quinta-feira, 21 de junho de 2012

ACAB, JEZABEL E O SADIO EXERCÍCIO DA AUTORIDADE.



Como todos sabemos, o exercício da autoridade é um serviço a ser prestado aos outros para que cresçam. A palavra “autoridade” deriva do latim auctoritas, que vem por sua vez de auctor, derivado de augere, que significa “fazer crescer”. Esse serviço claramente comporta um poder de decisão e influência sobre pessoas ou estruturas.

O bom exercício desse serviço-poder exige uma boa vigilância interior para que cada vez mais preste-se um serviço e sempre menos as autoridades apoiem-se em um poder humano. Isso se resolve a nível interior. Precisa-se vigiar porque todos têm a concupiscência do poder.
Temos um escandaloso mau uso da autoridade no assassinato de Nabot por parte de Acab e Jezabel:
Naquele tempo, 1Nabot de Jezrael possuía uma vinha em Jezrael, ao lado do palácio de Acab, rei de Samaria. 2Acab falou a Nabot: “Cede-me a tua vinha, para que eu a transforme numa horta, pois está perto da minha casa. Em troca eu te darei uma vinha melhor, ou, se preferires, pagarei em dinheiro o seu valor”.
3Mas Nabot respondeu a Acab: “O Senhor me livre de te ceder a herança de meus pais”.4Acab voltou para casa aborrecido e irritado por causa desta resposta que lhe deu Nabot de Jezrael: “Não te cederei a herança de meus pais”. Deitou-se na cama, com o rosto voltado para a parede, e não quis comer nada.
5Sua mulher Jezabel aproximou-se dele e disse-lhe: “Por que estás triste e não queres comer?” 6Ele respondeu: “Porque eu conversei com Nabot de Jezrael e lhe fiz a proposta de me ceder a sua vinha pelo seu preço em dinheiro, ou, se preferisse, eu lhe daria em troca outra vinha. Mas ele respondeu que não me cede a vinha”.
7Então sua mulher Jezabel disse-lhe: “Bela figura de rei de Israel estás fazendo! Levanta-te, toma alimento e fica de bom humor, pois eu te darei a vinha de Nabot de Jezrael”.
8Ela escreveu então cartas em nome de Acab, selou-as com o selo real, e enviou-as aos anciãos e nobres da cidade de Nabot. 9Nas cartas estava escrito o seguinte: “Proclamai um jejum e fazei Nabot sentar-se entre os primeiros do povo, 10e subornai dois homens perversos contra ele, que deem este testemunho: ‘Tu amaldiçoaste a Deus e ao rei!’ Levai-o depois para fora e apedrejai-o até que morra”.
11Os homens da cidade, anciãos e nobres concidadãos de Nabot, fizeram conforme a ordem recebida de Jezabel, como estava escrito nas cartas que lhes tinha enviado.12Proclamaram um jejum e fizeram Nabot sentar-se entre os primeiros do povo.13Chegaram os dois homens perversos, sentaram-se diante dele e testemunharam contra Nabot diante de toda a assembleia, dizendo: “Nabot amaldiçoou a Deus e ao rei”. Em virtude disto, levaram-no para fora da cidade e mataram-no a pedradas.
14Depois mandaram a notícia a Jezabel: “Nabot foi apedrejado e morto”. 15Ao saber que Nabot tinha sido apedrejado e estava morto, Jezabel disse a Acab: “Levanta-te e toma posse da vinha que Nabot de Jezrael não te quis ceder por seu preço em dinheiro; pois Nabot já não vive; está morto”. 16Quando Acab soube que Nabot estava morto, levantou-se para descer até a vinha de Nabot de Jezrael e dela tomar posse. (1Re 21, 1-16)
Na postura de Acab vemos a autoridade em uma personalidade emocionalmente comprometida, o que é um enorme perigo. É como colocar um motor muito possante em um carro muito velho. Ao ser dado o arranque, o carro se desconjuntará.
O comportamento de Acab se parece com o de um menino mimado que não está acostumado a receber um não. A pouca capacidade de confrontar-se com dificuldades, limites próprios e alheios, frustrações e oposições é um dos riscos do exercício do poder. Diante de circunstâncias como essas, a pessoa com vontade fraca ou personalidade emocionalmente comprometida facilmente se abate. A reação mais comum é assumir a figura do “reizinho contrariado” que faz cara feia para que seus súditos o venham bajular.

