domingo, 13 de março de 2011

1º DOMINGO DA QUARESMA - ANO A - Mt 4, 1-11

AS TENTAÇÕES DE JESUS.

1º Domingo da Quaresma


Primeira leitura: Gênesis 2,7-9;3,1-7
Criação e pecado dos primeiros pais

Salmo responsorial: Salmo 50(51), 3-4.5-6a.12-13.14.17 (R. 3a)
Piedade, ó Senhor, tende piedade

Segunda leitura: Romanos 5,12-19
Onde o pecado se multiplicou, aí superabundou a graça

Evangelho: Mateus 4,1-11
Jesus jejuou durante quarenta dias e foi tentado

Os comentários bíblico-liturgicos para ajudar a elaboração das homilias dominicais deste típico “domingo das tentações”, o primeiro da quaresma, podem apresentar nesta ocasião um paralelismo antagônico: a primeira tentação foi a mesma de Eva teve e que a levou ao pecado. A cena de tentação de Jesus no deserto acabou em vitória; ela pode ser tomada como exemplo.

Nessa linha de pensamento é muito fácil encontrar comentários na rede de computadores. Por isso mesmo, gostaríamos de dar nossa contribuição no sentido crítico. Obviamente, este aspecto não seria apropriado para convertê-lo, sem mais, em uma homilia, porém, acreditamos que tampouco seria bom que uma homilia esquecesse esse aspecto crítico. Certamente os agentes de pastoral saberão o que sua comunidade precisa e saberão encontrar comentários em outros pontos de serviço bíblico-litúrgico na internet.

A primeira leitura deste domingo reúne, resumidamente, dois importantes relatos bíblicos: o da criação e do pecado original. São muito significativos, muito importantes, mas também muito problemáticos. É importante lembrar aos ouvintes e leitores que estes textos e todos os que formam o grupo dos onze primeiros capítulos do Gênesis, que se referem aos inícios da “historia da salvação”, sempre foram entendidos de uma forma literal.

Todas as gerações que nos precederam na fé os entenderam assim. Certamente nossos pais – e nossos avós – nunca pensaram em outra coisa e muitos cristãos atuais também possuem essa mesma visão. Desde o tempo imemorial estes textos foram, para muitas gerações, como que a fonte de sua compreensão do mundo e da historia.

As “coordenadas gerais” que estes mitos trazem (Deus acima de tudo, a natureza abaixo, um ato de criação, uma criação diferente do ser humano, Deus que proíbe comer o fruto da árvore, a desobediência que se converte em “pecado original”, que transformará a sorte de toda a humanidade posterior, o papel especialmente importante da mulher nesse pecado, o aborrecimento de Deus, sua ruptura de relações com a Humanidade depois de comer o fruto proibido), foram para toda essa humanidade judeu-cristã dos últimos três mil anos, o “paradigma” a partir do qual entenderam o mundo, a Deus e a si mesmos, isto é, a realidade inteira. Estamos diante de mitos religiosos, diante dos quais é preciso tirar as sandálias, como quem pisa em terra sagrada.

É importante lembrar que hoje não se acredita que esses relatos devam ser entendidos assim, literalmente. Hoje sabemos que a Bíblia não pode ser considerada como uma explicação da origem do cosmos, nem do ser humano. A Bíblia não contém mensagens de física, nem de química, nem de biologia evolutiva, nem de geofísica ou astrofísica que nos informem sobre todos esses campos do saber.

E que, portanto, podemos ser cristãos e aceitar razoavelmente o que a ciência nos diz, incluídas as opiniões contrarias a tantas afirmações e pressupostos incluídos nos relatos bíblicos.

É importante cair na conta de que esta nova maneira de entender os textos bíblicos não foi fruto de uma descoberta fácil e ingênua, mas uma trabalhosa intuição dos biblistas e teólogos, seguida de um difícil processo de elaboração e que durante todo esse tempo realizaram, enfrentando oposição, e a condenação de autoridades de suas respectivas igrejas. No campo católico, há 100 anos Roma ainda proclamava o caráter histórico dos onze primeiros capítulos do Gênesis, e reiterava a condenação a quem se atrevia a pensar diferente.

