A Igreja celebra a Epifania, a manifestação de Jesus aos povos
pagãos, os que não eram judeus, no dia 6 e janeiro; mas no Brasil tem
autorização para celebrar no domingo após o da Sagrada Família,
encerrando o ciclo litúrgico do Natal. Além do Evangelho de São Mateus,
há documentos apócrifos no Vaticano, muito antigos e de grande valor,
que relatam a visita dos Reis Magos ao Menino Jesus. Há um mosaico sobre
eles em Ravenna, Itália, do século VI, com os nomes dos três: Baltazar,
Melquior e Gaspar. Teriam vindo da Pérsia. Os reis magos eram reis
(talvez apenas de uma pequena cidade, como era comum), mas que
aguardavam a chegada do Messias, uma vez que a fé dos judeus se espalhou
pelo Oriente.
Trata-se de uma Solenidade litúrgica da maior importância. Os Padres
da Igreja viram nesta visita dos sábios Magos do Oriente a Jesus Menino,
o símbolo e a manifestação do chamado de todos os povos pagãos à vida
eterna. Os magos foram a declaração explícita de que o Evangelho era
para ser pregado a todos os povos.
O nosso Catecismo diz que: “A epifania é a manifestação de Jesus como
Messias Israel, Filho de Deus e Salvador do mundo… Nesses “magos”,
representantes das religiões pagãs circunvizinhas, o Evangelho vê as
primícias das nações que acolhem a Boa Nova da salvação pela Encarnação.
A vinda dos magos a Jerusalém para “adorar ao Rei dos Judeus” mostra
que eles procuram em Israel, à luz messiânica da estrela de Davi, aquele
que será o Rei das nações. Sua vinda significa que os pagãos só podem
descobrir Jesus e adorá-lo como Filho de Deus e Salvador do mundo
voltando-se para os judeus e recebendo deles sua promessa messiânica,
tal como está contida no Antigo Testamento. A Epifania manifesta que “a
plenitude dos pagãos entra na família dos patriarcas” e adquire a
“dignidade israelítica” (n.528).
Comentando a adoração dos reis Magos que vieram do Oriente, diz S.
Agostinho: “Ó menino, a quem os astros se submetem! De quem é tamanha
grandeza e glória de ter, perante seus próprios panos, Anjos que velam,
reis que tremem e sábios que se ajoelham! Quem é este, que é tal e
tanto? Admiro de olhar para panos e contemplar o céu; ardo de amor ao
ver no presépio um mendigo que reina sobre os astros. Que a fé venha em
nosso socorro, pois falha a razão natural”.
O doutor da Igreja São Gregório Nazianzeno (†379) chama a Epifania de
“festa das luzes” e a contrapõe à festa pagã do sol invicto, deus dos
romanos. Tanto no Oriente como no Ocidente, a Epifania tem o caráter de
uma solenidade mística que transcende os episódios históricos
particulares. Os Magos descobriram no céu os sinais de Deus. Tendo como
ponto de partida a natureza os pagãos podem “cumprir as obras da lei”
(cf.At 14,15-17), diz S. Paulo.
Depois de ter se manifestado a seu povo, Israel, através dos pastores
de Belém, Cristo se manifesta ao mundo pagão na pessoa dos Magos que
vieram do Oriente e o reconheceram como Deus. São Paulo expressou isso
dizendo: “Este mistério Deus não o fez conhecer aos homens das gerações
passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo Espírito, aos seus santos
apóstolos e profetas: os pagãos são admitidos à mesma herança, são
membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo,
por meio do Evangelho” (Ef 3,5).
São Leão Magno (†460), Papa e doutor da Igreja, ensinou que: “Tendo a
misericordiosa Providência de Deus decidido vir nos últimos tempos em
socorro do mundo perdido, determinou salvar todos os povos em Cristo”
(Sermão 3 do domingo da Epifania).
O salmista já cantava este mistério ainda envolto em véu:
“Os reis de Társis e das ilhas hão de vir e oferecer-lhe seus
presentes e seus dons. E também os reis de Seba e de Sabá hão de
trazer-lhe oferendas e tributos. Os reis de toda a terra hão de
adorá-lo, e todas as nações hão de servi-lo. Seja bendito o seu Nome
para sempre! E que dure como o sol Sua memória! Todos os povos serão
Nele abençoados, todas as gentes cantarão o Seu louvor! (Sl 71,10-17).
