Não existem portas fechadas que não possam ser superadas
O Cristianismo se espalhou a partir de um grupo
de discípulos escolhidos por Jesus, cuja missão desafiadora era desproporcional
às suas capacidades humanas. O ambiente judaico da época e o poder romano, que
dominava o quadro cultural em que se encontravam, não lhes eram propícios para
divulgarem a Boa Nova do Evangelho. No entanto, pessoas limitadas se puseram a
falar de Jesus Cristo e a proclamar que Ele está vivo. A perseguição
desencadeada nos anos que se sucederam provocou a chamada “diáspora”, dispersão
que se revelou providencial, pois fez com que o Evangelho chegasse a rincões
mais distantes. Até hoje, cada situação adversa é oportunidade – Kairós –
aproveitado por Deus, para novas oportunidades para testemunhar o nome de
Cristo. O resultado aí está, com a presença da Igreja em toda parte, malgrado
todas as dificuldades encontradas no correr dos séculos.
Já nos primeiros séculos, escritores cristãos
deixaram o testemunho do caminho seguido para o crescimento da Igreja: “Depois
de receberem a força do Espírito Santo com o dom de falar e de realizar
milagres, os apóstolos começaram a dar testemunho da fé em Jesus Cristo na
Judéia, onde fundaram Igrejas; partiram em seguida por todo o mundo, proclamando
a mesma doutrina e a mesma fé entre os povos. Em cada cidade por onde passaram
fundaram Igrejas, nas quais outras Igrejas que se fundaram e continuam a ser
fundadas foram buscar mudas de fé e sementes de doutrina. Por esta razão, são
também consideradas apostólicas, porque descendem das Igrejas dos apóstolos.
Apesar de serem tão numerosas e tão importantes,
estas Igrejas não formam senão uma só Igreja: a primeira, que foi fundada pelos
apóstolos e que é origem de todas as outras. Assim, todas elas são primeiras e
apostólicas, porque todas formam uma só. A comunhão na paz, a mesma linguagem da
fraternidade e os laços de hospitalidade manifestam a sua unidade. Estes
direitos só têm uma razão de ser: a unidade da mesma tradição sacramental” (Do
Tratado sobre a prescrição dos hereges, de Tertuliano, presbítero, capítulo 20 –
Século III). A “certidão de nascimento” de uma comunidade cristã é dada pelo
laço da sucessão apostólica, que a liga aos primórdios da fé cristã.
Nosso tempo é de pluralismo, por isso exige
testemunho mais qualificado dos cristãos. A Igreja pede, em sua oração, que no
tempo da renovação da festa pascal, quando o Senhor reacende a fé em Seu povo,
estes compreendam melhor o batismo que os lavou, o Espírito que lhes deu nova
vida e o Sangue que os redimiu (Cf. Oração do dia do Segundo Domingo da Páscoa).
É que não lhes é lícito esmorecer diante de qualquer situação. Antes, cabe-lhes
exercitar a criatividade suscitada pelo Espírito Santo a fim de fermentarem de
novo e sempre os ambientes em que se encontram.
Após a Ressurreição, o Senhor Jesus Cristo
apareceu aos Apóstolos (cf. Jo 20,19-31), estando “as portas fechadas”.
Comunicou-lhes Sua paz, confirmou-lhes a fé, fazendo-os superar o medo das
chagas – agora gloriosas! – entregou-lhes a missão de serem portadores da
misericórdia infinita com que quer restaurar a vida dos homens e mulheres de
todos os tempos com o sacramento do perdão. Enfim, deu-lhes “instrumentos de
trabalho”. Dali para frente, as mudas da fé foram plantadas em toda parte e não
existem portas fechadas que não possam ser superadas. Não é necessário nem
conveniente ou permitido usar as armas da violência, do engodo ou da mentira.
Basta anunciar Jesus Cristo, pois só Ele pode converter os corações.
Formaram-se as primeiras comunidades cristãs (Cf.
At 2, 42-47; At 4, 32-35; At 5,12-16), como relatam os Atos dos Apóstolos.
Perseverança na escuta da Palavra de Deus, na Oração, na Eucaristia e na
Partilha dos bens. E em toda a sua história, a Igreja constatou que os bens,
quando partilhados, se multiplicam. É a lógica de Deus, diferente do que o senso
comum possa oferecer! Todas as gerações de cristãos se descobriram chamadas à
fraternidade, lenir as chagas e suscitar obras com as quais os mais frágeis da
sociedade são por eles acolhidos e promovidos. Venha à luz, de forma especial, o
que os cristãos fazem, ao lado de outras forças da sociedade, para defender a
vida do nascituro, ou a Pastoral da Criança, as grandes obras de acolhimento às
pessoas com necessidades especiais ou as instituições que cuidam da saúde dos
mais pobres.
E em tempos como o nosso, em que o valor da vida
é vilipendiado e a verdade relativizada, continua verdadeira a afirmação do
Apóstolo São João: “A vitória que vence o mundo é a nossa fé” (I Jo 5,4).
Vitória para o cristão não é a destruição do adversário! É que, amado, este se
transforma! Os valores pelos quais lutam os cristãos são o que existe de melhor
para a humanidade! Não a destroem ou impedem a felicidade. Eles são chamados a
ser diferentes, mas para melhor, no rumo de realização plena para todos, sem
exceção.
- – -Dom Alberto Taveira
Corrêa
Arcebispo de Belém – PA
Arcebispo de Belém – PA
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