terça-feira, 5 de abril de 2011

RESPONDENDO AOS IRMÃOS SEPARADOS.


Em síntese: Os protestantes costumam levantar questionamentos contrários às verdades católicas. Questionamentos, estes, nem sempre bem redigidos, de modo que PR recebe freqüentemente a solicitação de responder-lhes. É a isto que atenderemos no artigo seguinte.

* * *

Consideraremos, a seguir, algumas objeções levantadas contra o Catolicismo e lhes daremos a resposta católica.

1. Objetante: "Se a Igreja Católica deu a Bíblia ao mundo, sendo infalível em suas decisões por que muitos de seus membros rejeitaram os livros apócrifos? Roma rejeitou ou pelo menos pôs em dúvida a canonicidade e os autores de Tiago e Hebreus. E por que mais tarde veio a aceitá-los? E como ela pode aceitar como sagrados os livros que ela posteriormente rejeitou?

Em resposta devemos notar que os cristãos dos cinco primeiros séculos (até o Concílio de Calcedônia em 431) tiveram que aprofundar o sentido de verdades reveladas pelo Evangelho. Para realizar esta ingente tarefa, não havia meios de comunicação modernos que permitem coorde­nar estudos e trabalhos, mas havia escolas de teologia no Oriente (Antioquia) e na África (Alexandria), cujos estudos podiam ser aprovados ou reprovados pela sé primacial de Roma.

Foi sobre este pano de fundo que se formou o catálogo (ou cânon) da Bíblia. Consideraremos separadamente o Antigo e o Novo Testamento.


1. O Antigo Testamento

Os judeus tinham dois catálogos de seus livros sagrados: 1) o de Jâmnia carente de sete livros (Tobias, Judite, Sabedoria, Baruque, Ecle­siástico e 1/2 Macabeus) rejeitados porque escritos em língua estrangeira (grego ou aramaico) ou em terra estrangeira; 2) o catálogo de Alexandria ou dos LXX, que não seguia os critérios nacionalistas adotados em Jâmnia. Conseqüentemente a tradução grega dos LXX foi-se tornando o texto usual dos cristãos. Contudo nos primeiros séculos havia escritores cristãos que duvidavam dessa escolha, já que os judeus da terra (Palestina) professa­vam o catálogo restrito. As dúvidas se dissiparam por obra do Espírito Santo, que rege a igreja, de modo que em 393 no Concílio Regional de

Hipônia foi definido o cânon amplo da Bíblia, com seus sete livros ditos deuterocanônicos (catalogados em segunda instância ou após terem sido controvertidos). A definição do catálogo amplo, professada pela igreja de Roma, foi-se repetindo. Não nos surpreende, porém, o fato de que alguns escritores da Igreja tenham defendido o catálogo restrito, mesmo após o século IV, São Jerônimo, que foi à Terra Santa para estudar hebraico com os rabinos, era uma voz dissidente, que não teve continuidade. - Os sete livros que os católicos designam como deuterocanônicos, são pelos pro­testantes ditos "apócrifos". É preciso não confundir a voz dos teólogos com a do magistério oficial da Igreja. Os teólogos podem duvidar, discutir e debater sem que o magistério da Igreja esteja envolvido nisso.

2. Novo Testamento

Também os livros do Novo Testamento foram, em parte, debatidos, sete passaram por este processo e são chamados "deuterocanônicos": Tg; Hb; Ap; Jd; 2Pd; 2/3 Jo. Foram discutidos ou porque não se sabia ao certo quem era o respectivo autor ou por razões doutrinárias: assim Hb 6, 4-6 parece ensinar que não há perdão para certos pecados (o que é falso) e São Tiago parece opor-se a São Paulo ao insistir sobre a necessidade de boas obras para chegar à salvação. A hesitação foi cedendo a um claro entendimento, de modo em 393 os deuterocanônicos do Novo Testamen­to foram incluídos no cânon bíblico. O Concílio de Trento nada inovou, mas repetiu o catálogo tal como professado desde o século IV. Em PR 313/1998, pp. 253 se encontra a lista dos concílios que no decorrer da história repetiram a definição do cânon amplo, evidenciando quanto é fal­so dizer que foi o Concílio de Trento que os introduziu na Bíblia.

O magistério da Igreja não se contradisse aceitando o que rejeitara ou rejeitando o que aceitara. Os teólogos, sim, podem contradizer-se no estudo de determinada questão.

II. Objetante: "Se os católicos afirmam que não é permitido fazer interpretação particular da Bíblia, como saberemos quem está dizendo a verdade quando católicos e orientais ortodoxos afirmam ao mesmo tem­po que a tradição apostólica apoia suas doutrinas, quando na verdade sabemos que elas se opõem entre si?"

Respondemos que a garantia da inerrancia no magistério foi dada aos Apóstolos cujo primaz é Pedro (ver Mt 28, 18-20; Mt 16, 16-19). So­mente a Pedro disse Jesus: "Confirma teus irmãos" (Lc 22, 21-23). Por conseguinte as dúvidas sobre matéria de fé e de Moral são resolvidas pelo sucessor de Pedro, que goza de especial assistência do Espírito Santo. Os cristãos orientais ditos "ortodoxos" guardaram o mesmo Credo que os católicos, mas recusam o Primado de Pedro, o que muito enfraquece o seu testemunho; cada nação ortodoxa oriental tem a sua frente um Sínodo de Bispos que a governa.