“Nações que não vos conheciam Vos invocarão e povos que Vos ignoravam
acorrerão a Vós” (cf. Is 55, 5). “As nações que criastes virão adorar,
Senhor, e louvar Vosso Nome (Sl 85, 9). “O Senhor fez conhecer a
salvação, e às nações, sua justiça” (Sl 97, 2).
O profeta Isaías já tinha anunciado esse mistério sete séculos antes
de acontecer, mostrando que os povos viriam a Jerusalém adorar o
Messias: “Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua
luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor. Eis que está a terra
envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem os povos; mas sobre ti
apareceu o Senhor, e Sua glória já se manifesta sobre ti. Os povos
caminham à tua luz e os reis ao clarão de tua aurora. Levanta os olhos
ao redor e vê: todos se reuniram e vieram a ti; teus filhos vêm chegando
de longe com tuas filhas, carregadas nos braços… será uma inundação de
camelos e dromedários de Madiã e Efa a te cobrir; virão todos os de
Sabá, trazendo ouro e incenso e proclamando a glória do Senhor” (Is
60,1-6).
Os Magos cumpriram esta profecia trazendo o ouro para o Rei, o
incenso para o Menino Deus e a mirra para “o Cordeiro que tira os
pecados do mundo” (João 1,29), e que seria sepultado com mirra.
São Leão Magno também nos diz que: “O serviço prestado por esta
Estrela nos convida a imitar sua obediência, isto é, servir com todas as
forças essa graça que nos chama todos para Cristo”.
Como podemos hoje levar, nós também, nossa adoração, ouro, incenso e
mirra para o Menino Deus? De muitas maneiras. Podemos ofertar-lhe o ouro
da nossa fé, o incenso do nosso louvor e a mirra dos nossos sofrimentos
aceitos e as boas obras, oferecidos a Deus pela salvação do mundo.
Adorar ao Menino Deus pode significar também, prostrar nosso orgulho,
nossa soberba; deixar de lado nossos próprios interesses e submeter
nossa vida à ação e à vontade de Deus.
Diz o grande S. Gregório Magno (†604), Papa e doutor: “As mãos
significam as obras virtuosas, os dedos, a discrição. Portanto, as mãos
destilam a mirra quando, pelas obras virtuosas, castiga-se a carne; mas
os dedos são ditos cheios da mais preciosa mirra, pois é muito preciosa a
mortificação que se faz com discrição”.
É impressionante notar que os Reis Magos chegaram a Jerusalém e
ninguém sabia do nascimento do Messias; apenas os pobres pastores. Penso
que eles ficaram em dúvida e até decepcionados. Como? Ninguém sabe?
Será que nos enganamos? Nem os doutores da lei, nem fariseus e escribas
sabiam. “Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a
sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo”.
Mas o inimigo de Deus notou. O fato foi tão marcante que São Mateus
diz que: “Ao saber disso, o rei Herodes ficou perturbado, assim como
toda a cidade de Jerusalém. E Herodes quis matar o Menino, pois pensava
que fosse tomar o seu reino. Não sabia que o Reino do Messias “era do
outro mundo”.
Isto
nos faz pensar. Também para nós Deus pode se manifestar e podemos ficar
surdos e cegos à Sua chegada. E muitas vezes não faltam os inimigos que
querem eliminá-lo em nossas vidas com receio de que possa tomar o seu
poder de nós. Mas, apesar de todas as dificuldades, decepção pelo fato
das pessoas não saberem de nada, os Magos continuaram sem desanimar, e a
estrela os guiava: “E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia
adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino. Ao verem de
novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande”.
Nós também não podemos deixar de caminhar em nossa busca do Senhor.
Às vezes parece que Sua estrela some nas nuvens das tentações e
dificuldades da vida, mas é preciso continuar a caminhada até a
Manjedoura do Messias. Nós também vamos sentir uma grande alegria quando
o encontrarmos. E vamos, como os Magos, vendo o Menino com José e
Maria, sua mãe, ajoelhar diante dele, e o adorar, oferecendo os nossos
presentes. E voltaremos para casa, como os Magos, por outro caminho, o
da fé e da esperança, não o da descrença e da desesperança. E seremos
felizes!
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