Todo cristão medianamente formado, pode ter sua opinião sobre a origem do mundo, da mesma forma que pode ter sua opinião sobre política, medicina ou psicologia, livremente, sem coação, e sem que haja nenhuma opinião oficial da Igreja nesses campos. Os relatos bíblicos estão em outro plano, um plano simbólico, que não afeta o campo autônomo da ciência.

É preciso esclarecer que hoje não é possível sustentar que o símbolo judeu-cristão chamado “pecado original” tenha um fundamento histórico. Ele não tem sustentação histórica. Mais ainda, é praticamente impossível, pois o mais provável é que tenha havido mais de um filão de surgimento de nossa espécie.

O poligenismo é hoje a opinião mais comum da ciência. A proclamação que a Igreja católica fez do monogenismo no século passado foi devido ao fato de pensar que o significado do símbolo do pecado original dependia efetivamente de um pecado histórico cometido pelo primeiro homem e primeira mulher, do qual descenderíamos absolutamente todos os homens e mulheres.

Especialmente importante é esclarecer que hoje se torna inverossímil, teologicamente falando, todo o conjunto simbólico da tentação e do pecado original: pensar que toda a humanidade esteja em uma situação de prostração espiritual (que seja uma “massa damnata”, uma multidão condenada, como dizia santo Agostinho) por culpa de um suposto primeiro pecado de um suposto primeiro casal e pensar que devido a isso Deus tenha rompido suas relações com a humanidade e que esta ruptura não seria dissolvida senão com o sangue da morte na cruz do Filho de Deus, tal e como foi apresentado pela tradição mais comum e constante do cristianismo.

Tudo isso se torna hoje inaceitável e, portanto, devem sentir-se aliviados todos os que se sentem incomodados diante das costumeiras explicações das homilias a respeito, tão parecidas às catequeses infantis recebidas quando crianças.

Outras várias considerações e comentários críticos também muito importantes poderiam ser feitos entre os temas implicadas nesses dois grandes relatos que foram unidos na primeira leitura deste domingo (por exemplo sobre a “transcendência” de Deus que aí se apresenta como obvia, sobre a imagem mesma de “theos”, a visão negativa da realidade que leva consigo a crença em um primeiro “pecado primordial”, a terrível culpabilização e inferiorização da mulher causada pelo texto).

Já afirmamos que não pretendemos que a lista de advertências críticas seja o conteúdo de uma homilia, mas simplesmente um pano de fundo crítico que se deve ter em conta na hora de falar das “tentações” e do “pecado”, para o qual podem ser encontrados muitos comentários nos numerosos portais de serviço bíblico na rede de computadores.

É importante dizer claramente, e insistimos, que se pode ser cristão e ser pessoa atualizada em questões científicas. E que existem outras formas de falar da realidade do mal e do pecado, e não tomar como única referencia alguns mitos religiosos elaborados há mais de dois milênios.

Finalizando, já que tantas vezes temos insistido no pecado original e em suas fatais conseqüências para toda a humanidade, seria bom compensar essa atitude com uma referencia ao que hoje a teologia de fronteira intui: que o original não foi um pecado, mas uma bênção.

Pode ajudar o livro de FOX, Tathew, “Original Blessing”, Bear & Company 1983; tradução: La bendición original. Una nueva espiritualidad para el hombre del siglo XXI, Obelisco, Barcelona 2002, 410 pp

Oração Comunitaria

Ó Deus, que sabes que nossa vida humana está submetida a tantos influxos, pressões, tentações, repulsas, mas também tantos estímulos, inspirações e bons exemplos; nós te pedimos que a atração e o influxo do bem seja muito mais forte em nossa vida que a tentação e a força do mal, e que o exemplo de Jesus nos ajude a segui-lo pelo caminho do amor e do bem. Nós te pedimos em nome de Jesus, teu filho e irmão nosso. Amém.

