Primeira leitura: Isaías 6, 1-8
Leitura do Livro do Profeta Isaías:
1No ano da morte do rei Ozias, vi o Senhor sentado num trono de grande
altura; o seu manto estendia-se pelo templo. 2Havia serafins de pé a seu
lado; cada um tinha seis asas. 3Eles exclamavam uns para os outros:
'Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos; toda a terra está repleta
de sua glória'. 4Ao clamor dessas vozes, começaram a tremer as portas
em seus gonzos e o templo encheu-se de fumaça. 5Disse eu então: 'Ai de
mim, estou perdido! Sou apenas um homem de lábios impuros, mas eu vi com
meus olhos o rei, o Senhor dos exércitos'. 6Nisto, um dos serafins voou
para mim, tendo na mão uma brasa, que retirara do altar com uma tenaz,
7e tocou minha boca, dizendo: 'Assim que isto tocou teus lábios,
desapareceu tua culpa, e teu pecado está perdoado'. 8Ouvi a voz do
Senhor que dizia: 'Quem enviarei? Quem irá por nós?' Eu respondi: 'Aqui
estou! Envia-me'.
- Palavra do Senhor
- Graças a Deus
Salmo 137 (138)
- Ó Senhor, de coração eu vos dou graças, porque ouvistes as palavras
dos meus lábios! Perante os vossos anjos vou cantar-vos e ante o vosso
templo vou prostrar-me.
R:Vou cantar-vos, ante os anjos, ó Senhor, e ante o vosso templo vou prostrar-me.
- Eu agradeço vosso amor, vossa verdade, porque fizestes muito mais que
prometestes; naquele dia em que gritei, vós me escutastes e aumentastes o
vigor da minha alma.
R:Vou cantar-vos, ante os anjos, ó Senhor, e ante o vosso templo vou prostrar-me.
- Os reis de toda a terra hão de louvar-vos, quando ouvirem, ó Senhor,
vossa promessa. Hão de cantar vossos caminhos e dirão: 'Como a glória do
Senhor é grandiosa!'
R:Vou cantar-vos, ante os anjos, ó Senhor, e ante o vosso templo vou prostrar-me.
- Estendereis o vosso braço em meu auxílio e havereis de me salvar com
vossa destra. Completai em mim a obra começada; ó Senhor, vossa bondade é
para sempre! Eu vos peço: não deixeis inacabada esta obra que fizeram
vossas mãos!
R:Vou cantar-vos, ante os anjos, ó Senhor, e ante o vosso templo vou prostrar-me.
Segunda leitura: Coríntios 15, 1-11
Leitura da Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios:
1Quero lembrar-vos, irmãos, o evangelho que vos preguei e que
recebestes, e no qual estais firmes. 2Por ele sois salvos, se o estais
guardando tal qual ele vos foi pregado por mim. De outro modo, teríeis
abraçado a fé em vão. 3Com efeito, transmití-vos em primeiro lugar,
aquilo que eu mesmo tinha recebido, a saber: que Cristo morreu por
nossos pecados, segundo as Escrituras; 4que foi sepultado; que, ao
terceiro dia, ressuscitou, segundo as Escrituras; 5e que apareceu a
Cefas e, depois, aos Doze. 6Mais tarde, apareceu a mais de quinhentos
irmãos, de uma vez. Destes, a maioria ainda vive e alguns já morreram.
7Depois, apareceu a Tiago e, depois, apareceu aos apóstolos todos
juntos. 8Por último, apareceu também a mim, como a um abortivo. 9Na
verdade, eu sou o menor dos apóstolos, nem mereço o nome de apóstolo,
porque persegui a Igreja de Deus. 10É pela graça de Deus que eu sou o
que sou. Sua graça para comigo não foi estéril: a prova é que tenho
trabalhado mais do que os outros apóstolos - não propriamente eu, mas a
graça de Deus comigo. 11É isso, em resumo, o que eu e eles temos pregado
e é isso o que crestes.
- Palavra do Senhor
- Graças a Deus
Evangelho de Jesus Cristo segundo São Lucas 5, 1-11
- Aleluia, Aleluia, Aleluia.
- "Vinde após mim!", o Senhor lhes falou, "e vos farei pescadores de homens".