III. Objetante: "Os católicos podem provar que, além das Escritu­ras, outra fonte de autoridade doutrinária seja inspirada?"

Respondemos que Jesus nada escreveu nem mandou escrever, pois a escrita era rara e difícil na antiguidade. Os Apóstolos puseram-se a pregar de viva voz. Essa pregação oral foi ocasionalmente redigida por escrito quando os Apóstolos tinham necessidade de esclarecer alguma questão ou censurar os males de alguma comunidade ou - ainda - quan­do se fazia oportuno entregar às comunidades uma síntese da pregação (Evangelhos). O próprio evangelista São João adverte no fim do seu Evan­gelho, duas vezes, que nem tudo o que Jesus disse e fez está contido na Escritura (cf. Jo 20, 30s; 21, 24). Sendo assim, vê-se que a Palavra escri­ta há de ser entendida à luz da Palavra oral que a berçou e acompanha, tendo por seu órgão oficial o magistério da Igreja assistido pelo Espírito Santo. Sem esse acompanhamento da Palavra viva oral, a Palavra escri­ta pode ser distorcida para diversos lados e assim desviada do seu teor original. De resto os protestantes tem todos sua tradição oral, que inter­preta a Bíblia; é, porém, uma tradição literalmente humana e distante da era apostólica; assim Lutero, Calvino, Wesley,... deram origem a tradição extra - bíblica que interpreta a Bíblia segundo a mente do reformador. O primeiro recurso à tradição oral entre os protestantes refere-se ao catálo­go bíblico: onde é que a Bíblia diz que são 66 ou 73 os livros sagrados? É somente a tradição oral que responde a esta pergunta. Está claro que existem tradições e Tradição; não é qualquer historieta ou qualquer sen­tença que a Igreja assume como Tradição. Podem-se citar dois exemplos de Tradição apostólica:
1) o Batismo de crianças, que alguns escritores antigos atribuem à praxe dos Apóstolos;

2) a estrutura da Missa com seu cânon ou sua Oração Eucarística enquadrando as palavras da consagra­ção do pão e do vinho... É o magistério da Igreja quem julga as tradições.

IV: Objetante: "Pode algum católico provar que as doutrinas do papado (indulgências, assunção de corpo e alma, imaculada conceição, virgindade perpétua, batismo infantil, os sete sacramentos, o purgatório e as demais doutrinas extra-bíblicas) foram ensinadas pelos Apóstolos?".

Em resposta dizemos que a Palavra de Deus oral e escrita é como uma semente que tende a se abrir homogeneamente. Assim na era dos Apóstolos e posteriormente foram sendo deduzidas conseqüências ou corolários do depósito revelado. A história favoreceu uma mais profunda compreensão das verdades da fé. Como exemplo desse desenvolvimen­to homogêneo do dogma pode-se citar o seguinte: os antigos cristãos eram muito rigorosos ao exigir o Batismo de água ou de sangue para a salvação eterna. Os catecúmenos eram tidos como batizados, já que ha­viam manifestado o desejo do Batismo. Na Idade Média, S. Tomás de Aquino, fiel a essa concepção, julgava que, se um pagão vivesse candi­damente o seu paganismo, Deus mandaria um anjo ou um missionário especial para o catequizar e levá-lo a pedir explicitamente o Batismo... Ora tais idéias foram postas em xeque no século XVI, quando se encon­traram nas terras recém descobertas muitos povos asiáticos, africanos e americanos pagãos; estariam todos condenados ao inferno sem a culpa de não conhecer o Evangelho lá onde ele não fora apregoado? Os teólo­gos então alargaram seu horizonte, afirmando que tais homens vivendo de acordo com os ditames de sua consciência cândida, julgando que de­viam adorar seus deuses, estariam no caminho da salvação; e não por causa dos erros professados, mas por causa da candura e fidelidade que haviam demonstrado as suas crenças. Assim se concebeu a doutrina do desejo implícito do Batismo. Se tais pessoas soubessem que o Batismo é necessário a salvação, tê-lo-iam pedido.

A sorte póstuma das crianças que morrem sem Batismo é outro exemplo de evolução homogênea do dogma. S. Agostinho no século X julgava que tais crianças eram condenadas ao inferno. S. Anselmo no século XII concebe para elas o limbo ou uma bem-aventurança natural. Hoje em dia prefere-se dizer que a solidariedade com Cristo é maior do que a solidariedade com o primeiro Adão; por isto Cristo lhes merece o ingresso na bem-aventurança celeste, mesmo sem o Batismo (da qual Deus não está obrigado).

Desta forma a Igreja, guiada pelo Espírito Santo, pode tirar do de­pósito revelado nova et vetera, coisas novas e coisas velhas, estando as novas incluídas implicitamente nas velhas; cf. Mt 13, 52.



Estêvão Bittencourt


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