Por
60 anos, a verdade sobre a batalha do Papa Pio XII contra o nazismo tem
sido suprimida. Mas novas evidências tornam inegável o seu heroísmo.
Passou despercebido pela imprensa mundial, mas uma notável reviravolta
ocorreu recentemente nos estudos sobre o Holocausto. Quase dois anos
atrás, a Fundação Internacional Wallenberg, um instituto de pesquisa
histórica, iniciou um "projeto modesto": marcar as "Casas da Vida" —
lugares onde judeus eram protegidos durante a guerra — com uma placa
memorial. Foram encontradas mais de 500 casas como essas na Itália,
França, Hungria, Bélgica e Polônia. Eduardo Eurnekian, presidente da
fundação, escreveu que, "para nossa surpresa, descobrimos que a esmagadora maioria das Casas da Vida eram instituições relacionadas à Igreja Católica, incluindo conventos, mosteiros, internatos, hospitais etc".
Em Roma apenas, quase 4.500 pessoas encontraram refúgio em igrejas,
conventos, mosteiros e internatos. Em Varsóvia, a Igreja de Todos os
Santos protegeu judeus. Isso é notável porque a pena para poloneses que
abrigassem judeus era o campo de extermínio ou, mais provavelmente, a
execução sumária.
Que uma fundação nomeada após Raoul Wallenberg encontre uma colaboração
católica tão ampla para salvar a vida de judeus, é coisa muitíssimo
apropriada. Wallenberg foi um diplomata sueco em Budapeste durante a
guerra. Ele e Angelo Rotta, o núncio papal, salvaram 120 mil dos 150 mil
judeus da cidade. Wallenberg foi preso pela Guarda Vermelha e nunca
mais visto.
As notícias sobre as Casas da Vida só são surpreendentes porque a
verdade sobre a Igreja e o povo judeu na II Guerra Mundial tem sido
escondida. Vários ajudantes do Papa da época da guerra, Pio XII,
reconhecem que trabalharam para resgatar judeus sob instruções diretas
do pontífice. Eles ainda incluíram dois futuros papas — Mons. Angelo
Roncalli (João XXIII) e Mons. Giovanni Battista Montini (Paulo VI). Pio
XII mesmo protegeu judeus tanto no próprio Vaticano como em Castel
Gandolfo.
Este é um bom momento para marcar o testemunho da Igreja contra o
nazismo. Oitenta anos atrás, a 14 de março de 1937, Pio XI publicou Mit Brennender Sorge ("Com grande preocupação), uma encíclica, propositalmente escrita em alemão, condenando o nazismo. "Quem
quer que exalte a raça, ou o povo, ou o Estado, e divinize-os a um
nível idolátrico, perverte a ordem do mundo criado por Deus", escreveu o Papa.
O secretário de Estado de Pio XI era o Cardeal Pacelli, futuro Pio XII.
Ele distribuiu secretamente o texto, que ajudara a redigir, dentro da
Alemanha. Quatro anos antes, ele havia negociado uma concordata entre a
Santa Sé e a Alemanha, não para apaziguar o nazismo, mas para ter algum
meio de conter os nazistas através de um tratado internacional. O regime
referia-se a ele como um "amante de judeus". Pacelli fez mais de 50
protestos contra a política nazista, nos dias que antecederam a
aprovação da Lei de Concessão, que garantiu a Hitler o poder para
decretar leis sem a aprovação do Reichstag. Pacelli foi considerado tão
anti-nazista que o III Reich tentou impedir a sua eleição como papa em
1939.
A história pessoal de Pacelli é importante. Ele era um amante da
cultura germânica — e, igualmente, da cultura judaica — desde sua
juventude. Como núncio na Bavária durante a breve república comunista de
1919, demonstrou sua coragem pessoal, permanecendo em seu posto. Sua
simpatia e amizade com judeus, incluindo o grande maestro Bruno Walter,
era bem conhecida, e ele concedeu auxílios discretos a muitos. A pedido
de Walter, conseguiu a liberdade de um músico, Ossip Babrilowitsch,
preso em um massacre (pogrom) enquanto a Bavária estava sob o
domínio comunista. Em segurança na América, Gabrilowitsch tornou-se o
diretor e fundador musical da Orquestra Sinfônica de Detroit. Walter,
por sua vez, tornou-se católico.
Antes da guerra, Pacelli assumiu riscos extraordinários para ajudar a
oposição alemã. Ele sabia que os generais estavam planejando um ataque
contra Hitler, e fez com que notícias de suas intenções chegassem ao
governo britânico.
