Leituras: Marcos 11, 1-10 (antes da Procissão de Ramos);
Isaías 50, 4-7;
Salmo 21 (22), 8-9.17-18a.19-20.23-24 (R/2a);
Carta de São Paulo aos Filipenses 2, 6-11;
Marcos 14, 1-15, 47 (mais longo);
Marcos 15, 1-39. (mais breve) (Paixão do Senhor).
COR LITÚRGICA: VERMELHO
(A assembléia se reúne na igreja, ou em outro lugar conveniente de onde sairá a procissão).
BÊNÇÂO DOS RAMOS
Refrão orante:
Hosana Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor!
Durante esta semana santa, teremos a oportunidade de considerar a dor humana em Jesus de diversas formas.
Dor que se tornou sofrimento no corpo e atingiu o coração do Senhor, como na traição e na angústia que sentiu diante da paixão.
Porém teremos uma certeza nesta semana: como Deus não abandonou seu Filho, também não vai nos abandonar.
1. Situando-nos
Com a celebração de hoje, entramos na Semana Santa.
O que é a Semana Santa?
Por que ela é tão importante na dinâmica do ano litúrgico?
Na Semana Santa celebramos a história da salvação de um Deus que se humilhou e tornou-se homem para caminhar conosco, conhecer a nossa história e nos apontar caminhos de vida. Mas não é só isso. No Getsênami, Jesus experimenta uma grande tristeza e sente a dor da angustia. Suspenso entre o céu e a terra numa cruz, ele vive o doloroso abandono por parte do Pai. Enfrenta a traição de Judas que, com um beijo, o entrega aos seus inimigos.
Pedro não o reconhece na presença de uma empregada. Os discípulos, seus amigos prediletos, fogem e o deixa sozinho nas mãos dos soldados. A condenação forjada é tramada para eliminar sua pessoa e os desígnios de Deus nele manifestos. Jesus, o Servo Sofredor, despido de toda dignidade é reduzido a um farrapo humano.
Essa experiência de Jesus na Semana Santa é a história viva da humanidade. Contemplando a paixão e morte de Jesus, fazemos memória dos sofrimentos, das injustiças e das violências experimentados por milhões de seres humanos. Ele assume e faz seus todos esses sofrimentos. Em sua morte e ressurreição, estão presentes todos os sofrimentos humanos.
A Semana Santa, tempo de comunhão e solidariedade com e em Jesus, é um tempo santo e precioso para entrarmos na Historia da Salvação e da Libertação. Somos convidados a tomar parte nesta história como agentes, como discípulos missionários, não permitindo que o pecado, que levou Jesus à morte e ainda destrói tantas vidas, invada o nosso ser e o nosso agir.
Nessa Semana, meditamos o Evangelho de Jesus, contemplamos sua prática, acolhemos sua proposta de doação e partilha, entramos em sua atitude de obediência ao Pai e de serviço à humanidade. Na oração da coleta, imploramos a graça da conversão e mudança de vida, dizendo ao Pai: “concedei-nos aprender o ensinamento da sua paixão e ressuscitar com ele em sua glória.
Unidos com toda a Igreja no Brasil, concluímos hoje a primeira etapa da Campanha da Fraternidade 2012. Além da nossa conscientização sobre o problema, os desafios e as perspectivas da saúde em nosso país hoje se fazem presentes. É o dia de realizarmos o gesto concreto, pois a CF se expressa concretamente pela oferta de doações em dinheiro, na Coleta da Solidariedade.
É um gesto concreto de fraternidade, partilha e solidariedade, feito em âmbito nacional, em todas as comunidades cristãs, paróquias e dioceses. A Coleta da Solidariedade é parte integrante da Campanha da Fraternidade. O gesto fraterno da oferta tem um caráter de conversão quaresmal, condição para que advenha um novo tempo marcado pelo amor e pela valorização da vida.
2. Recordando a Palavra
A leitura do profeta Isaías fala do Servo do Senhor ou Servo Sofredor. Quem é ele? Ele é o escolhido, dotado de dons, capaz de atrair e provocar a adesão dos ouvintes. Esses dons lhe são concedidos em vista da missão: transmitir uma mensagem a quem perdeu toda a confiança.
A característica mais surpreendente no personagem do Servo é sua inocência. Ele é um justo. No entanto, ele sofre e seu sofrimento é absolutamente imerecido.
A leitura mostra as disposições interiores do Servo do Senhor: vive na permanente escuta da Palavra de Deus; o coração e os ouvidos estão abertos para não deixar escapar nada do que o Senhor lhe revela.
