Nosso Senhor, quando desceu a este mundo, não veio para os justos, mas para os pecadores.
Quantas vezes, examinando a nossa consciência, não nos angustiamos com
as ofensas que já cometemos contra Deus! Talvez sejam pecados passados, e
até já confessados; podem ser quedas que experimentamos ainda agora em
nossa caminhada... Em um instante, porém, parece que todos os nossos
erros vêm à tona e sentimo-nos frágeis e impotentes diante do mal,
incapazes de levantar a cabeça e seguir em frente, rumo ao Céu.
Quando observamos as Sagradas Escrituras e a Tradição da Igreja, no entanto, encontramos um grande alívio para a nossa alma. É a certeza de que não estamos sozinhos.
As tristezas e interrogações que acometeram os grandes santos e santas
de Deus são capazes de lançar uma luz extraordinária no nosso próprio
sofrimento. Basta ler um pouco de suas histórias e de seus escritos para
que imediatamente sejamos consolados e o nosso coração seja apaziguado.
Mais do que isso, a grande família dos servos de Deus nos precede no
Céu. Por isso, o que ela tem a oferecer-nos é muito maior do que algumas
letras impressas nas páginas de algum livro antigo. Nossa união com os
santos – ensina-nos o Catecismo da Igreja Católica (§ 946-962) – é uma
verdadeira comunhão espiritual. Como "nada nos pode separar do amor de
Deus" (Rm 8, 38), eles intercedem por nós e verdadeiramente nos auxiliam em nossos combates nesta terra.
Assim, quem está com a consciência manchada pelo pecado é chamado a
recordar, por exemplo, o Salmo 50, composto por ninguém menos que Santo
Davi, o rei do Antigo Testamento.
Nesta obra-prima da literatura religiosa, o salmista aflito pede que a
misericórdia de Deus apague o seu pecado, o qual está sempre diante
dele. Oferecemos abaixo a tradução que consta na Liturgia das Horas.
Aproveite para rezar com o Autor Sagrado:
"Tende piedade, ó meu Deus, misericórdia!
Na imensidão de vosso amor, purificai-me!
Lavai-me todo inteiro do pecado,
e apagai completamente a minha culpa!
Eu reconheço toda a minha iniquidade,
o meu pecado está sempre à minha frente.
Foi contra vós, só contra vós, que eu pequei,
e pratiquei o que é mau aos vossos olhos!
Mostrais assim quanto sois justo na sentença,
e quanto é reto o julgamento que fazeis.
Vede, Senhor, que eu nasci na iniquidade
e pecador já minha mãe me concebeu.
Mas vós amais os corações que são sinceros,
na intimidade me ensinais sabedoria.
Aspergi-me e serei puro do pecado,
e mais branco do que a neve ficarei.
Fazei-me ouvir cantos de festa e de alegria,
e exultarão estes meus ossos que esmagastes.
Desviai o vosso olhar dos meus pecados
e apagai todas as minhas transgressões!
Criai em mim um coração que seja puro,
dai-me de novo um espírito decidido.
Ó Senhor, não me afasteis de vossa face,
nem retireis de mim o vosso Santo Espírito!
Dai-me de novo a alegria de ser salvo
e confirmai-me com espírito generoso!
Ensinarei vosso caminho aos pecadores,
e para vós se voltarão os transviados.
Da morte como pena, libertai-me,
e minha língua exaltará vossa justiça!
Abri meus lábios, ó Senhor, para cantar,
e minha boca anunciará vosso louvor!
Pois não são de vosso agrado os sacrifícios,
e, se oferto um holocausto, o rejeitais.
Meu sacrifício é minha alma penitente,
não desprezeis um coração arrependido!
Sede benigno com Sião, por vossa graça,
reconstruí Jerusalém e os seus muros!
E aceitareis o verdadeiro sacrifício,
os holocaustos e oblações em vosso altar!" (Sl 50, 3-21)
Esse belo texto bíblico merece uma meditação profunda, porque descreve
de modo exato a situação em que se encontram muitas almas, atormentadas
pelas "cabeçadas na parede" que deram durante a vida.
O que fazer com os nossos pecados?
A primeira coisa a fazer com os nossos pecados é indicada por Santa
Teresinha do Menino Jesus: devemos lançar todos eles na fornalha ardente
do amor de Deus [1]. Diante do mal que cometeu, o cristão deve dar o
passo do rei Davi, que reconheceu a sua iniquidade e implorou o perdão
divino. O pecador verdadeiramente arrependido, comenta Orígenes, "se
inquieta e se aflige devido ao seu pecado". Ao contrário, "há quem,
depois de ter pecado, se sinta completamente tranquilo e não se preocupe
com o seu pecado nem tocado pela consciência do mal cometido, mas viva
como se nada tivesse acontecido. Sem dúvida, esse não poderia dizer: Tenho sempre consciência do meu pecado (Sl 50, 5)" [2].
