“Não podemos ficar petrificados diante de um flagelo destas proporções, como se fôssemos pedaços de mármore!”, detona o Observador Permanente da Santa Sé junto à ONU.
Este domingo, 16 de outubro, foi o Dia Mundial da Alimentação.
Aleteia conversou com Fernando Chica Arellano,
Observador Permanente da Santa Sé junto às agências da ONU em Roma para
a alimentação e a agricultura: o PMA (Programa Mundial de Alimentos), o
FIDA (Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrário) e a FAO
(Organização para Alimentação e Agricultura).
“O número de famintos no mundo é estarrecedor: quase 800 milhões de irmãos nossos passam fome. Muitos deles são crianças”, afirma Arellano a propósito desta jornada especial, cujo tema é “O clima está mudando; a alimentação e a agricultura também”.
O diplomata da Santa Sé explica que “falar da fome é falar de
pessoas de rosto dilacerado, de histórias truncadas. Os famintos não são
entes abstratos. São pessoas que choram e se desesperam; são pessoas
que não encontramos só nos países mais pobres da Terra, mas também nos
países desenvolvidos. A primeira coisa que esta jornada está dizendo a
todos nós, inclusive à comunidade internacional, é que não podemos nos
desviar da tragédia dos famintos, não podemos virar os olhos para outro
lado”.
“A fome afeta muitas pessoas que são tão de carne e osso quanto
você e eu. E eu me pergunto: o que é que está acontecendo para que um
mundo tão avançado em âmbitos científicos, em descobertas tecnológicas,
ainda tenha uma quantidade enorme de pessoas que morrem de fome, entre
lágrimas, impotência e amargura? Como explicar que alguns poucos tenham
tanto e, ao mesmo tempo, a única posse de tantos irmãos nossos seja a
fome e a miséria?”, detona Arellano.
E ele deixa bem claro:
“Isto não pode nos deixar dormir! É algo que
definitivamente não deve nos deixar como se não estivesse acontecendo
nada, petrificados diante de um flagelo destas proporções, como se
fôssemos pedaços de mármore!”.
Arellano enfatiza que este Dia Mundial da Alimentação é “um
grande chamamento à responsabilidade, voltado não só aos foros
internacionais, não só aos organismos e instituições nacionais,
regionais, locais; não só aos governos. Na luta contra a fome, toda
contribuição é válida. É um problema que temos que solucionar todos
juntos, cooperando. Todos temos que dar o melhor de nós para erradicar
este flagelo, para solucioná-lo!”.
O representante do Vaticano enfatiza que a solução do problema está
nas mãos de cada ser humano, conforme o seu alcance no cotidiano:
“Esta Jornada bate à porta de cada um de nós, de todos e de cada um em particular. E está dizendo a você e a mim: Dê um passo para frente! Se mexa!
Esta Jornada tem que nos fazer pensar: o que é que eu vou fazer, eu, em
primeira pessoa, para ajudar os famintos, que são meus irmãos que
sofrem? Erradicar a fome é um compromisso muito sério. Para isso, a
colaboração é essencial. Cada um tem a sua parte. E não bastam as
palavras, as meras declarações. Isso é importante, mas não é suficiente.
É preciso vontade política. Precisamos de soluções e medidas urgentes,
eficazes e concretas. Os pobres não podem esperar mais. Temos
que agir já. Em nível global, mas também, como diz o Papa Francisco na
Laudato Si’, com gestos pequenos e cotidianos”.
O mundo pretende extinguir a fome até 2030. O diplomata da Santa Sé, porém, afirma que é peremptório acabar com ela muito antes.
“Da fome só deveriam falar os livros de história. A fome deveria
ser uma peça de museu, uma tragédia que existia num passado remoto. Nem
hoje, nem amanhã, nem nunca mais. Por isso é tão fundamental a
colaboração de todos. Se todos colaborarmos, podemos fazer com que esta
geração seja a geração que acabou com a fome”, afirma Fernando Chica Arellano.
A resposta passa por práticas muito mais conscientes no dia-a-dia:
“A visão do magistério eclesial destaca a necessidade de ações
capazes de contribuir para a segurança alimentar e para níveis melhores
de nutrição, dos quais possam se beneficiar especialmente os setores
mais vulneráveis das populações e os países com baixa renda e déficit
alimentar. Isto significa, por exemplo, promover um tipo de produção
sustentável, alimentos seguros, nutritivos e culturalmente acessíveis,
mas, acima de tudo, a redução das perdas e os desperdícios de alimentos, que atingem hoje 26% da produção total de alimentos.
Diminuir perdas exige instrumentos técnicos e estruturas eficazes e que
funcionem, mas também ser conscientes do bem que pode ser feito com uma
disponibilidade maior de alimento”.
Sobre o desperdício de alimentos, um escândalo que deveria envergonhar muito mais o mundo, Arellana reforça: “Eliminar
os desperdícios significa mudar o nosso estilo de vida, aprender a ser
sóbrios, consumir só o que realmente precisamos, evitando assim jogar
fora tanta comida”.
E finaliza questionando:
“Quantas vezes fizemos isso sem nem prestar atenção? Ou
sem dar a importância que tem, esquecendo as consequências disto para
quem sofre de fome?”.
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