Uma
mãe e escritora francesa escreveu um livro apresentando “motivos para
odiar crianças”. Nós, às portas do Natal, queremos apresentar uma razão,
uma só e suficiente, para amá-las: o menino Jesus.
"Tenho motivos para odiar crianças": é o título de um polêmico
testemunho, amplamente divulgado esta semana na Internet, da escritora
francesa Corinne Maier, que diz arrepender-se de ser mãe.
Se o título impressiona pela franqueza, não espanta pela realidade a que faz referência.
As famílias brasileiras, assim como em muitas outras partes do mundo,
não querem mais ter filhos. Os homens e mulheres de nossa época dão
prioridade às suas carreiras, a viagens de férias, a uma vida de maior
conforto, em resumo. As crianças vêm muitas vezes como resultado de um
"acidente" do destino, ao qual os pais fatalmente têm que se adequar. Se
são frutos de um planejamento, normalmente só nascem depois do
pós-doutorado, e somam um casal, quando muito.
Desse que é um comportamento bastante comum hoje em dia, até o ato
público de "odiar crianças", vai evidentemente um caminho, senão longo,
pelo menos considerável.
Mas isso é por enquanto. Matérias como essa, soltas na
Internet, funcionam como uma espécie de "navio quebra-gelo": sua
pretensão é desfazer tabus para expor uma concepção de mundo que há
muito tempo permeia as mentes das "classes falantes". Pouco a pouco elas
vão disseminando o que realmente pensam a respeito de família e a
respeito de filhos, em uma tentativa de legitimar intelectualmente
aquilo que já está generalizado na prática. É questão de pouco tempo
para que mais e mais pessoas externem o horror que têm à maternidade, à
vida e aos bebês (e de menos tempo ainda para que apareçam no
Fantástico, como sabemos).
Já tivemos a oportunidade de tratar, no entanto,
esse tema da influência negativa que os meios de comunicação exercem no comportamento das pessoas.
As telenovelas da Rede Globo ainda constituem o melhor exemplo de como
essas coisas funcionam, pelo que queremos realmente deixar de lado esse
assunto, pelo menos ao longo destas linhas.
Acreditamos que, na verdade, a melhor resposta para um texto que expõe
"motivos para odiar crianças" é justamente apresentar as contrarrazões
disso.
Por que nós, enquanto cristãos, amamos crianças? Por que é tão natural, para uma civilização fundada sobre bases cristãs, o amor aos filhos que nascem?
A solução para essa pergunta não deve ser encontrada em uma explicação
meramente biológica. O choque de ver uma mãe que despreza a sua prole é
de cunho evidentemente natural, mas o desejo que os cristãos têm de
povoar a terra e o afeto que cultivam para com seus filhos pequenos são
de uma ordem superior —
sobrenatural, poderíamos dizer. Sua origem é o Natal.
Talvez não tenhamos parado para meditar suficientemente nisso, mas, na
festa que estamos prestes a celebrar, no dia 25 de dezembro, o que
comemoramos, senão que
o próprio Deus se fez menino, criança, para a nossa salvação?
O Onipotente se revestiu da fragilidade de um bebê, o Rei do universo
inteiro assumiu a forma do mais pequeno dos súditos, Aquele que sustenta
todos os seres quis experimentar as mais básicas das necessidades — a
de um seio que o amamentasse, a de uma mão que lhe revestisse o corpo, a
de uma mãe que o acalentasse e a de um pai que o protegesse. Deus se
fez plenamente humano, com todas as fraquezas de nossa condição, exceto o
pecado (cf. Hb 4, 15).