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo São Lucas:
Naquele tempo: 1Jesus estava na margem do lago de Genesaré, e a multidão
apertava-se ao seu redor para ouvir a palavra de Deus. 2Jesus viu duas
barcas paradas na margem do lago. Os pescadores haviam desembarcado e
lavavam as redes. 3Subindo numa das barcas, que era de Simão, pediu que
se afastasse um pouco da margem. Depois sentou-se e, da barca, ensinava
as multidões. 4Quando acabou de falar, disse a Simão: 'Avança para águas
mais profundas, e lançai vossas redes para a pesca'. 5Simão respondeu:
'Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos. Mas, em
atenção à tua palavra, vou lançar as redes'. 6Assim fizeram, e apanharam
tamanha quantidade de peixes que as redes se rompiam. 7Então fizeram
sinal aos companheiros da outra barca, para que viessem ajudá-los. Eles
vieram, e encheram as duas barcas, a ponto de quase afundarem. 8Ao ver
aquilo, Simão Pedro atirou-se aos pés de Jesus, dizendo: 'Senhor,
afasta-te de mim, porque sou um pecador!' 9É que o espanto se apoderara
de Simão e de todos os seus companheiros, por causa da pesca que
acabavam de fazer. 10Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram sócios de
Simão, também ficaram espantados. Jesus, porém, disse a Simão: 'Não
tenhas medo! De hoje em diante tu serás pescador de homens.' 11Então
levaram as barcas para a margem, deixaram tudo e seguiram a Jesus.
- Palavra da Salvação
- Glória a Vós, Senhor
O Evangelho deste 5.º Domingo do Tempo Comum, retirado de São Lucas,
capítulo 5 versículos do 1 ao 11, narra com riqueza de detalhes a
vocação de São Pedro, juntamente com outros pescadores que se tornaram
Apóstolos de Jesus: Pedro, André, Tiago e João. Diferentemente dos
Evangelhos de Mateus e Marcos, que relatam esse chamado de maneira mais
resumida, sem mencionar a “pesca milagrosa”, São Lucas apresenta esse
episódio com particular profundidade; ele dá ênfase à manifestação do
poder de Cristo nesse momento decisivo.
O Evangelho de São Lucas situa-nos à margem do Lago de Genesaré,
também chamado Mar da Galileia, uma região árida onde o Rio Jordão,
nascido das geleiras do Líbano, alarga-se e se torna uma fonte de vida.
Foi nesse cenário, próximo a Cafarnaum, cidade de Pedro, que Jesus
iniciou sua pregação e ministério. Desse modo, à beira do lago, a
multidão aglomera-se em torno de Nosso Senhor, dificultando a acústica
da sua pregação. Vendo Pedro, então chamado Simão, com André, Tiago e
João lavando as redes após uma noite de pesca, Jesus entra no barco de
Simão, pede que se afaste um pouco da margem e começa a pregar.
Vejamos como Deus serve-se de situações que, à primeira vista,
parecem simples coincidências. Após uma noite exaustiva de trabalho,
Pedro certamente não esperava ouvir um sermão — provavelmente ele só
queria descansar. No entanto, Jesus pede para usar sua barca, e, por
cortesia, Pedro permite. Como consequência, acaba ouvindo a pregação,
que começa a tocar profundamente seu coração.
Após concluir a pregação, Jesus diz a Pedro: “Avança para águas mais
profundas e lança as redes”. Pedro, sem querer faltar com o respeito,
dirige-se a Ele com o termo grego “Epistata”, traduzido como “mestre”,
mas que significa mais do que um simples professor. O termo indica
alguém de posição elevada, semelhante ao uso de “sensei” no âmbito das
artes marciais japonesas — um título que expressa respeito e
reconhecimento de autoridade.
Pedro responde a Jesus com respeito: “Mestre, trabalhamos a noite
inteira e nada pescamos, mas, por atenção à tua palavra, lançarei as
redes”. No original grego, “rhēma” significa uma palavra de ordem, e
Pedro obedece. E então, depois da pesca milagrosa, ocorre seu verdadeiro
chamado. Agora, ele não vê Jesus apenas como um mestre respeitável, mas
como “Kyrios”, Senhor. Diante desse reconhecimento, Pedro, tomado de
espanto, exclama: “Senhor, afasta-te de mim, porque sou um homem
pecador”. Apesar da infinita dignidade de Nosso Senhor — em contraste
com a indignidade daquele pescador — Cristo o chama, dizendo: “Não
tenhas medo. Doravante, tu serás pescador de homens”. Eis a vocação do
Apóstolo.
A primeira leitura deste domingo recorda a vocação do Profeta Isaías,
que, embora diferente da de Pedro, guarda semelhanças. Isaías tem sua
visão no Templo, onde vê serafins proclamando: “Santo, santo, santo.
Senhor Deus dos exércitos celestes, a Terra está cheia da sua glória” —
esse canto, repetido em todas as missas, também está presente nos ritos
orientais. Diante da visão, Isaías reage como Pedro, reconhecendo sua
indignidade: “Ai de mim estou perdido, sou apenas um homem de lábios
impuros, mas eu vi com meus olhos o Rei, o Senhor dos exércitos”. A
liturgia, ao apresentar essas passagens, destaca o paralelo entre os
chamados de Isaías e de Pedro, mostrando como Deus transforma-os para
sua missão.
