Com o nome de metanóia o Evangelho designa «uma total mudança interior... uma conversão radical, uma transformação profunda da mente e do coração»1.
O Santo Padre em sua Exortação apostólica Ecclesia in America nos recorda uma verdade essencial: «o encontro com Jesus vivo leva à conversão»2 e «nos conduz à conversão permanente»3. Também nos recorda que a meta do caminho de conversão é a santidade4, quer dizer, chegar «ao estado de homem perfeito, a medida da estatura da plenitude de Cristo»5. Todos estamos chamados a ser santos. Esta vocação universal6 não é uma novidade. Já o apóstolo São Pedro, o primeiro Papa, exortava os primeiros cristãos a responder à sua vocação à santidade pondo todo empenho em assumir uma conduta digna de sua nova condição: «Como filhos obedientes, não consistais em modelar a vossa vida de acordo com as paixões de outrora, do tempo da vossa ignorância. Antes, como é santo aquele que vos chamou, tornai-vos também vós santos em todo o vosso comportamento, porque está escrito: Sede santos, porque eu sou santo»7.
O que é a metanóia?
A santidade é conseqüência e fruto da metanóia.
Metanóia é um termo grego que literalmente traduzido quer dizer “mudança de mentalidade”. O Senhor Jesus inicia seu ministério público convidando justamente à metanóia: «Convertei-vos (metanoeite) e crede na Boa Nova»8. Como vemos, esta expressão designa muito mais que uma mera “mudança de mentalidade”, designa uma conversão total da pessoa, uma profunda transformação interior. Quer dizer, «não se trata só de um distinto modo de pensar em nível intelectual, mas da revisão à luz dos critérios evangélicos das próprias convicções vitais.»9. A metanóia é uma mudança na mente e no coração, é a transformação radical que alcança o ser humano em sua realidade mais profunda, permitindo-lhe viver uma coerência cada vez maior entre a fé crida e a vida cotidiana.
A metanóia leva finalmente a viver a vida ativa segundo o desígnio divino.
Esta progressiva transformação interior cujo horizonte é a plena conformação com Cristo «não é somente uma obra humana»10: É sobre tudo uma obra do Espírito Santo em nós. O Espírito nos leva a mudar nosso interior, transformando nosso coração de pedra em um coração de carne11, levando-nos à configuração com o Senhor Jesus. Nossa tarefa é cooperar generosa e ativamente com a graça em nosso processo de crescimento e maturação espiritual, para que pela ação divina em nossos corações cresça em nós o “homem interior” e se transforme apostolicamente no cumprimento do Plano divino.
Meios concretos
O que posso fazer para viver este processo de conversão ou metanóia?
Como foi dito, embora requeira nossa livre e decidida resposta e cooperação, a progressiva configuração com Cristo é sobre tudo uma obra da graça em nossos corações. Por isso a primeira coisa que devo fazer cada dia é pedir a Deus que Ele me inspire e sustente em meus próprios esforços de conversão, para que me converta totalmente e me assemelhe cada vez mais com seu Filho, o Senhor Jesus. O primeiro pensamento que deve vir à minha mente assim que eu desperte de manhã deve ser semelhante a este: “Quero ser santo/a! Anseio configurar-me com Cristo, o Filho de Maria! Minha meta e meu horizonte é alcançar a plena maturidade em Cristo! Hoje, cooperando com a graça de Deus, quero caminhar um pouco mais para essa meta, converter-me um pouco mais, reconciliar-me um pouco mais, amar um pouco mais a Maria e ao Senhor Jesus, amar um pouco mais como Ele, crescer um pouco mais em santidade, para irradiar Cristo com meu testemunho, com minha caridade, com minhas palavras...” Então, e ao longo da jornada, posso repetir como jaculatória esta simples oração: “Converte-me, Senhor, para que eu me converta!”
E porque sem o Senhor e sem sua graça nada podemos, é também necessário o contínuo recurso aos sacramentos, fonte de graça abundante que o próprio Senhor nos deixou em sua Igreja. O sacramento do Batismo já fez de nós novas criaturas, nos transformou interiormente em homens e mulheres novos. Mas esse homem ou mulher nova deve crescer, fortalecer-se e amadurecer até alcançar a plenitude da vida de Cristo em nós12. Para nutrir-nos, fortalecer-nos e purificar-nos em nosso combate espiritual cotidiano, no contínuo empenho por converter-nos mais ao Senhor e ser santos como Ele é santo, Ele nos deixou o enorme tesouro da Eucaristia e o dom da Reconciliação sacramental.
