quarta-feira, 23 de março de 2011

HOMENS PODEM INTERCEDER POR NÓS?

São Paulo da Cruz na glória celeste

Vê-se, desde logo, que a pergunta dirigida é provavelmente de origem protestante, pois é comum entre estes negar que algum homem possa ser santo. Mas pode também provir de algum católico contaminado pelas idéias protestantes, como infelizmente não é raro encontrar-se hoje em dia. Assim, o esclarecimento desta questão pode ser útil para muitos que se sintam embaraçados pela pregação protestante.

Tanto mais que a própria Igreja nos ensina que todo homem é pecador, a ponto de rezarmos na Ave-Maria pedindo: rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte. Amém. Essa oração é posta nos lábios de todos os fiéis, sem exceção, inclusive daqueles que ocupam os mais altos postos na Hierarquia da Igreja. Ao celebrar o Santo Sacrifício da Missa, todo sacerdote começa por pedir a Deus perdão por seus pecados: porque pequei muitas vezes, por pensamentos, palavras e obras. Que sentido tem, na doutrina católica, atribuir santidade a algum homem sobre a face da Terra?

Deus criou o homem num estado de santidade

Deus criou o homem à sua imagem e semelhança, participando portanto da santidade do próprio Deus. No Paraíso, Adão e Eva tinham sido elevados à ordem sobrenatural por meio da graça, o que caracterizava um estado de inocência, de justiça e de santidade. Ademais, gratuitamente Deus lhes comunicara o dom da imortalidade corporal (a alma, por sua própria natureza, é imortal), ou seja, seriam levados ao Céu sem conhecer a morte, após passar pela prova desta vida. Pelo pecado, perderam tudo isso: a graça, a inocência, a justiça e a santidade; perderam o direito ao Céu; foram expulsos do Paraíso terrestre; ficaram expostos a muitas misérias no corpo e na alma; e, por fim, condenados a morrer. Antes, segundo comentadores abalizados da Sagrada Escritura, bastava-lhes comer o fruto da árvore da vida existente no Paraíso, para conservarem a vida imortal.

O pecado de Adão foi um pecado pessoal. Porém, sendo ele a cabeça e o tronco do gênero humano, esse pecado se transmitiu, por via de geração natural, a todos os seus descendentes. Por isso todo homem nasce contaminado por esse pecado, que consiste na privação da inocência e da graça. Chama-se pecado original.

É fácil entender: se um homem abastado faz maus negócios, perdendo sua casa e todos os bens, não tem mais o que transmitir a seus filhos em vida, ou por herança após a morte. Do mesmo modo a natureza humana, que havia sido elevada em Adão à ordem sobrenatural por meio da graça, perdeu-a por tê-la perdido Adão pelo pecado, pois este perdeu-a para si e para todos os seus descendentes.

A obra da Redenção por Jesus Cristo

Por si mesmo, o homem não tinha condições de sair desse estado de pecado. A gravidade de uma ofensa se mede, de um lado, pela natureza da ofensa; e de outro lado, pela dignidade do ofendido. Sendo Deus infinito, o pecado de Adão tinha, de certo modo, uma gravidade infinita. Para ser reparada, seria preciso uma ação de valor infinito, o que nenhum homem poderia praticar. Por outro lado, a reparação devia ser oferecida pelo homem, que era o ofensor.

A humanidade se encontrava, portanto, numa situação de impasse.

Deus compadeceu-se da situação dos homens e resolveu divinamente o problema, que humanamente era insolúvel: a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade — o Filho de Deus — se faria homem e ofereceria à Santíssima Trindade um sacrifício condigno, em nome dos homens.

Assim, encarnando-se no seio virginal de Maria Santíssima, por obra do Espírito Santo, o Verbo de Deus feito homem, Jesus Cristo, pôde oferecer no alto da Cruz um Sacrifício que remiu toda a humanidade, restaurando nossa amizade com Deus e nossa filiação divina.

