sexta-feira, 27 de abril de 2012

TEMPOS DIFÍCEIS PARA OS SÍMBOLOS CRISTÃOS


Cada época oferece dificuldades à vivência da mensagem cristã. A História da Igreja confirma isso. Há sempre problemas internos e externos a serem resolvidos e superados. Existem perseguições até o martírio, difamações, conspirações e distorções.
Também hoje a barca de Jesus com os discípulos segue seu rumo, porém, em meio às tempestades e aos momentos de bonança (Mt 8,23-26). A Palavra do Mestre a Pedro a respeito da Igreja tem valor perene: “as portas do inferno nunca prevalecerão” (Mt 16,18). Inspira confiança. Não visa à ufania ou à apologia, no entanto, consola a Igreja que sofre.

O certo é que os tempos, quando difíceis, são desafiadores e estimuladores. Servem para provar a fé, fundada na Cruz e na ressurreição do Senhor, e intensificá-la. Favorecem a sua pedagogia, purificam-na pelo amor, exercitam o perdão. São Paulo comprovou em sua experiência pessoal e deixou por escrito seu testemunho: “quando sou fraco, então é que sou forte” (2Cor 12,10). Trata-se de confiança na ação da graça vitoriosa, tema que muito apreciava. Quando há sofrimento, é grande a esperança que engendra o futuro melhor.
Tais ressonâncias bíblicas ocorrem devido às dificuldades em relação ao uso, e até o abuso e a distorção da simbologia católica no Brasil contemporâneo e em outros países.
Recentemente, a presidência da CNBB advertiu sobre o uso de termos da Igreja Católica por aqueles que, não sendo católicos, se autoproclamam, com o objetivo de enganar as pessoas simples e ingênuas. Estas não sabem ou não tem condições de distinguir o que é realmente católico.

Diz a nota: “O uso de nomes, termos, símbolos e instituições próprios da Igreja Católica Apostólica Romana, por outras denominações religiosas distintas da mesma, pode gerar equívocos e confusões entre os fiéis católicos. Nestes casos, o uso da palavra ‘católico’,‘bispo diocesano’, ‘vigário episcopal’, ‘diocese’, ‘clero’, ‘catedral’ ‘paróquia’, ‘padre’, ‘diácono’, ‘frei’ pode induzir a engano e erro”.

Embora a nota cite a Igreja Católica Carismática de Belém, sabemos que há outras denominações que procedem de modo semelhante. Por ocasião do Censo 2010 do IBGE, já se alertava para a distorção numérica da geofísica da Igreja no Brasil, pois havia 26 denominações intituladas de católicas. Hoje, provavelmente o número aumentou.
Para deliberadamente se confundirem com o catolicismo romano, algumas denominações se apresentavam e, talvez ainda se apresentem, como sendo Catolicismo Apostólico Romano ou Católica Apostólica Brasileira. Para se confundirem com o Movimento da Renovação Carismática Católica, algumas se denominam: Católica Apostólica Carismática; Católica Carismática do Brasil; Católica Renovação Carismática; ou ainda Católica Pentecostal.
Agressão ao sagrado
Em pleno tempo de Natal, a Arquidiocese do Rio de Janeiro foi surpreendida com o convite para a participação na M.I.S.S.A. do Galo. São perceptíveis os pontos entre as letras da palavra missa, ato de culto mais importante e vinculativo do catolicismo, memorial da redenção. Os pontos eram acentuações ou chamariz para uma festa que usaria objetos e utensílios da sagrada liturgia católica e manipulava seus símbolos. O DJ se vestiria de padre e as recepcionistas de freiras. Haveria diabinhos e anjinhos e até a santa cruz do Redentor seria usada como enfeite.
Qual o objetivo de tudo isto? Debochar do sagrado e ridicularizar a fé? Certamente. Ganhar dinheiro? Seguramente. Os patrocinadores sabiam que havia público, ávido de novidades, e pretendiam se acobertar no silêncio dos indiferentes. Foi possível deter a tempo com o recurso à Justiça.

Como há males que vem para o bem, podemos agora refletir. Como dizia Paul Ricoeur: “o símbolo dá a pensar”.Portanto, chegou a hora de estudá-lo com nosso povo porque a simbologia católica compreende e expressa à fé, especialmente através da simbologia litúrgica e devocional. Ricoeur também afirmara que “a fé dá a pensar” e esta, como sabemos, está vinculada aos símbolos, muitos deles tirados da Sagrada Escritura.
É pedagogia muito recomendada na catequese de crianças, jovens e adultos, na preparação da recepção dos sacramentos, no ensino religioso nas escolas, na evangelização de um modo geral, adentrar na fé e na religião através do mundo dos símbolos. A beleza do significado simbólico fascina e humaniza.

A agressão ao sagrado através do ridículo e do deboche é, antes de tudo, um problema ético para quem professa ou não uma religião. Manifesta ódio, rancor, intolerância, ressentimento e desrespeito. Pode com o tempo levar a atitudes mais agressivas e destrutivas contra pessoas e templos, como se observa em alguns lugares do mundo. A rejeição da simbologia religiosa do outro desumaniza, bloqueia o diálogo e a compreensão e a aceitação do diferente e do novo. Embrutece as relações sociais já bastante desafiadas e comprometidas por várias formas de hostilidade e de violência.
A permanência da simbologia cristã nos espaços culturais secularizados é instigante e mereceria um estudo aprofundado. Nestas breves indicações, temos como pano de fundo a vasta insistência do bem-aventurado João Paulo II sobre a necessidade de nova evangelização com novo ardor e nova metodologia e, sobretudo, a evangelização da cultura contemporânea, muitas vezes expressão de contracultura.

Na sociedade de consumo em que vivemos, não são mais os ritos e a simbologia que marcam o ritmo do tempo, são os ritos secularizados, bons e atraentes. Existe o cinema, a partida de futebol e outros esportes, os programas de TV, passeios, viagens, o convívio com parentes e amigos, a visita aos doentes. Eis o sentido do domingo e de outros feriados dos dias santificados. A missa não é mais o centro para a maioria declarada de católicos. A vida secularizada secularizou os símbolos e atos humanos.
Quem avalia o Natal e a Páscoa é o mercado. Em determinada loja da cidade já era Natal antes do Natal. O Papai Noel, muitas vezes criticado, tornou-se tão inocente e ingênuo diante de certas celebrações de comilança, de bebedeira e de devassidão, que envergonhariam os antigos e depravados pagãos. Explica-se por que os símbolos que impregnam a cultura cristã são desrespeitados até ao deboche da missa“pontilhada”. É a perda do sentido do sagrado.

O bom uso da nossa simbologia, além de “mais alta”, há de ser eficaz se relevar o germe da esperança, o testemunho da fé e o ardor da caridade, e se for retomada com a beleza da origem de seu significado, proveniente de Cristo Jesus. Se permanecer símbolo cristão, eleva à oração e projeta para a meta final. Eis nossa identidade.


Por Dom Edson de Castro Homem
Bispo auxiliar da Arquidiocese do Rio de Janeiro/RJ




por
Revista Shalom Maná - Ed. Shalom

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