A missão implica, porém, muitos sofrimentos. Sua pregação denuncia injustiças, atinge aqueles que exploram e escravizam, aponta a corrupção política e moral. Tudo isso lhe acarreta perseguição. Ele é flagelado e espezinhado. Qual sua reação? Resiste firme, não abre a boca, não reclama, mas confia no Senhor, porque sabe que ele está ao seu lado. Jesus é o Servo que dedicou sua vida para libertar e consolar os oprimidos.
Na história do Servo Sofredor e de Jesus, é fácil reconhecer a historia de todos os homens e mulheres que querem praticar e proclamar a justiça.
O evangelho nos mostra que Jesus aceitou livremente sua morte, porque compreendeu seu sentido. Ele se sabia inocente. Compreendia que a morte de um justo não podia ser senão o bem dos outros prostrados pelo pecado.
A segunda leitura projeta uma luz sobre a missão de Jesus Cristo, seu esvaziamento que nos valeu a salvação. A comunidade dos filipenses, amada e muito querido por Paulo, encontra-se em situações de ciumeiras, desavenças, fofocas, disputas de poder. Paulo reage com uma palavra forte: “Nada façais por espírito de partido ou vanglória, mas com humildade tende os outros como melhores” (Fl 2, 3-4).
Ele recorre a um hino muito antigo para fundamentar a intervenção de Deus nesta historia (Cf. Fl 2,6-11). O poema na forma de hino, que é proposto aos filipenses, comporta dois movimentos: o despojamento voluntário do Cristo (v.6-8) e sua elevação por Deus (v.9-11).
“O Cristo Jesus, ele que tinha a condição divina, não considerou o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente”. Parece haver um contraste entre o que vai fazer o Filho de Deus e o que Adão fez. O Cristo escolheu na terra a humildade e a obediência em vez do orgulho e da revolta de Adão que se quis fazer igual a Deus. E vós sereis como deuses, disse a serpente (cf. Gn 3,5).
“Ele se despojou assumindo a condição de servo”. É a Encarnação que é descrita como uma “Kénosis” (esvaziou-se a si mesmo). Essa “Kénosis” ou esvaziamento não implica que Jesus deixe de ser igual a Deus ou de ser a imagem de Deus. É em seu próprio esvaziamento que ele revela o ser e o amor de Deus.
Os cinco verbos seguintes descrevem esse esvaziamento: “assumindo a condição de servo, tornado semelhante aos homens e reconhecido como um homem em seu comportamento, ele humilhou-se a sai mesmo, fazendo-se obediente até a morte e morte de cruz”.
O movimento de elevação vem em seguida. “Por isso Deus o sobre-exaltou grandemente”. Do mesmo modo, como na parte anterior, o hino retoma as expressões que expõem o destino do misterioso Servo do Livro de Isaías. A elevação está ligada com a ressurreição ou a ascensão, que é a ação soberana do Pai. O paralelo deve ser feito com o lirismo do Livro da Consolação: Eis que meu Servo há de prosperar, ele se elevará, será exaltado, será posto nas alturas (cf. Is 52,13).
A entrada de Jesus em Jerusalém é descrita por Marcos com todas as características de uma reportagem enriquecida por um diálogo com os donos do burrinho, não faltando um colorido político pela aclamação do povo. Não se fala do “filho de Davi”, mas do “reino do pai Davi”.
A narração da Paixão segundo Marcos é a narração mais breve e mais antiga. Marcos esteve dando importância às testemunhas oculares destes fatos. Jesus apresenta-se em toda a sua fragilidade humana, entregue a solidão, à angústia.
Mas, com sua morte, é manifestada sua divindade nas palavras do centurião romano: “verdadeiramente este homem era Filho de Deus”. Durante o processo que foi movido, Jesus guarda silêncio, confiando unicamente em Deus, a quem no Horto das Oliveiras chama “Abba” (paizinho).
O Evangelho de Marcos é o que com mais realismo e até com certa crueldade nos narra a paixão de Jesus. Ele realiza e vive uma paixão física, que atinge todo o seu corpo; mas também uma paixão do coração. No Getsênami, Jesus sofre pavor, angústia, tristeza e é preso e amarrado com violência pelo povo que veio a ele com espada e paus, dando-lhes bofetadas.
No pretório, os soldados romanos teceram uma coroa de espinhos e colocaram-se sobre sua cabeça. Aí mesmo, lhe golpearam na cabeça com uma vara, lhe cuspiam e, colocando-se de joelhos, lhe faziam reverência. Depois o crucificaram. O evangelista termina o relato dizendo que Jesus, dando um forte grito, expirou. Grito de dor, grito que resume toda a paixão: do corpo e do coração.
Como se comportam os seus? Judas, o trai, Pedro o nega, todos os discípulos o abandonam e fogem. As autoridades também agem de forma violenta e brutal. Jesus, o inocente, é julgado e condenado. Ele, o Senhor, é esbofeteado por um servo, escarnecido pelo soldado, objeto de zombaria do povo.