Antes de tirarmos conclusões para a nossa vida, é importante
compreender o verdadeiro significado de vocação. Frequentemente,
associamos vocação apenas a uma profissão; mas, a bem da verdade,
trata-se do caminho que Deus escolheu para nossa salvação. Ser médico,
engenheiro ou pai de família não é um fim em si mesmo, senão um meio
para alcançarmos o Céu. No caso de Pedro, sua vocação é clara: “Tu serás
pescador de homens”. Ou seja, ao salvar os outros, ele também
encontrará sua própria salvação — um aspecto essencial que muitas vezes
passa despercebido.
Estamos neste mundo para levar os outros a Deus e, ao fazê-lo, também
nos aproximamos d’Ele. Se queremos nos salvar, devemos ajudar os outros
a encontrar o caminho do Céu. Esse é o grande segredo que muitos não
percebem. Pedro, por exemplo, tinha uma profissão — era pescador para se
sustentar. Mas, ao reconhecer sua pequenez diante de Nosso Senhor, sua
vida ganha um novo sentido. Ele não tem mais apenas uma profissão, mas
uma vocação: ser pescador de homens.
Não importa qual seja a nossa profissão — médico, engenheiro,
mecânico, operário ou escritor — o essencial é vivê-la bem. Mas nossa
vocação vai além do trabalho: envolve ser esposo, esposa, pai, mãe, e,
sobretudo, buscar a santidade levando os outros a Deus. Se nos
concentramos apenas na profissão, perdemos o verdadeiro propósito. Nossa
vocação é ser santos onde estamos, transformando cada aspecto da vida
em um meio de amar, servir e conduzir os outros à salvação.
No dia 24 de janeiro, celebramos São Francisco de Sales, que viveu na
transição do século XVI para o XVII. Ele dedicou sua vida a mostrar que
todos somos chamados à santidade, independentemente da nossa condição
de vida. Em seu famoso livro “Introdução à Vida Devota”, São
Francisco ensina que a verdadeira devoção deve estar alinhada com o
chamado de cada pessoa, não importando sua situação. No capítulo 3 da
primeira parte, ele escreve:
“É um erro, se não até mesmo uma heresia, querer excluir a vida
devota dos quartéis dos soldados, das oficinas dos operários, dos
palácios dos príncipes, do lar das pessoas casadas. Confesso, porém,
caríssima Filoteia, que a devoção puramente contemplativa, monástica e
religiosa, de modo algum pode ser praticada em tais ocupações ou
condições. Mas para além dessas três espécies de devoção, há muitas
outras próprias para o aperfeiçoamento daqueles que vivem no estado
secular. Portanto, onde quer que estejamos, devemos e podemos aspirar à
vida perfeita”.
Devemos aspirar à santidade em qualquer situação, pois essa é nossa
verdadeira vocação. Todo homem maduro tem a vocação de ser um pai santo e
levar seus filhos ao Céu, assim como toda mulher madura tem a vocação
de ser mãe santa. Isso vale para todos, seja um monge, uma monja, ou uma
mãe casada — cada um é chamado a viver a santidade em sua vocação,
incluindo seu trabalho e vida familiar. Como diz São Francisco de Sales,
é um erro dizer que essas pessoas não têm vocação; elas a têm, e essa
vocação concretiza-se em seu papel de pais e mães, conduzindo seus
filhos ao Céu.
A vocação acontece quando temos um encontro com Jesus, que nos leva
para águas mais profundas. Antes, estávamos vivendo de forma superficial
e desanimada, mas ao encontrar Cristo, nossa vida nunca mais será a
mesma. Embora a vida exterior possa continuar parecida, há uma mudança
interior radical. Se antes pescávamos peixes, agora vemos nossa
profissão como meio de sustento, mas o verdadeiro propósito é “pescar”
almas para Deus, levando outros e a nós mesmos à salvação e ao Céu.
O último ponto a refletir é que nunca seremos bons cristãos ou santos
se não transmitirmos nossa fé e ajudarmos outros a serem santos,
firmemente seguindo o caminho para o Céu. Se queremos preservar nossa
fé, devemos compartilhá-la; se buscamos a santidade, precisamos ajudar
os outros a alcançá-la. Todos somos chamados a ser pescadores de almas,
independentemente da profissão que exercemos. Com efeito, a vocação não
depende de mudar o trabalho, mas de encontrar o propósito de levar
outros a Deus. Assim como Pedro foi encontrado pela vocação, devemos
também nos lançar para alcançar a Deus, ajudando outros a chegar ao Céu.
Como São Paulo diz: “Já que eu fui alcançado por Cristo, deixando o que
está para trás, eu me lanço para alcançar aquele que me alcançou”.
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