As três tentações de Jesus

Evangelho: Mt 4,1-11

Jesus foi conduzido ao deserto pelo Espírito, para ser posto à prova pelo diabo. Ele jejuou durante quarenta dias e quarenta noites. Depois, teve fome. O tentador aproximou-se e disse-lhe: "Se és Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães!" Ele respondeu: "Está escrito: "Não se vive somente de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus"". Então, o diabo o levou à Cidade Santa, colocou-o no ponto mais alto do templo e disse-lhe: "Se és Filho de Deus, joga-te daqui abaixo! Pois está escrito: "Ele dará ordens a seus anjos a teu respeito, e eles te carregarão nas mãos, para que não tropeces em alguma pedra"". Jesus lhe respondeu: "Também está escrito: "Não porás à prova o Senhor teu Deus"!" O diabo o levou ainda para uma montanha muito alta. Mostrou-lhe todos os reinos do mundo e sua riqueza, e lhe disse: "Eu te darei tudo isso, se caíres de joelhos para me adorar". Jesus lhe disse: "Vai embora, Satanás, pois está escrito: "Adorarás o Senhor, teu Deus, e só a ele prestarás culto"". Por fim, o diabo o deixou, e os anjos se aproximaram para servi-lo.

Comentário ao Evangelho do dia feito por:
São Máximo de Turim (? - c. 420), bispo
Sermão 16; PL 57, 561, CC Sermão 51, p. 206 (a partir da trad. Migne 1996, p. 85 rev.)

Alimentar-se da Palavra que sai da boca de Deus.

O Salvador responde ao diabo: «Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus». O que quer dizer: «Não vive do pão deste mundo, nem do alimento material dos quais te serviste para enganar Adão, o primeiro homem, mas da Palavra de Deus, do Seu Verbo, que contém o alimento da vida celestial». Ora, o Verbo de Deus é Cristo Nosso Senhor, como diz o evangelista: «No princípio existia o Verbo; o Verbo estava em Deus» (Jo 1, 1). Por conseguinte, todo aquele que se alimenta da palavra de Cristo já não necessita de alimento terreno. Porque quem se renova com o pão do Senhor não pode desejar o pão deste mundo. Efectivamente, o Senhor tem o Seu próprio pão, ou melhor, o Salvador é Ele próprio pão, como nos ensina com estas palavras: «Eu sou o pão que desceu do Céu» (Jo 6, 41). É a este pão que o profeta chama «o pão que lhe robustece as forças» (Sl 103, 15).

Que me importa o pão que oferece o diabo, quando tenho o pão em que comungo com Cristo? Que me importa o alimento [...] por causa do qual o primeiro homem perdeu o Paraíso, Esaú o direito de primogenitura [...] (Gn 25, 29ss.), que designou Judas Iscariotes como traidor (Jo 13, 26ss.)? Com efeito, Adão perdeu o Paraíso devido ao alimento, Esaú perdeu o seu direito de primogenitura por um prato de lentilhas, e Judas renunciou à sua condição de apóstolo por um punhado de moedas; porque, no momento em que o tomou, deixou de ser apóstolo para se tornar traidor. [...] O alimento que devemos tomar é aquele que abre o caminho ao Salvador, não ao diabo, o que transforma quem o toma em proclamador da fé e não em traidor.

O Senhor tem razão em dizer, neste tempo de jejum, que é o Verbo de Deus que alimenta, para nos ensinar que não devemos viver os nossos jejuns preocupados com o mundo, mas lendo os textos sagrados. Com efeito, o que se alimenta das Escrituras esquece a fome do corpo; o que se alimenta do Verbo celestial esquece a fome. Eis o alimento que alimenta a alma e alivia o faminto [...], que confere a vida eterna e afasta de nós as armadilhas das tentações do diabo. A leitura dos textos sagrados é vida, como afirma o Senhor: «As palavras que vos disse são espírito e são vida» (Jo 6, 63).




Fonte:pemiliocarlos.blogspot.com

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