Este evangelho, descrevendo o realismo da paixão de Jesus, não nos pode deixar indiferentes.
3. Atualizando a Palavra
A Palavra que ouvimos na celebração de hoje é muito forte. Ela nos confronta com nossa própria fé, com o modo como a vivemos e testemunhamos. No evangelho que segue a benção dos ramos, vemos Jesus a caminho de Jerusalém. Em que ponto deste caminho nós estamos? Estamos à frente, atrás ou nos mantemos à beira da estrada? Exultamos convictos: “bendito o que vem em nosso Senhor” ou o fazemos superficialmente, levados pelo “embalo da multidão”.
Não basta clamar “bendito o que em vem nome do Senhor”. Urge agir e ser para que efetivamente haja espaço para ele se tornar presente em nossa sociedade. Há varias formas de buscar o que isto se realiza, uma delas é nos fazermos portadores da paz, que é fruto da justiça. É assumir, apesar de todas as pedras no caminho, o chamado que nos é feito e, a exemplo do servo sofredor, poder dizer: “Não lhe resisti nem voltei a trás... Sei que não sairei humilhado”.
Esta certeza nos é reforçada pelo próprio Cristo que se esvaziou, se humilhou e depois foi por Deus Pai exaltado. Participar da Eucaristia significa viver o mistério de Jesus Cristo em sua totalidade. Hoje, porém, somos chamados a viver mais intensamente sua paixão e morte e, com o hino da Campanha da Fraternidade, reafirmar: “Tu, que vieste para que todos tenham vida, cura teu povo dessa dor em que se encerra; que a fé nos salve e nos dê força nessa lida, e que a saúde se difunda sobre a terra”.
O Evangelho da Paixão nos conduz à contemplação. O sofrimento intenso de Jesus nos faz ver o quanto o projeto de amor e paz que ele trouxe entra em choque com o contexto mundano. A grande lição da Paixão é a da paciência em meio às provações. Dedução muito fácil de fazer, mas difícil de por em prática. Somos convidados à firmeza de Jesus em meio às contrariedades.
É preciso ousar fazer o mesmo que fez Paulo, que não hesitou em recomendar a contemplação do próprio mistério da Kénosis para animar a vida quotidiana dos cristãos. A humildade, à imagem do Cristo, contribui para a qualidade de vida entre os membros da comunidade. “Tende um mesmo amor, numa só alma, num só pensamento, nada façais por competição e vanglória, mas com humildade, julgando os outros como superiores a si mesmo, não visando ao próprio interesse, mas ao dos outros. Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus” (Fl 2,2-5).
4. Ligando a Palavra com ação litúrgica
A celebração do Domingo de Ramos nos coloca em um ambiente de contraste entre a exaltação da chegada de Jesus a Jerusalém e sua paixão e morte. Sacudidos pelo contexto divergente destes dois polos, pedimos ao Pai “concedei-nos aprender o ensinamento da sua paixão e ressuscitar com ele em sua glória” (oração do dia).
Na última Ceia, Jesus faz um gesto solene, que ficará como o mais conhecido por simbolizar sua morte e que nos toca ainda agora. Oferece pão e vinho como sacramento do que ele vive interiormente na hora de morrer. A palavra sobre o cálice é muito clara: “Isto é meu sangue, o sangue da aliança, que vai ser derramado em favor de muitos” (Mc 14,24).
Sim, Jesus sentia-se muito só nesse momento. Mas ele realiza um gesto de partilha, mostrando que sua morte será vivida em comunhão com todos os homens. Mas ainda, o ouvimos falar de muitos. Antes havia declarado: O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos (cf. Mc 10,45).
Outrora, Moisés aspergiu com sangue os israelitas membros da aliança do Sinai (cf. Ex 24,8). Hoje, Jesus diz que o sangue derramado em sua Paixão simboliza também a aliança, desta vez, estendida misticamente a todos. A morte de Jesus criou vínculos novos de fraternidade entre os homens.
Todo sentido do sacrifício de Jesus emerge na oração sobre as oferendas e no prefácio quando, pela voz de quem preside, dizemos: “ó Deus, pela paixão de nosso Senhor Jesus Cristo, sejamos reconciliados convosco, de modo que, ajudados pela vossa misericórdia, alcancemos pelo sacrifício de vosso Filho o perdão que não merecemos por nossas obras”.
E também afirmamos “sua morte apagou nossos pecados e sua ressurreição nos trouxe a vida”.
Com esta celebração, inicia-se a Semana Santa durante a qual, incessantemente, pediremos ao Pai: “como pela morte de vosso Filho nos destes esperar o que cremos, dai-nos pela sua ressurreição alcançar o que buscamos” (Oração após a comunhão).
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