"Foi contra vós, só contra vós que eu pequei", ajunta Davi. Com isso, o
salmista aponta o destinatário de sua prece e, ao mesmo tempo, o único
que lhe pode trazer a reconciliação: Deus. Por isso, quando erramos, não
nos basta o conforto humano. Um ombro amigo e as palavras de um
psicólogo podem ser muito úteis, mas não substituem a nossa relação
íntima com Cristo. Para readquirir a paz da alma, é preciso muito mais
do que os ouvidos dos homens, incapazes que são de perdoar os nossos
pecados.
"E a Confissão, então, o que é?", alguém pode perguntar. A Confissão –
entenda-se, aos sacerdotes da Igreja – é o remédio que o próprio Cristo
encontrou para, ao mesmo tempo, dispensar o perdão divino e saciar o
nosso anseio por consolo humano. Nas mãos que traçam o sinal da Cruz e
dizem: "Eu te absolvo dos teus pecados", estão as próprias mãos do Redentor, porque Ele mesmo prometeu a Sua assistência aos padres da Igreja (cf. Jo 20,
22-23). O protestante que diz se trancar no quarto para "confessar
diretamente a Deus" certamente pode ser perdoado, mas nunca receberá o
alívio de ouvir da boca de um verdadeiro ministro e representante de
Deus, que os seus pecados foram realmente apagados e que a sua alma,
agora, passou do vermelho escarlate ao branco da neve (cf. Sl 50, 9).
Este é, pois, o primeiro passo a tomar: arrepender-se, propor-se firmemente a não mais pecar e acusar os próprios pecados diante de Deus e da Igreja.
Mas, para restaurar plenamente a nossa comunhão com Deus, é preciso ir
além. A palavra "penitência" – que as pessoas geralmente usam para
designar os Pai-nossos e as Ave-Marias que os sacerdotes nos mandam
rezar após a Confissão – diz respeito a uma atitude interior, que devemos manter continuamente viva em nosso coração. É por isso que Davi diz que o seu pecado está sempre
à sua frente. Devemos ter as nossas faltas a todo momento diante de
nós, seja para não as cometermos de novo, seja para lembrarmos que somos
sempre necessitados, mendigos da misericórdia do Senhor.
Isso, porém, não significa, de jeito nenhum, "chorar sobre o leite
derramado". Há pessoas que, mesmo depois de terem recebido o perdão de
Deus – que verdadeiramente absolve os pecados no tribunal do sacramento
da Confissão –, ainda ficam remoendo as suas culpas, incapazes que são
de se perdoarem a si mesmas.
Para elas, é preciso lembrar a vida dos grandes santos que, antes de se
determinarem realmente por Deus, eram em verdade grandes pecadores.
Quem nunca ouviu, por exemplo, a história de Santo Agostinho? São
Jerônimo, como ele mesmo conta,
não era mais virgem depois que começou a seguir a Cristo. Santa Maria
Egipcíaca, depois de muitos anos na prostituição, abandonou tudo e viveu
uma invejável vida de penitência no deserto... O bem-aventurado Bártolo
Longo chegou a ser sacerdote satânico antes de se converter!
Como esses, há tantos outros exemplos, não só na história da Igreja,
como nos próprios Evangelhos: afinal, quem foi Maria Madalena, antes de
ser santa; quem era Zaqueu, antes de conhecer Nosso Senhor?
Mais importante que o nosso passado, porém, é o que Deus, em Sua
providência maravilhosa, reserva para cada um de nós. Por isso, é
preciso concordar com Oscar Wilde, quando diz que "todo santo tem um passado e todo pecador tem um futuro" [3].
Você, que lê estas linhas e tem verdadeiramente horror pelos seus pecados, acredite firmemente que Deus quer fazer de você um grande santo.
Não se inquiete porque você foi isto ou aquilo, porque tem este ou
aquele vício, ou porque já perdeu a sua pureza, ou porque tem tal ou
qual defeito. Se caiu, levante-se! "O grave não é que aquele que luta, caia, mas que permaneça caído",
já dizia São João Crisóstomo [4]. Não pergunte, portanto: "Sou tão
pecador, a santidade é mesmo para mim?", porque Jesus Cristo, Nosso
Senhor, quando desceu a este mundo, não veio para os justos, mas para os
pecadores (cf. Mt 9, 13). Deixe que o sangue d'Ele, derramado na Cruz, cure e transforme a sua vida.
Por Equipe Christo Nihil Praeponere
Referências
- Últimos Colóquios, Caderno Amarelo, 11 de julho, n. 6.
- Homilias sobre os Salmos, apud São João Paulo II, Audiência Geral (8 de maio de 2002), n. 2.
- In: Collected Works of Oscar Wilde. Ware: Wordsworth, 2007, p. 568.
- Exortação a Teodoro, II, 1. In: ARRARÁS, Felix. João Crisóstomo: vida e martírio (trad. de Henrique Elfes). São Paulo: Quadrante, 1993, p. 170.
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