A restauração da santidade pelo Batismo

Os méritos da Redenção se aplicam a nós, primeiramente, pelo sacramento do Batismo, que apaga em nós o pecado original. O Batismo nos comunica pela primeira vez a graça santificante, que nos eleva à ordem sobrenatural, nos torna filhos de Deus por adoção e herdeiros do Céu. Ademais, o Batismo nos introduz na verdadeira Igreja de Jesus Cristo, isto é, a Igreja Católica, tornando-nos membros vivos dela e aptos a receber os demais sacramentos.

Embora nos obtenha a remissão do pecado original, o Batismo não restaura a natureza humana no estado de integridade em que se encontravam Adão e Eva no Paraíso. Muitos dos efeitos do pecado original permanecem no homem: continuamos sujeitos ao trabalho com o suor do nosso rosto, e a muitas outras misérias; somos atingidos pelas doenças, e afinal pela morte. Pior do que tudo, a inclinação ao pecado permanece em nós, e contra ela devemos lutar até o último dia de nossa existência terrena, com a indispensável ajuda da graça de Deus.

Mas se temos a infelicidade de pecar gravemente, e assim perder novamente a graça santificante, podemos arrepender-nos e recuperá-la no sacramento da Confissão, confessando nossos pecados a um sacerdote, que no-los perdoa em nome e pelo poder de Jesus Cristo.

É sobretudo importante o Santíssimo Sacramento da Eucaristia — o maior de todos os sacramentos — que é o próprio Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo. Recebendo-o em estado de graça, isto é, depois de termos obtido o perdão de nossos pecados mortais no sacramento da Confissão, a graça santificante aumenta grandemente em nós. Conseqüentemente, aumenta a santidade da nossa vida.

Intercessão dos santos, nesta e na outra vida

E assim vamos caminhando em nossa existência terrena, com avanços e recuos, novos recuos e novos avanços. Se prevalecem os avanços, avançamos em santidade. Se os recuos prevalecem, aproximamo-nos perigosamente da condenação eterna.

Algumas almas generosas e privilegiadas tomam resolutamente o caminho da santidade, movidas pela graça de Deus. Nelas permanecem defeitos menores, que vão sendo vencidos pouco a pouco. E o odor da santidade se comunica aos que têm proximidade com elas. Porém, não nos iludamos: nem todos o percebem. São muitos os casos de pessoas que conviveram com santos e nada perceberam, pois seus olhos estavam fechados à santidade alheia! Mas isto pouco importa. O que importa é que Deus as conhece e as ama, e comunica-lhes cada vez maior participação em sua própria santidade. São os amados e privilegiados de Deus.

É compreensível que Deus atenda com maior benevolência a súplica destes que estão mais próximos d’Ele do que a de outros que estão mais longe, pois o mesmo acontece conosco quando atendemos prontamente os pedidos dos amigos. Aqui está a explicação da intercessão dos santos, ainda nesta vida: Deus atende com maior presteza as orações dos mais avançados em santidade, que são seus melhores amigos. Não se trata nestes de uma santidade absoluta, que só Deus tem, e por isso mesmo se diz que só DEUS é santo! Mas é uma participação finita na santidade infinita de Deus.

É claro que, se Deus já atende nesta vida as orações dos santos por nós, com muito maior razão atenderá os pedidos que eles fizerem por nós quando já estiverem no Céu. Assim se entende o que disse São Domingos de Gusmão, moribundo, aos seus irmãos da Ordem Dominicana, por ele fundada: “Não choreis, que eu vos serei mais útil depois da morte e vos ajudarei mais eficazmente que durante a vida” (cfr. Jordão de Saxe, Lib. 93). E Santa Teresinha do Menino Jesus tinha uma aspiração: “Hei de passar meu Céu fazendo o bem sobre a Terra”. (Novissima Verba, 17 de julho de 1897, Derniers entretiens, Paris, 1971, p. 270).
por
Monsenhor JOSÉ LUIZ VILLAC -
em a palavra do Sacerdote.

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