Já Jezabel assume a postura, também equivocada, oposta à de Acab. Ela se considera onipotente, sem limites. O ditado popular diria: “O poder lhe subiu à cabeça”. Não lhe importam as pessoas, muito menos o seguimento do caminho de Deus. Sua vontade é forte, mas não é humilde e todo o horizonte de sua vida é cumprir os seus objetivos e ninguém pode opor-se a ela, totalmente centralizada em si e seus desejos.

O melhor exemplo de bom exercício de autoridade e de poder é o próprio Deus. Seu poder é indiscutível: ele é onipotente. No seu amor infinito, Ele nos criou e impôs a si mesmo o limite de amor que é o respeito à liberdade do homem. Essa respeitosa decisão acarretou-lhe não poucos dissabores, mas, mesmo assim, o Senhor não voltou atrás no limite que se impôs. Pelo contrário. Seus planos foram amar mais, servir mais, para que o homem-livre pudesse crescer. Dessa forma Ele mostra-se como a suprema auctoritas.
Ao caminho de vontade enfraquecida, vitimalismo e debilidade de personalidade de Acab e de autoritarismo e centralização desmedidos de Jezabel, Deus oferece o caminho de liberdade, humildade e serviço e abaixamento do Filho.
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 38“Ouvistes o que foi dito: ‘Olho por olho e dente por dente!’ 39Eu, porém, vos digo: Não enfrenteis quem é malvado! Pelo contrário, se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda! 40Se alguém quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe também o manto! 41Se alguém te forçar a andar um quilômetro, caminha dois com ele! 42Dá a quem te pedir e não vires as costas a quem te pede emprestado”. (Mt 5, 38-42)
Essas palavras estão não só na boca de Jesus, obviamente, mas também na sua vida. Ele usou de todo o seu poder para que ninguém, nem mesmo os anjos do céu, o impedisse de subir ao Calvário. Usou de sua autoridade e poder para servir ao homem, carregando o pecado da humanidade. Usou o poder e autoridade advindos do amor divinos para fazer o impossível, salvar o homem. Ao que lhe bateu em uma face, ofereceu a outra. Aos que lhe tomaram a túnica, entregou também o manto sem costura. Caminhou forçado até a cruz para levar o homem a caminhar com ele para a Ressurreição e deu muitíssimo além do que o homem lhe saberia pedir e o fez gratuitamente, livremente, eternamente.

Esse caminho de Jesus nos faz refletir. O mundo ao ser injustiçado clama por Justiça com ranço de vingança. Já os santos, que encarnaram o Evangelho, sempre que foram contrariados ou ofendidos viram nisso uma oportunidade de participar do amor redentor de Deus. Entenderam que para quebrar a cadeia de ódio do pecado só existe uma forma: pagar o preço da redenção do homem. Nem o autoritário desmedido nem o reizinho contrariado estão dispostos a renunciar, a pagar o preço. Ora, para quebrar a cadeia de ódio, alguém precisa estar disposto a abaixar-se, humilhar-se, renunciar, pagar o preço que é o amor totalmente gratuito até a completa entrega de si.

Deus nos dê o correto uso da autoridade e poder para amar até o fim o homem ferido pelo pecado, quebrando as cadeias do ódio e estabelecendo os laços do amor divino.
Cure-nos o Senhor para não cairmos na tentação do vitimalismo ou da desistência quando formos contrariados em nossos pensamentos, opiniões, vontades e planos.
O Espírito de Deus nos dê de sua própria paciência histórica, para sabermos esperar os tempos de conversão e santificação dos irmãos.

Ele nos dê humildade para, tendo o poder de decisão nas mãos, não querer, apressadamente, fazer a nossa vontade ou a daqueles a quem queremos agradar.
Livre-nos de, em busca de cumprir bons propósitos para a nossa missão, passarmos por cima das pessoas.

Pe. Denys
Missionário da Comunidade Shalom


por Padre Dênis, Comunidade Shalom
Comunidade Shalom

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