quinta-feira, 19 de novembro de 2015

O SACERDÓCIO COMUM DOS FIÉIS


Da obrigação de fazer o sacrifício de sua própria pessoa a Deus, nosso Criador e Redentor, nenhum batizado está isento.


"Eu vos exorto, irmãos, pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo, santo, agradável a Deus: é este o vosso culto espiritual" (Rm 12, 1).
Por certo, muitos de nossos leitores conhecem esta recomendação de São Paulo, bem como esta outra afirmação do Príncipe dos Apóstolos: vós sois "uma raça escolhida, um sacerdócio régio, uma nação santa" (I Pd 2, 9).

Sao Pedro Crisologo por Gian Andrea Forniori - Museu Diocesano de Imola - Italia..jpg
"O ser humano não precisa ir buscar fora de
si a vítima que deve oferecer, pois traz
consigo e em si o que irá
sacrificar a Deus"
São Pedro Crisólogo, por Gian Andrea
Fornioni - Museu diocesano de Ímola (Itália)
Elas nos introduzem numa sublime realidade de nossa Fé, ainda pouco conhecida: o sacerdócio comum dos fiéis.

Sacerdócio comum e sacerdócio ministerial

A Cristo pertence o único e eterno sacerdócio, do qual Ele quis tornar partícipes os Apóstolos. Quando eles se espalharam pelo mundo pregando o Evangelho, fundaram igrejas locais e ordenaram presbíteros para atendê-las.
Assim nasceu e se desenvolveu o sacerdócio ministerial, próprio daqueles que recebem o Sacramento da Ordem e, com ele, o múnus de ensinar, governar e santificar os fiéis. Só quem recebeu esse Sacramento no grau de presbítero tem o poder de renovar o Sacrifício do Calvário, de perdoar os pecados e de administrar a Unção dos Enfermos.

Tais prerrogativas, o Senhor não as outorgou sequer aos Anjos e, menos ainda, as possuem os fiéis leigos. Assim o ensina o Papa Pio XII, ao acentuar que o sacerdócio comum dos fiéis "difere, não só em grau, mas essencialmente",1 do sacerdócio ministerial ou hierárquico.

Essa diferença, entretanto, não implica em disputa ou rivalidade. Pelo contrário, explica o Concílio Vaticano II, os dois sacerdócios "ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo, do único sacerdócio de Cristo".2
Todos somos vítimas e sacerdotes

Como se exerce, então, esse sacerdócio comum dos fiéis?

Comentando a citada passagem da Epístola de São Paulo aos Romanos, São Pedro Crisólogo explica que "o ser humano não precisa ir buscar fora de si a vítima que deve oferecer a Deus; traz consigo e em si o que irá sacrificar a Deus". Somos, a imagem de Nosso Senhor, ao mesmo tempo vítimas e sacerdotes.

E por isso proclama: "Pela misericórdia de Deus, eu vos exorto, irmãos, a vos oferecerdes em sacrifício vivo, santo".

"Ó homem", insta o Crisólogo, "sê tu sacrifício e sacerdote de Deus; não percas aquilo que te foi dado pelo poder do Senhor.
Reveste-te com a túnica da santidade, cinge-te com o cíngulo da castidade; [...] eleva continuamente a tua oração como perfume de incenso; empunha a espada do Espírito; faze de teu coração um altar. E assim, com toda confiança, oferece teu corpo como vítima a Deus".3

Esse oferecimento de si próprio, todos somos chamados a fazê-lo. Ninguém pode realizar essa oblação em nosso lugar, nem sequer os ministros consagrados.

"Com prazer faço a vossa vontade"

O primeiro passo dessa entrega consiste em cumprir os Mandamentos, conforme ensina o Autor Sagrado: "Quem observa a Lei faz numerosas oferendas. É um sacrifício salutar guardar os preceitos, e apartar-se de todo pecado. Afastar-se da injustiça é oferecer um sacrifício de propiciação, que consegue o perdão dos pecados" (Eclo 35, 1-3).

Na mesma linha, o Concílio Vaticano II convida a cada batizado exercer seu santo sacerdócio "por meio de todas as obras próprias do cristão, [...] na recepção dos Sacramentos, na oração e ação de graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade operosa";4 todos quantos foram incorporados à Igreja pelo Batismo "ficam obrigados a difundir e defender a Fé por palavras e obras como verdadeiras testemunhas de Cristo".5
Cristo com a Eucaristia - Museu de Arte Religioso de Puebla - México.jpg
A Cristo pertence o único e eterno sacerdócio,
do qual Ele quis tornar partícipes
os Apóstolos

Cristo com a Eucaristia - Museu de Arte
Religiosa de Puebla (México) 
Já no âmbito da família, "como numa igreja doméstica, devem os pais, pela palavra e pelo exemplo, ser para os filhos os primeiros arautos da Fé e favorecer a vocação própria de cada um, especialmente a vocação sagrada".6
O melhor meio, portanto, de tornar efetivo na vida cotidiana o sacerdócio comum dos fiéis é seguir o exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo que, já no momento de sua Encarnação, fez ao Pai o ato de entrega de toda a sua existência, conforme as palavras do salmista: "Eis que venho! Sobre Mim está escrito no livro: ‘Com prazer faço a vossa vontade, guardo em meu coração vossa Lei'" (Sl 39, 8-9). Oferecimento confirmado e efetivado ao longo de sua vida terrena, até o momento supremo do "consummatum est" (Jo 19, 30).

Quem se sentir impotente, recorra à ajuda da graça

Não estranhemos sentir falta de forças para seguirmos as pegadas de Nosso Senhor. Ele próprio sentiu a fragilidade da natureza humana a ponto de suplicar no Horto das Oliveiras: "Meu Pai, se é possível, afastai de Mim este cálice!". Entretanto, acrescentou ato contínuo uma ressalva na qual revela sua disposição de levar ao extremo o holocausto de Si mesmo: "Faça-se, todavia, a vossa vontade, e não a minha" (Mt 26, 39). Enviou-Lhe então o Pai um Anjo do Céu para confortá-Lo (cf. Lc 22, 43).

Portanto, quem se sente impotente por si, recorra à ­ajuda da graça. Peça com ­humildade e confiança, por intermédio d'Aquela que é o Refúgio dos Pecadores. Ela lhe obterá forças para tornar efetiva a resolução de fazer sempre a vontade de Deus em cada ato da vida diária.

Quem assim fizer o holocausto de sua vida terá uma existência feliz nesta Terra, pois cumpriu com sua missão de batizado, e, sobretudo, quando soar a hora da morte, seu Anjo da Guarda intercederá por ele junto a Nossa Senhora: "Excelsa Rainha e Mãe, por vossa misericórdia, este vosso filho combateu o bom combate, terminou sua carreira, guardou a fé. Pedi agora a Nosso Senhor Jesus Cristo que o receba em sua glória" (cf. II Tim 4, 7-8). 
 
 
 
 
 
 
 

Pe. Francisco Teixeira de Araújo, EP

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