Os três evangelhos sinóticos relatam a libertação do homem possesso cujos demônios pedem para serem mandados para uma vara de porcos que se afogam no mar da Galileia, causando grande prejuízo para o dono dos porcos e gerando grande temor entre a população dos gerasenos, que pedem, então, para Jesus ir embora! Assim falam os textos: Mateus 8,34: “Então a população saiu ao encontro de Jesus. Quando o viu, suplicou-lhe que deixasse aquela região”. Em Marcos 5,17 se lê: “Começaram então a rogar-lhe que se retirasse da sua região”, e por fim em Lucas 8,37, a reação da população é a mesma, rogam que Jesus se afaste e Ele sobe a barca e regressa. Sem dúvida a cena deve ter sido assustadora, barulhenta, cheia da glória de Deus, fazendo tremer as bases de qualquer um. Fariam tremer as minhas também, seguramente.
Interessante é que são os demônios que matam os porcos e não Jesus, mas é ao Senhor que o convite é feito. “Saia de nossa cidade”, pedem os habitantes. Que insanidade! Eles pedem para Deus ir embora, se afastar, eles rejeitam Jesus! É claro que ter uma vara de porcos afogada e perdida é uma perda real, mas que benefício real teriam os donos se mantivessem os porcos juntamente com todos os demônios? A população e os proprietários perderam os porcos mas ganharam a liberdade.
Penso que estamos diante de um concreto e frequente impasse que nos obriga a optar segundo aquilo que cremos ser real e definitivo. Ou seja, com que olhos optamos ver as realidades que nos cercam, com olhos humanos iluminados pela fé no Senhor nosso Deus que nos dá todas as coisas mas que muitas vezes parece nos tirar estes mesmos dons para nos dar liberdade e vida, ou o olhar raso e somente humano que não vê para além do aqui e agora, do evidente? Fácil falar, muitíssimo exigente na vida concreta, mas vital e necessário para se viver a vida no Espírito, vida humana de batizados.
A cultura europeia e também a nossa, latino-americana e brasileira, que procura defender uma cultura laicista que se envergonha e nega suas raizes judaico-cristãs e católicas, está fazendo a mesma coisa que os personagens do Evangelho, só que com roupagem e discurso do século XXI: querem tirar Jesus Cristo da sociedade, do ambiente público, das repartições e das escolas, do imaginário, dos valores, tornando-o não mais referência absoluta da Verdade e das consciências, relegando-o meramente à piedade privada e subjetiva.
Não quero parecer maniqueísta ou quase simplória, mas a verdade é que quanto mais tirarmos Jesus Cristo das nossas vidas e permitirmos que Ele seja tirado e negado na vida das pessoas e o renegarmos, mais nos restarão somente os porcos e os demônios, mesmo que a aparência permaneça de abundância! Sabemos que no contexto da cultura semita-oriental os porcos são sinal de impureza e quem deles cuida é escravo. Sabemos que ainda há situações humanas e subumanas de escravidão ao redor do mundo em pleno século XXI, mas estamos falando de escravidão espiritual. Não há maior escravidão do que permanecer cego, nas garras do demônio e de todas as suas mentiras, garras hoje cada vez mais sutis e insidioas, que apelam para a soberba, a indepêndia e o esquecimento de Deus e que tornam as pessoas cada vez menos humanas! O demônio insiste em querer voltar atrás no tempo, para novamente afastar a humanidade da perfeita comunhão com o Pai, que o amor e o sacrifício de Jesus já libertaram! Não há outra possibilidade de vida plena e satisfatoriamente humana senão em Jesus Cristo, fazendo a experiência de sua Morte e Ressurreição, recebendo a sua vida no dom do batismo e, a partir dele, vivendo todas as dimensões e facetas do que é ser homem ou mulher. Quanto mais longe da Verdade revelada por Jesus Cristo e preservada pela Igreja Católica em todo o seu mistério, mais presa fácil se é das ideologias, sejam elas individuais ou coletivas. O demônio continua investindo pesado para negar a obra de salvação e tem enganado a muitos e muitos...
Este sempre foi o anúncio da Igreja, é o kerigma, e sempre será: a salvação de Nosso Senhor Jesus Cristo. Esta é a salvação que buscamos, talvez já tenhamos alcançado e já a vivamos, da qual bebemos e nos alimentamos até chegarmos à visão do Senhor face a face. E quer creiamos, quer não, seja qual for nossa religião, cultura ou experiência de vida, um dia – que belo dia – nós veremos o Senhor Jesus, Homem-Deus, face a face em toda a sua glória, esplendor e amor, com as marcas da Cruz e da Ressurreição em seu Corpo, e diante dele nos prostraremos completamente absorvidos em seu Amor.
Aqueles homens do Evangelho, ignorantes, não tinham consciência do que faziam. Também hoje muitos que negam a fé Católica, a Igreja e Jesus não sabem o que fazem. Há os que sabem e o fazem deliberadamente, que Deus tenha deles compaixão e os liberte das mentiras do demônio e lhes devolva a graça da vida e da conversão. Mas e o que cabe a nós que cremos e o amamos e servimos? Onde estamos nós que nos consagramos e doamos nossa vida pelo Reino e por Amor a Jesus? Onde ficamos e que papel temos como Comunidades Novas, como Shalom, como Juventude para Jesus, como povo de Deus, ficamos na linha de frente num Halleluya ou Missionário Shalom, ou no escondimento de nossa casa e intercessão?
Nós somos aqueles com quem o Santo Padre conta para reevangelizar o mundo pela vida de castidade, de oração, de compromisso de amor, de amor à Palavra de Deus e à vida sacramental. Somos o povo que opta pela vida e pela cultura da vida, e vota tendo este critério em mente. Povo que une cultura, razão e fé e não se deixa manipular por qualquer vento ou modismo. Nós somos o povo de Deus com quem conta o Santo Padre Bento XVI ao criar no dia 28 de junho último um novo Conselho Pontifício para reevangelizar os países ocidentais de tradição católica que “registram uma progressiva secularização da sociedade e uma espécie de eclipse do sentido de Deus”. Somos o povo a quem o Papa pede uma urgente “nova evangelização”, já que o homem do terceiro milênio tem uma “fome mais profunda”, que só Deus pode saciar.
Continua o Santo Padre: “O homem do terceiro milênio deseja uma vida autêntica e plena, necessita verdade, liberdade profunda e amor gratuito. Inclusive nos desertos do mundo secularizado, a alma do homem tem sede de Deus”. E este é o testemunho de vida que somos chamados a dar, e Jesus o Senhor, nos capacita a dar. Talvez o Santo Padre pergunte a nós consagrados e da Obra Shalom, usando as palavras do profeta Isaías: “Quem enviarei eu?”. Pergunta esta que já foi um hit musical na década de 90 quando do início da expansão missionária da Comunidade Shalom.
E nossa resposta poderá ser esta, também cantada, num tecido musical que diz: “Somos nós este povo alcançado por sua luz, fruto da Sua obra na Cruz!” “Eis-me aqui!” “Quero ofertar minha vida, minha juventude por amor”. Ao contrário dos que expulsaram Jesus, nós queremos viver nele, por Ele e para Ele, pois só Jesus merece todo amor do mundo e o mundo precisa e merece o Amor de Jesus. Fica conosco Senhor! Fica conosco!
Elena Arreguy Sala
Missionária da Comunidade Católica Shalom em Haifa/ Israel
Elena Arreguy Sala
Missionária da Comunidade Católica Shalom em Haifa/ Israel
por
Revista Shalom Maná
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