Compreendemos também que a perseverança na oração é fundamental: quem não reza, reza mal ou reza pouco, dificilmente se converte. O Senhor não adverte que temos de vigiar e rezar para não cair em tentação?13 A oração perseverante14 é um meio fundamental para permanecer em comunhão com o Senhor e, a partir dessa permanência, poder desdobrar-nos, dando fruto abundante de conversão e santidade15. Fundamental é o encontro e colóquio com o Senhor no Santíssimo. Este e outros momentos fortes de oração são indispensáveis, pois são momentos privilegiados de encontro com Cristo nos quais refletimos e interiorizamos, da mesma forma que Maria, a palavra de Deus e os ensinamentos de seu Filho contidas no Evangelho, e nos nutrimos também de sua força para pôr em prática o que Ele nos diz. A meditação bíblica é, neste sentido, um instrumento privilegiado de transformação, pois ao calor do Encontro com o Senhor e da meditação de sua Palavra, me confronto com Ele e me pergunto: “O que Ele tem que me falta? O que eu tenho que me sobra?” Esta prática me leva a propor um meio concreto, realizável, que me ajude a despojar-me de algum vício ou pecado habitual e revestir-me de uma virtude que vejo no Senhor. Ao cumprir com esta resolução concreta estou cooperando eficazmente com a graça do Senhor no processo de minha própria conversão.
Outro meio fundamental para cooperar com o Espírito na obra de minha própria conversão é um planejamento ou estratégia de combate espiritual, com objetivos claros e com meios concretos e realizáveis. Devo conhecer-me para saber de que pecados ou vícios pecaminosos devo despojar-me e de que virtudes opostas tenho de revestir-me. Por onde começar? Os mestres espirituais recomendam planejar a estratégia de combate espiritual em torno do nosso vício dominante. Junto com esta proposta e o esforço por levá-la adiante, é oportuno revisar os pontos de meu combate espiritual cada semana, quinzena ou mês, fazendo uma avaliação para ajustar o necessário e renovar-me continuamente nos propósitos e meios.
É importante também perseverar no exercício diário do exame de consciência. Também este é um importantíssimo instrumento de transformação. É muito bom aplicar o exame de consciência particular no empenho de despojar-me de algum vício específico e revestir-me da virtude contrária.
CITAÇÕES PARA A ORAÇÃO
- A conversão é um convite a voltar para Deus, reconciliar-se com Ele: Jl 2,12-13;
- Deus quer nossa conversão e vida plena: Ez 18,23.
- O Senhor, o precursor, chama à conversão: Mt 3,1-2; O Senhor Jesus chama à conversão: Mc 1,15; Mt 4,17. Deus convida à conversão: At 17,30. Os apóstolos convidam à conversão: At 26,20.
- A conversão implica em abandonar a vida de pecado, tirar os obstáculos, despojar-se do homem velho: Eclo 17,25-26.29; e ao mesmo tempo revestir-se de Cristo, viver suas virtudes: 2Pe 1,4-7.
- A meta e horizonte da conversão é a santidade, a plenitude da vida de Cristo em nós: Gl 2,20; Fl 1,21; Ef 4,13.
Notas
- 1 S.S. Paulo VI, Evangelii nuntiandi, 10.
- 2 S.S. João Paulo II, Ecclesia in America, 26.
- 3 Ali mesmo, 28.
- 4 Ver S.S. João Paulo II, Ecclesia in America, 30.
- 5 Ef 4,13.
- 6 Ver Lumen Gentium, V.
- 7 1Pe 1, 14-16.
- 8 Mc 1,15.
- 9 S.S. João Paulo II, Ecclesia in America, 26.
- 10 Catecismo da Igreja Católica, 1428.
- 11 Ver Ez 36,26-27.
- 12 Ver Gl 2,20; Fl 1,21.
- 13 Ver Mc 14,38.
- 14 Ver Lc 18,1.
- 15 Ver Jo 15,4-5.
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