Ninguém imagine que o menino Jesus, da manjedoura, refulgia como na
"transfiguração", ou combatia dragões, como se fosse "o pequeno
Hércules" da mitologia romana. Absolutamente, não. São Leão Magno afirma
que os magos encontraram o divino infante "sem que se diferenciasse em
nada do comum das outras crianças" [1]. Assim, se nos fosse dado
contemplar, por alguns minutos, o aspecto daquele bebê, envolto em
faixas numa gruta fria de Belém, certamente seríamos capazes de
identificar o mesmo sorriso cativante dos nossos filhos e netos, o mesmo
choro com que eles pedem de comer, a mesma sonolência com que vivem os
seus primeiros dias neste mundo
etc. Agiu deste modo o Senhor para não desacreditar a sua
humanidade [2]; para mostrar aos magos e aos pastores que era
efetivamente fazendo-se um de nós que Ele vinha redimir o seu povo; para
ensinar que Deus, que nos criou sozinho, não nos queria salvar sem que
cooperássemos com Ele. Não, não era uma "ilusão fantasmagórica" o que a
Sagrada Família de Nazaré e as primeiras testemunhas de Cristo tinham
diante dos olhos: verdadeiramente, caro salutis est cardo, a carne humana se tinha tornado o eixo da salvação [3]!
Ao mesmo tempo, porém, aqueles homens vindos do Oriente, ainda que vissem um homem, reconheceram a Deus:
vident enim hominem, diz Santo Tomás de Aquino, agnoscunt Deum
[4]. Os presentes que eles traziam eram adequados à dignidade de quem
visitavam: "ouro, como a um grande rei; incenso, utilizado nos
sacrifícios divinos, como a Deus; e mirra, com a qual são embalsamados
os corpos dos mortos, indicando que iria morrer pela salvação de todos"
[5]. Ainda que com os olhos da carne não vissem nada de magnífico
naquela criança, os magos, satisfeitos com o testemunho da estrela que
avistaram nos céus, realmente se prostravam diante daquele bebê, em ato
de verdadeira adoração. Foram os primeiros pagãos a se converterem e
confessarem, com os atos, que Jesus Cristo era "verdadeiro Deus e
verdadeiro homem".
Esse mesmo mistério do Natal, da Divindade que se une à humanidade, do
Eterno que toca a história, nós o vemos atualizado em cada nova vida que
vem a este mundo. Como diz o próprio Senhor nos Evangelhos, "quem
acolher em meu nome uma criança como esta, estará acolhendo a mim mesmo"
(
Mt 18, 5). Cada ser humano que é concebido, que é gerado
graças ao amor de um casal, é um novo templo moldado por Deus e no qual
Ele mesmo quer morar, com a sua graça santificante. No corpo
inerme de cada bebê que escolhemos trazer a este mundo, está escondida
uma alma imortal, uma alma que, batizada, participa da própria natureza
divina (cf. 2Pd 1, 4). É isso o que as famílias celebram —
ainda que nem sempre tenham plena consciência disto —, quando levam os
seus filhos para serem batizados. Nas águas que se derramam sobre as
suas cabeças, elas nascem de novo e, com isso, configuram-se
perfeitamente ao menino Jesus, "nascido do Pai antes de todos os
séculos" e da Virgem Maria, há pouco mais de dois mil anos.
É essa alegria, de propiciar nascimentos para o Céu, o que deveria
estimular os casais a terem filhos! Só com uma visão sobrenatural e
íntegra da realidade os seres humanos voltarão a ter um lugar especial
no seio das famílias e da sociedade como um todo.
Nós, católicos, não fazemos filhos "para que eles sofram neste
mundo", como os antinatalistas gostam de dizer, mas para que eles sejam
felizes na eternidade.
Quem, ao contrário, só é capaz de olhar para o próprio umbigo,
naturalmente cede à "campanha da esterilidade" e pode chegar até mesmo
ao absurdo de inventar "motivos para odiar crianças". Todos nós sabemos,
no entanto, quais as razões do homem moderno para evitar filhos.
Normalmente, não são justificativas, mas desculpas, e, ainda que sejam muitas, podem resumir-se em uma só palavra: egoísmo.
Por Equipe Christo Nihil Praeponere
Referências
- São Leão Magno, Serm. 34, de Epiphania 4, c. 3 (PL 54, 247).
- Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, III, q. 36, a. 4.
- Tertuliano, De carnis resurrectione, 8, 3: PL 2, 806.
- Suma Teológica, III, q. 36, a. 8, ad 4.
- São João Crisóstomo, Opus imperfectum in Matthaeum, 2, super 2, 11 (PG 56, 642).
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