida segundo Deus. Para Lucas, este anúncio do profeta João
concretizar-se-á plenamente no dia de Pentecostes.
ATUALIZAÇÃO
• “E nós,
que devemos fazer?” A expressão revela a atitude correta de quem está aberto à
interpelação do Evangelho. Sugere-se aqui a disponibilidade para questionar a
própria vida, primeiro passo para uma efetiva tomada de consciência do que é
necessário transformar.
• Os bens
que temos à nossa disposição são sempre um dom de Deus e, portanto, pertencem a
todos: ninguém tem o direito de se apropriar deles em seu benefício exclusivo.
As desigualdades chocantes, a indiferença que nos leva a fechar o coração aos
gritos de quem vive abaixo do limiar da dignidade humana, o egoísmo que nos
impede de partilhar com quem nada tem, são obstáculos intransponíveis que
impedem o Senhor de nascer no meio de nós. As nossas comunidades e nós próprios
damos testemunho desta partilha que é sinal do Reino proposto por Jesus?
• Os
publicanos eram aqueles que extorquiam dinheiro de modo duvidoso, despojando os
mais pobres e enriquecendo de forma ilícita. Que dizer dos modernos esquemas
imorais (às vezes lícitos, mas imorais) de enriquecimento rápido? Que dizer da
corrupção, do branqueamento de dinheiro sujo, da fuga aos impostos, das taxas
exageradas cobradas por certos serviços, das falcatruas? Será possível
prejudicar conscientemente um irmão ou a comunidade inteira e acolher “o Senhor
que vem”?
• “Não
exerçais violência sobre ninguém”… E os atos de violência, que tantas vezes
atingem inocentes e derramam sangue ou, ao menos, provocam sofrimento e
injustiça? E os atos gratuitos de terrorismo, ainda que sejam mascarados de
luta pela libertação? E a exploração de quem trabalha, a recusa de um salário
justo, ou a exploração de imigrantes estrangeiros? E as prepotências que se
cometem nos tribunais, nas repartições públicas, na própria casa e, tantas
vezes, nas recepções das nossas igrejas? Neste quadro, é possível acolher
Jesus?
• Ser
cristão é ser batizado no Espírito, quer dizer, é ser portador dessa vida de
Deus que nos permite testemunhar Jesus e a sua proposta. O que é que conduz a
nossa caminhada e motiva as nossas opções – o Espírito, ou o nosso egoísmo e
comodismo?
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