Em uma situação de grande dificuldade, Pio XII fez o que ninguém mais
fez para salvar a vida de judeus durante a guerra. Ele bem sabia o que
realmente estava acontecendo ao povo judeu. Naquela época, muitos
estavam na defensiva, incluindo um diplomata britânico que escreveu
sobre "estes judeus queixosos". Nem o Reino Unido, nem a América
facilitaram a fuga de judeus para o exílio — o Kindertransport foi uma abençoada exceção.
Nos anos da guerra, Pio XII atuou diretamente na Itália e por meio de
diplomatas papais na Romênia, Hungria, Eslováquia e outros lugares. Não
surpreendentemente, dadas as circunstâncias, não há nenhum número exato
daqueles que foram salvos pelo Papa ou pela Igreja de um jeito ou de
outro. Talvez tenha sido algo entre 500 e 860 mil.
As declarações de Pio XII tanto antes como durante a guerra eram inequivocamente hostis ao nazismo. Os Aliados podiam querer mais, mas o preço seria o fim de todo o bem que o Papa podia fazer.
Os nazistas entendiam os pronunciamentos dele muito bem. Um plano para
sequestrá-lo em 1944 foi apenas evitado pela improvável intervenção do
general da SS Karl Wolff.
O Papa foi também completamente claro sobre os males do comunismo e da
viciosa perseguição religiosa dos stalinistas. Mas não disse nada sobre
isso durante a guerra. Os diplomatas aliados no Vaticano entenderem
isso, pois só preservando a neutralidade da Santa Sé o Papa podia
conceder refúgio a milhares de judeus em casas religiosas na Itália e
mesmo no Vaticano. Isso também lhe permitiu manter contatos a fim de que
informações sobre os prisioneiros de guerra e do Holocausto pudessem
chegar aos Aliados.
Tudo isso era conhecido durante e após a guerra, inclusive por judeus.
Albert Einstein, que escapou do regime nazista, disse em 1940: "Somente a
Igreja permaneceu firmemente do outro lado da campanha de Hitler para
suprimir a verdade… Eu sou obrigado, portanto, a confessar que agora
louvo sem reservas o que uma vez eu desprezei".
Chaim Weizmann, primeiro presidente de Israel, e Isaac Herzog, líder
dos rabinos de Israel, prestaram igualmente generosos tributos a
Pacelli. Israel Zolli, chefe dos rabinos de Roma, tornou-se católico e,
em homenagem ao Papa, tomou o nome cristão de "Eugênio". Depois da morte
de Pio XII em 1958, Golda Meir, então ministra israelita das relações
exteriores, escreveu: "Nós choramos um grande servo da paz".
Os nazistas odiavam a Igreja. Milhares de padres
católicos foram aprisionados, especialmente em Dachau, o "campo dos
padres". É verdade que alguns bispos seguiram uma política de
apaziguamento: o Cardeal Adolf Bertram de Breslau supostamente teria
ordenado um missa de Requiem para Hitler, em 1945. Alguns
católicos traíram judeus e chegaram a massacrá-los, como em Jedwabne, em
1941. Mas outros, notavelmente o bispo Clemens August von Galen, de
Münster, e o bispo Konrad von Preysing, de Berlim, fizeram tudo que
podiam para resistir ao nazismo. O agente de Preysing e cura da Catedral
de Berlim, Bernhard Lichtenberg, foi judicialmente morto e agora é
reconhecido como um mártir.
Passados quase 60 anos, no entanto, desde a morte de Pio XII, sua
reputação tem sido manchada. Exemplo recente foi uma reportagem da BBC
que relacionou a oração silenciosa do Papa Francisco em Auschwitz a um
ato de reparação pelo silêncio da Igreja Católica. A corporação estava
simplesmente repetindo aquilo que se tornou a visão comum sobre Pio XII e
a Igreja durante a guerra. (Como se chegou a esse equívoco é uma longa
história, que já foi contada aqui no site outras vezes.)
Deixemos, entretanto, a última palavra para o próprio Papa Pio XII. Em
1943, ele escreveu: "Chegará o momento em que documentos não publicados
sobre esta terrível guerra serão tornados públicos. Então, a tolice de
todas as acusações se tornarão tão claras como a luz do dia. Sua origem não é a ignorância, mas o desprezo pela Igreja".
Naquela época, o Papa estava se referindo à propaganda nazista. Mas
suas palavras se aplicam igualmente bem às calúnias maliciosas contra
ele lançadas nos últimos 60 anos.
Fonte: Catholic Herald | Tradução e adaptação: Equipe Christo Nihil Praeponere
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